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    Deslizamentos de terra em Marte podem ser gerados por sal e derretimento de gelo

    Marte pode parecer um calmo deserto congelado, mas evidências sugerem que o planeta vermelho está vivo de uma maneira sutil

    Ashley Strickland, da CNN

    Marte pode parecer um calmo deserto congelado, mas evidências sugerem que o planeta vermelho está vivo de uma maneira sutil.

    A missão InSight, da Nasa, ajudou os pesquisadores a determinar que o planeta possui Marsquakes (“terremotos” em Marte, ou “martemotos”), tornando-o sismicamente ativo.

    Além disso, há ainda o mistério das Linhas Recorrentes de Encosta, conhecidas entre os especialistas pela sigla RSL (em inglês) e que intrigam cientistas há anos. As RSLs são uma forma de deslizamento de terra em Marte, mas ninguém sabe o que as causa, disse Janice Bishop, autora de um novo estudo sobre os fenômenos.

    “Nós as visualizamos a partir da órbita pelas faixas escuras que produzem no solo. Elas tendem a ocorrer sempre em encostas voltadas para o Sol, o que levou os geólogos a pensar inicialmente que as RSLs estavam relacionadas ao derretimento de gelo”, disse Bishop, cientista sênior do Instituto SETI, na Califórnia.

    “O interessante é que as linhas recorrentes aumentam ao longo de meses após tempestades de poeira para depois desaparecerem, e parecem se formar repetidamente nas mesmas regiões. Além disso, um grande número delas está se formando na parte equatorial de Marte, onde há muito pouco gelo”, afirmou o especialista.

    Qualquer gelo nessas regiões teria que estar sob a forma de minúsculas partículas congeladas misturadas aos grãos de terra abaixo da superfície.

    Os deslizamentos curiosos nunca foram vistos de perto por um rover ou lander, e, até que possam ser investigados por um explorador robótico, os cientistas estão usando experimentos de laboratório e análogos de Marte na Terra para tentar entendê-los.

    Alguns ambientes inóspitos da Terra são semelhantes aos de Marte, como o deserto do Atacama no Chile, partes da Antártida e até mesmo o Mar Morto. São lugares que mostram que o colapso da superfície e deslizamentos de terra ocorrem quando o sal interage com sulfatos ou água subterrânea.

    “A Antártida e o Atacama são excelentes analogias para Marte, porque são ambientes extremamente secos”, disse Bishop. “A Antártida tem o benefício adicional de ser muito fria. Partes da Antártida, incluindo o Vale do Farol, estão na verdade em pé de igualdade com Marte em termos de temperatura e aridez.”

    Embora a água possa ter sido abundante na superfície marciana bilhões de anos atrás, quando o planeta era mais quente e ainda retinha boa parte de sua atmosfera, a superfície atual de Marte é uma paisagem estéril e congelante.

    Por baixo da superfície

    No entanto, missões a Marte e imagens de satélites revelaram que existe água salgada congelada abaixo da superfície, e ela pode estar causando o que aparece na superfície marciana, como os deslizamentos de terra.

    Bishop e seus colegas coletaram amostras de alguns ambientes semelhantes na Terra, como o Vale Wright, na Antártida, para testar como sais e o derretimento do gelo subterrâneo poderiam causar reações químicas que desencadeiam esses deslizamentos de terra sazonais em Marte. Os pesquisadores queriam testar se os processos observados em lugares como a Antártida, onde sedimentos salgados podem ter um efeito no solo superficial, poderiam estar acontecendo em Marte.

    Os cientistas modelaram a água salobra sob a superfície de Marte em um laboratório, pegando as amostras de solo coletadas e expondo-as a água, sais de cloro e sulfatos, elementos de existência possível sob a superfície marciana. O experimento resultou na formação de filmes finos e móveis de lama aquosa.

    Para modelar as temperaturas marcianas onde o gelo existe sob a superfície nas latitudes médias do planeta, os pesquisadores encontraram gelo parcialmente derretido formado próximo a -50ºC, e um lento e gradual derretimento do gelo entre – 40 e -20ºC.

    As temperaturas podem parecer frias, mas em Marte são consideradas ligeiramente quentes e encontradas perto do equador do planeta, o que poderia manter a água salobra sob a superfície na primavera e verão marcianos.

    Se essa salmoura subsuperficial em Marte se expandir e se contrair ao longo do tempo, essa atividade pode enfraquecer a superfície e gerar buracos, colapsos do solo e deslizamentos de terra.

    Foto do Vale Wright na Antártida, numa perspectiva semelhante a uma visão em Mar
    Foto do Vale Wright na Antártida, numa perspectiva semelhante a uma visão em Marte
    Foto: Nasa Johnson Space Center/Divulgação

    Anteriormente, os cientistas acreditavam que fluxos de detritos líquidos ou de material seco poderiam estar causando os deslizamentos de terra, mas nenhum deles confirmava o que os cientistas viram nas RSLs.

    No entanto, se o gelo está derretendo logo abaixo da superfície, essa mudança também alteraria a própria superfície. 

    Além disso, a superfície marciana está à mercê do vento e de tempestades sazonais de poeira, o que também poderia influenciar o fenômeno.

    “Durante meu trabalho de campo no Salar de Pajonales, um leito de sal seco no norte do Chile, observei muitos exemplos da ação dos sais na geologia local. É gratificante descobrir que ele pode ter um papel na formação de Marte também”, escreveu Nancy Hinman, coautora do estudo e professora de geociências na Universidade de Montana.

    O estudo foi publicado quarta-feira (3) na revista “Science Advances”.

    Atividade química

    “Se nossa hipótese estiver correta, então as RSLs podem ser indicadores de sais em Marte e de uma química ativa próxima à superfície”, disse Bishop. 

    “A maioria de nós, cientistas que estudam Marte, consideramos o planeta atual como um lugar frio, seco e adormecido, moldado principalmente por tempestades de poeira. Isso certamente é verdade para a superfície, mas nosso trabalho mostra que a subsuperfície pode ser muito mais quimicamente ativa do que se imaginava.”

    Bishop observou que esse processo subterrâneo que poderia resultar nos deslizamentos de terra na superfície seria lento e limitado.

    Embora essa salmoura seja muito salgada para abrigar vida, os experimentos do estudo sustentam a ideia de que essa água líquida subsuperficial pode realmente se mover por entre o sal e os grãos minerais. 

    Se esse for o caso, há 4 bilhões de anos a água em Marte poderia ter sido filtrada para a subsuperfície, como um tipo de solo permafrost. O gelo poderia, então, ter descongelado e recongelado ao longo do tempo.

    Foto de um dos experimentos com sulfato azul seco na superfície e sulfato rosa ú
    Foto de um dos experimentos com sulfato azul seco na superfície e sulfato rosa úmido abaixo
    Foto: Jance Bishop/SETI Institute/Divulgação

    “Pode ser que uma maior quantidade dessa água primitiva tenha persistido abaixo da superfície de Marte por mais tempo do que imaginávamos”, ponderou Bishop. 

    “Se for verdade, isso pode indicar que a subsuperfície de Marte era habitável por mais tempo que o ambiente superficial. É difícil estimar quanto tempo, mas talvez a água líquida estivesse presente, misturada a grãos de terra abaixo da superfície, até 3 ou 2 bilhões de anos atrás, ou até mais recentemente”.

    Pesquisas anteriores também sugeriram que a parte mais habitável de Marte realmente está sob a superfície.
    Futuros exploradores robóticos, como o rover Rosalind Franklin da Agência Espacial Europeia, programado para ser lançado em 2022, podem perfurar a superfície e investigar o que está acontecendo.

    “Quando enviarmos rovers para Marte que podem perfurar a superfície, acho que veremos sinais de reações de sal abaixo da superfície, especialmente se investigarmos algumas das regiões equatoriais onde RSLs estão ocorrendo”, comentou Bishop.

    (Texto traduzido, clique aqui para ler o original em inglês).

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