Dia Mundial do Chocolate: chefs criam receitas salgadas com chocolate

Para comemorar o Dia Mundial do Chocolate, conheça algumas combinações ousadas com o ingrediente e inspire-se para sair do lugar-comum

Moles poblano e negro, tipo de molho feito com pimentas, frutas secas, castanhas e chocolate amargo da culinária mexicana
Moles poblano e negro, tipo de molho feito com pimentas, frutas secas, castanhas e chocolate amargo da culinária mexicana Divulgação

Juliana Bianchicolaboração para o Viagem & Gastronomia

Chocolate combina com o quê? Caramelo, amendoim, leite condensado, torta, bolo? Certo. Mas, e se nesse Dia Mundial do Chocolate tirássemos ele da cozinha doce e levássemos para a salgada, será que daria certo?

Claro que sim! Até porque, apesar da nossa memória gustativa e registros culturais afirmarem que ele tem de ser doce, a pasta de grãos torrados e fermentados de cacau que dá vida aos tabletes levou literalmente séculos para encontrar o açúcar e o leite.

Muito antes do descobrimento da América, os imperadores astecas já consumiam o chocolate em cerimônias como bebida energética, chamada “xocoatl”. De sabor amargo, adstringente e picante, era preparada com água e muitas vezes engrossada com farinha de milho, e temperada com castanhas e pimenta.

Foi só no século 16, quando chegou à Europa, que passou a ser consumido – ainda apenas como bebida quente – com canela, baunilha e um pouquinho de açúcar, que naquela época tinha status de tempero nobre.

O formato em barras, para ser comido puro, e o leite, que trouxe suavidade e maciez à mistura, só viriam a ser incorporados quase três séculos depois, durante a Revolução Industrial. Daí, para cair no gosto popular, em formato de bombons ao leite, foi um pulo. Por estar em todo o mundo, não é à toa que existe um Dia Mundial do Chocolate.

Mas apenas dessas mudanças, o chocolate nunca parou de ser usado em receitas salgadas. Ainda que hoje vistas quase como exóticas em todo o mundo.

Com exceção do México, onde os moles poblano e negro – tipo de molho feito com pimentas, frutas secas, castanhas e chocolate amargo – são parte fundamental da cultura gastronômica e por isso encontrados em diferentes versões por todo o país.

Moles, um molho salgado mexicano que você encontra no Metzi, em São Paulo/ Divulgação

“É uma receita de festa, feita com mais de 40 ingredientes, cujo preparo pode levar dias. Quanto mais tempo de cozimento lento, descansos e novos cozimentos, mais rico fica”, conta o chef mexicano Eduardo Nava Ortiz, que em seu restaurante Metzi, em São Paulo, serve o mole negro.

“Mas sai pouco. É um sabor muito complexo, que combina salgado, doce, ácido, picante, defumado. Não é todo mundo que gosta”, adianta.

Nas mãos dos cozinheiros mais ousados, o chocolate tem ido muito além dos doces e sobremesas, combinado com os mais variados ingredientes, de carnes a macarrão.

Isso graças às suas nuances de sabores que podem variar do herbal ao floral, do picante ao ácido, do amargo ao frutado, dependendo da origem, da variedade de cacau, dos tempos de fermentação e torra das sementes, e da própria formulação.

Para quem duvida, basta ver o episódio do reality show gastronômico “Iron Chef” (disponível na Netflix), com os chefs Ming Tsai, de origem chinesa, e Claudete Zepeda, que tiveram o desafio de construir dois menus completos com o ingrediente e levaram os jurados – e os telespectadores – à loucura com pratos como pato com laranja e chocolate, aguachile (primo mais ácido e apimentado do ceviche) com carne crua e cacau, salada caesar com molho de manteiga de cacau e peixe assado com misso de chocolate 70% cacau.

Dia Mundial do Chocolate: pato com laranja e chocolate no programa “Iron Chef”, da Netflix/ Reprodução/Netflix

“O chocolate funciona muito bem com sal. Como o molho de soja seria o sal da culinária chinesa, resolvi combinar os dois”, explicou o chef celebridade, que ainda aproveitou as notas tostadas do cacau para adicionar uma camada extra de sabor ao molho barbecue servido com a barriga de porco.

Combinação considerada praticamente um clássico desde que o chef francês Frédéric Bau lançou o livro “Chocolate Fusion”, em 2008. A obra é uma das maiores referências quando se trata de chocolate na cozinha salgada.

No Brasil, apesar de não ser uma constante dada a estranheza gerada no público, vira e mexe é possível encontrar quem brinque com o ingrediente para chacoalhar nossas referências e papilas gustativas.

O premiado Alex Atala, do restaurante D.O.M., entre os melhores do mundo em 2022, segundo a lista The World’s 50 Best Restaurants divulgada nesta semana, já surpreendeu os comensais com uma mousse de chocolate com bacon, que se degustada de olhos fechados podia-se jurar que era um churrasco aerado.

Massas de macarrão de chocolate criadas pela chef Ana Soares, do Mesa III, em São Paulo/ Divulgação

Já a chef Ana Soares, vira e mexe retorna a massa com cacau ao menu da rotisserie Mesa III. “É uma massa muito sofisticada, mais bonita do que aromática. Com uma sensação de leve amargor muito interessante”, diz a chef, que já fez a receita para rechear com confit de pato e agora tem na casa como tagliolini.

“Ela vai muito bem puxada na manteiga com uvas passas e uma terrine de foie gras. Ou com manteiga de papoula e mascarpone”, sugere.

Mesmo na confeitaria é possível tirar o chocolate do lugar-comum. Que o diga o chef confeiteiro Rodrigo Ribeiro, que já se valeu das notas terrosas do chocolate para criar uma sobremesa composta por ganache de chocolate amargo com sálvia, crumble de chocolate black, bolo de erva mate e cogumelos frescos, cuja aparência imitava um terrário.

“Todos os ingredientes foram pensados para trazer bem essas notas terrosas para o prato”, aponta o Ribeiro, sempre disposto a surpreender.

O confeiteiro Rodrigo Ribeiro e sua sobremesa de chocolate com cogumelos/ Reprodução/Instagram