Umami: o que é e onde encontrar o quinto gosto básico do paladar humano

Presente em queijos, tomates e até em macarronadas, o umami foi descoberto no Japão há mais de um século; conheça suas principais características e como identificá-lo

Macarrão à bolonhesa, que leva molho de tomate e carne, é também umami
Macarrão à bolonhesa, que leva molho de tomate e carne, é também umami Unsplash

Saulo Tafarelodo Viagem & Gastronomia

Doce, salgado, azedo e amargo é a resposta mais comum para a pergunta “Quais os gostos básicos do paladar humano?”. Porém, ao contrário do senso comum, a lista não para por aí: menos difundido no Brasil, mas igualmente importante, o quinto gosto básico do paladar humano é o umami, palavra de origem japonesa que, em sentido generalizado, significa “saboroso”.

O umami foi descoberto e divulgado na comunidade científica há exatos 115 anos, quando em 25 de julho de 1908 o cientista japonês Kikunae Ikeda concluiu estudos sobre o tema. Hoje, a data é comemorada internacionalmente como o Dia do Umami.

Encontrado em nossa alimentação diária, o umami é reconhecido pelo paladar humano a partir de alimentos que possuem o aminoácido glutamato, o principal representante deste gosto, e também nucleotídeos inosinato e guanilato.

Em palavras mais apetitosas: queijo parmesão, tomate, milho, ervilha, camarão, aspargos e carne bovina e suína são exemplos de alimentos que possuem gosto umami.

“A própria macarronada, se pensarmos na massa, que é uma base neutra, com um bom molho de tomate e carne para fazer o bolonhesa, mais o queijo parmesão por cima, é sucesso garantido e umami puro”, explica Mariana Rosa, nutricionista e mestre em Ciências no Programa de Nutrição Pública pela USP (Universidade de São Paulo).

Mesmo com mais de um século da descoberta, a discussão em torno do gosto parece ter ganhado fôlego nas últimas duas décadas, já que o umami foi cientificamente reconhecido no início dos anos 2000 após pesquisadores comprovarem a presença de receptores específicos de umami na língua humana.

Breve história do umami

Para entender o umami é preciso voltar mais de um século no calendário. Ao provar um dashi, caldo que é uma das bases da culinária japonesa feito a partir de alga kombu e peixe bonito, o professor Kikunae Ikeda, da Faculdade Imperial de Tóquio, notou um gosto que não era doce, salgado, azedo e nem amargo.

Com seus estudos, Ikeda extraiu o glutamato da alga kombu e determinou que esta era a substância predominante no paladar quando comiam o caldo. O gosto saboroso proveniente do glutamato foi então chamado de umami.

Até hoje, o dashi é a base para vários pratos tradicionais da gastronomia japonesa, como sopa de missô, udon, soba e os famosos lámens, e uma das maneiras mais tradicionais de encontrar e experimentar o umami.

Udon é macarrão grosso de farinha de trigo comido com caldo à base de dashi, de gosto umami / Unsplash

Se no Brasil o predomínio é o eixo salgado/doce para estimular o paladar, no Japão o eixo referencial é o umami. É o que defende a Telma Shiraishi, chef do Aizomê e Embaixadora da Culinária Japonesa, que diz que, com o domínio japonês do umami em preparações com algas, cogumelos e katsuobushi, tempero de peixe bonito seco e ralado, as preparações ficam leves e deliciosas.

“Porque ao emoldurar o umami e valorizar sua presença natural nos ingredientes, as preparações japonesas precisam de muito menos sal, açúcar ou gordura para resultar em pratos que alegram o paladar e induzem à saciedade. Esse talvez seja o ‘pulo do gato’ do gosto japonês e o segredo para serem um dos povos mais saudáveis e longevos do mundo”, conta a chef.

Apesar do umami ter origem japonesa, Telma argumenta que é “o gosto que está na boca e na cabeça de chefs antenados” ao redor do mundo. Um dos exemplos mais notáveis é René Redzepi, nome por trás do NOMA, restaurante em Copenhague eleito por cinco vezes o melhor do mundo e detentor de três estrelas Michelin, que busca o umami através da fermentação.

Onde encontrar umami?

O umami é percebido pelo paladar humano principalmente pela ingestão de alimentos ricos em glutamato. Vale lembrar que ele é um aminoácido, ou seja, um dos blocos de construção das proteínas e que está presente naturalmente no corpo humano e nos alimentos.

Com o passar do tempo, outros componentes que também formam umami foram descobertos, como os nucleotídeos inosinato e guanilato.

“O glutamato está presente em alimentos curados, como presuntos e queijos, assim como no tomate, cenoura, milho, ervilha e aspargo, por exemplo. Já os nucleotídeos estão presentes mais em carnes. Carne de boi, carne de frango e peixes, como o peixe bonito, são compostos também por inosinato. O guanilato aparece mais em cogumelos, em que o shitake é um dos exemplos mais notáveis”, exemplifica Hellen Maluly, doutora em Ciência dos Alimentos pela Unicamp e consultora do Comitê Umami, que ajuda a popularizar o quinto gosto básico no Brasil.

Queijos, produtos curados e tomate são exemplos de ingredientes que possuem gosto umami / Bob Peters

Para a chef Telma Shiraishi, combinar tomates maduros com queijo curado já é receita de sucesso para uma “bomba de umami”, seja na macarronada, na lasanha ou na pizza. Feijoada com carnes curadas e defumadas; estrogonofe com carne, cogumelos e creme; e uma canja também estão entre suas receitas umami prediletas.

Para ressaltar o gosto umami na culinária, a pesquisadora Hellen ainda indica fazer uma interação do glutamato e dos nucleotídeos.

“Uma carne com molho de cogumelos ou ainda cogumelos, como o shitake, com vegetais, como cenoura, em caldo ou sopa. É uma mistura entre glutamato e nucleotídeos que confere até uma potência maior de sabor”, sugere.

Além destes alimentos, uma das formas mais populares de se encontrar umami nas prateleiras do supermercado é com o glutamato monossódico, também conhecido como o MSG na sigla em inglês.

O glutamato monossódico

Vendido como um pó cristalino branco inodoro e usado como “realçador de sabor”, o glutamato monossódico é a versão industrializada do glutamato e a forma mais pura do umami. Obtido principalmente pela fermentação da cana-de-açúcar, o MSG é produzido desde 1909 pela empresa japonesa Ajinomoto, que tem o professor Kikunae Ikeda como um dos nomes por trás do produto.

“A molécula química do MSG é exatamente a mesma do glutamato. O único diferencial é que há um sódio ligado a ela. É a mesma substância presente naturalmente nos alimentos e nosso corpo reconhece da mesma maneira”, diz Hellen.

Categorizado como um aditivo seguro pela Food and Drug Administration (FDA), órgão governamental dos Estados Unidos que faz o controle dos alimentos, o MSG não tem uma limitação diária de consumo. Como o produto é encontrado também em ultraprocessados, é claro que a recomendação é não exagerar.

Glutamato monossódico é a versão industrializada do glutamato e reconhecido da mesma forma por nosso corpo / Shutterstock

Dados da FDA relativos aos Estados Unidos estimam que um adulto médio consome cerca de 0,55 gramas de MSG por dia, enquanto a ingestão diária de glutamato a partir da proteína dos alimentos é de 13 gramas.

A substituição do sal de cozinha pelo glutamato monossódico é também uma discussão pertinente para os estudiosos, que defendem que o uso do MSG ajuda na redução do teor de sódio.

De acordo com informações do Comitê Umami, o glutamato monossódico possui um terço da quantidade de sódio encontrada no sal de cozinha. A substituição de uma colher de sal em uma receita por uma colher que contenha metade de sal e metade glutamato monossódico é recomendada.

“Isso acontece porque o MSG é um ingrediente que confere o gosto umami, assim como o sal proporciona o gosto salgado e o açúcar o gosto doce. Estudos comprovam que existe uma redução de até 37% de sódio utilizando o glutamato monossódico nessas proporções”, afirma a nutricionista Mariana Rosa.

Segundo Maluly tal substituição reduz o teor de sódio sem bruscas mudanças de sabor. Ela ressalta, porém, que pode sim ocorrer uma certa alteração na percepção do sabor da receita, uma vez que “nosso paladar já está muito habituado ao alto consumo de sódio”.

Características do umami

Além da redução do teor de sódio, duas outras características principais marcam a experiência umami: ele aumenta a salivação e prolonga o sabor global dos alimentos. Em linhas gerais, é literalmente o gosto que dá água na boca.

“Como ele aumenta muito a salivação, acaba tendo uma influência na diluição de aromas, por exemplo, e inclusive chega a interagir com outros gostos básicos”, ressalta Hellen.

Vale lembrar que gosto é diferente de sabor. Como a própria profissional enfatiza, o gosto se refere exclusivamente ao sentido do paladar, em que receptores na papila gustativa reconhecem um determinado estímulo proporcionado por substâncias químicas dos alimentos e enviam a informação para o cérebro.

Já o sabor é, na verdade, mais complexo, em que envolve uma combinação multissensorial, como a ajuda do próprio paladar e do olfato.

Como sentir o umami

Tomate é um dos alimentos ricos em umami / Unsplash

Assim como os outros gostos, sentir o umami depende primeiramente de experimentar os alimentos. Como indicado pelo Comitê Umami, uma das maneiras de entrar em contato com o quinto gosto é beber um pouco de água e colocar um pedaço de queijo parmesão ou um tomate maduro à boca (quanto mais maduro, mais umami o tomate tem, como afirma a chef Shiraishi).

Com a degustação, é possível notar que o salgado do queijo ou o ácido do tomate também se fazem presentes – afinal, os alimentos são complexos do ponto de vista sensorial, já que possuem presença de substâncias diversas que lhe garantem uma diversidade de aromas e gostos.

Após ingeridos os alimentos, ocorre uma salivação maior e a sensação de gosto prolongado em boca, aspectos primordiais do umami.

Alguns exercícios sensoriais também podem ajudar a diferenciar os gostos básicos através de soluções.

Em diferentes recipientes com água é possível colocar ingredientes puros, como açúcar para o gosto doce e sal para o salgado, por exemplo, assim como o glutamato monossódico para o umami.