Evvai: novo menu mostra maturidade do chef, sem deixar de lado sua personalidade divertida e arrojada

Estrelado restaurante de São Paulo traz humor e descontração para menu-degustação que joga luz à união gastronômica e cultural Brasil x Itália

Tina Binido Viagem & Gastronomia , São Paulo, SP

Visitar o Evvai gera sempre uma grande expectativa. A casa do jovem chef Luiz Filipe Souza, na fronteira dos bairros de Pinheiros e Jardins, conquistou uma estrela Michelin em 2019, a qual se manteve até a última edição do guia no Brasil, e conquistou em 2022 a 14ª posição da cobiçada lista The World’s 50 Best Restaurants América Latina, e 67ª na edição mundial.

As distinções já são motivos suficientes para as expectativas serem altas.

Porém, a verdade é que quem já foi ao menos uma vez ao Evvai cria expectativa não pelos prêmios, mas por ser um local onde, por cerca de duas horas e meia (média de duração do menu-degustação), cada um dos tempos é uma provocação gustativa, em que os pratos com apresentações milimetricamente pensadas nem sempre são o que parecem. Onde o óbvio, definitivamente, não é tão óbvio assim.

O Evvai abriu as portas em 2017 e, de lá para cá, o amadurecimento da cozinha é gritante. Em post recente nas redes sociais, Luiz escreveu que “o principal ingrediente na carreira do cozinheiro não é nem o sal, mas sim o tempo”.

Palavras certeiras e muito bem representadas em seu novo menu, o Oriundi 2023 que – em 13 etapas (R$ 737) – apresenta uma mescla de técnicas, ingredientes e sabores das cozinhas Brasil e Itália.

Pão de mandioca, manteiga de maracujá e requeijão noisette abrem o menu Oriundi / Tina Bini

Ótimos spoilers do que o visitante degustará no decorrer da noite, os snacks chegam nas cores das bandeiras brasileira e italiana e, entre a cestinha vermelha de beterraba com ricota de ovelha e pimenta murupi; a verde com aspargos, wagyu e pimenta-de-cheiro; ou a azul, feita com espirulina azul com siri catado com caramelo de koshô, a herança da grande imigração italiana e sua influência na gastronomia da capital paulista mostra delicadamente a sua cara.

A famosa bomba de vieira que acompanha o menu Oriundi desde 2017 / Tina Bini

A cada etapa um cartão-postal divertido e desenhado pelo próprio Luiz Filipe é deixado na mesa. Atrás, um texto escrito em primeira pessoa, onde o chef conta alguma particularidade sobre o prato.

Entre ilustrações com Baby Yoda, Branca de Neve e o Pato Donald, uma playlist animada que vai de Marvin Gaye a Madonna toca ao fundo, e o serviço segue nessa linha. Elegante, mas ao mesmo tempo descontraída, quebrando alguns paradigmas que o fine dining carrega.

Voltando ao menu, a famosa bomba de vieiras, presente desde a primeira edição do Oriundi, chega no também já famoso prato em formato da mão do chef. Ela fica equilibrada, na “ponta dos dedos”. Equilíbrio também sentido no sabor do petisco frito em gordura de pato e assada, antes de ser finalizado com crispy de vieira.

Outros grandes destaques do menu são os camarões carabineiros produzidos nas águas profundas de Santa Catarina que desfilam seu sabor adocicado em três versões do clássico chuchu com camarão carioca; o alho-poró com gin e castanha-do-Brasil te faz parar por alguns segundos e se questionar: desde quando um simples alho-poró passou a ser tão impactante?

Também fica impossível não se encantar com a delicadeza do capuccino de conchas com ostra e hollandaise de marisco que ganha mini flores colocadas uma a uma em volta da xícara em que é servido.

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Em seguida, chega à mesa uma releitura de um dos mais tradicionais pratos brasileiros: a moqueca. Esqueça a versão que estamos acostumados a saborear em casas pelo Nordeste. Aqui, ela ganha delicadeza e acidez com framboesas. Uma combinação inusitada e que dá certo.

Se até agora o mix de texturas, sabores e temperaturas se fez presente, a pasta fredda servida com cupuaçu, pimenta baniwa, açafrão e toque de tangerina mostra novamente que no Evvai sair da mesmice é regra.

Finalizam a parte salgada do menu interpretações do pato no tucupi, esse no recheio de um tortellini com caldo riquíssimo de tucupi e uma costela “barreada” com abóbora e uarini, conhecido como o “caviar das farinhas”.

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Em seguida, a chef de pâtisserie Bianca Mirabili entra em cena e mostra o belo trabalho que tem feito na casa. Os picolés, finalizados no momento do serviço com o auxílio do mágico nitrogênio líquido, ganham tomate doce e morango salgado, junto à baunilha do Cerrado. Mais uma vez o óbvio não é óbvio.

Uma degustação de queijos com diferentes tipos de meles antecede a volta de uma sobremesa famosa na casa: o pão de mel. A versão de Bianca também explora os tipos de meles brasileiros e encerraria essa refeição de maneira primorosa, uma sobremesa potente e marcante, mas uma seleção de mini delícias doces, com destaque para o jelly bear de siriguela, chega à mesa e, daí sim, encerra a viagem com grãos selecionados de cafés especiais.

Vale mencionar que o sommelier Marcelo Fonseca tem feito um belíssimo trabalho, onde oferece dois tipos de harmonizações: a Magna (R$ 897), baseada em vinhos clássicos e premiados, e a Sinfonia (R$ 519), na qual vinhos brasileiros são as estrelas. Toda a etapa é acompanhada por vermouth, numa ousada combinação proposta por Marcelo.

Luiz Filipe afirma que, conforme dito acima, a inspiração para a criação do menu é regida pelo intercâmbio cultural entre Brasil e Itália e como essa relação se influencia de maneira bilateral e igualitária, como aconteceu no período da grande imigração após a abolição tardia da escravatura. Esse encontro cultural rico que gera possibilidades infinitas, instigantes, provocativas e de certa maneira até afetivas.

O chef ainda diz que procura sempre provocar os visitantes e que, para isso, pensa desde o acolhimento do serviço, o visual, o olfato, a audição, a memória, o lúdico, o conforto no desconforto do desconhecido, e a surpresa, mas que no final tudo é focado em enaltecer o paladar.

De fato, Luiz tem feito isso e mostra que o fine dining não está com os dias contados como muito tem se especulado no mercado. Muito pelo contrário, ele apenas está reinventado, mais divertido, menos rígido e com menos protocolos.

Sobre os próximos passos, Luiz é categórico na resposta: evoluir.  Isso é a “coluna dorsal” do Evvai.

“A cada menu que trocamos, tudo é pensado em relação ao atual e como podemos fazer melhor. A cada dia, dentro do mesmo menu, isso também acontece, um passo depois do outro, mas sempre continuo. Trabalhamos para que a cada visita se encontre um restaurante, uma experiência ainda melhor e com isso consolidar nossa casinha azul como uma referência de qualidade e de bem-estar” completa.

Breaking news: o chef se prepara para abrir o Evvi.ta, dentro do seu novo espaço que chamará Trattorita, vizinho ao Evvai. Sem menu-degustação, mais descontraído e aberto também durante o almoço. Ansiosos pela novidade!

Evvai: Rua Joaquim Antunes, 108 – Pinheiros, São Paulo – SP / Horário de funcionamento: segunda a sábado, das 19h às 23h / Reservas pelo telefone (11) 3062-1160 ou pelo site evvai.meitre.com


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