De salsicha de mosca a pão com farinha de larva: cientistas da USP produzem alimentos feitos de insetos
Larva de mosca possui uma porcentagem de proteínas que varia de 40% a 63%, enquanto a de lipídios pode chegar a 35%
Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) estão produzindo e analisando a viabilidade de alimentos feitos de farinha obtida a partir de larvas de mosca.
Duas pesquisas do Departamento de Engenharia de Alimentos (ZEA) da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) estão utilizando larvas da mosca-soldado-negra (Hermetia illucens) em seus estudos para produzir alimentos.
A espécie –conhecida em inglês como Black Soldier Fly (BSF)– já é utilizada como fonte de proteína na produção de ração para animais, tanto no Brasil como no exterior.
O primeiro estudo é direcionado para a extração de óleo da farinha das larvas da mosca-soldado-negra, utilizando métodos sustentáveis e a inclusão de farinha desengordurada em pães. Já a segunda pesquisa envolve o uso da farinha em salsichas.
O intuito dos trabalhos é buscar fontes alternativas de proteína que sejam mais sustentáveis e possam contribuir no combate à fome, segundo informou o “Jornal da USP”.
A extração do óleo das larvas da mosca-soldado-negra foi feita com o uso de dióxido de carbono em estado supercrítico, que é obtido a partir de determinada condição de temperatura e pressão.
Esse método é sustentável e elimina o uso de haxano, um solvente tóxico tradicionalmente usado a extração de óleos e que é derivado do petróleo.
Nesse processo realizado com dióxido de carbono, as propriedades do solvente colaboram para o aumento da eficiência na extração, sem deixar resíduos tóxicos no óleo e na farinha da larva da mosca-soldado-negra.
A professora Alessandra Oliveira, coordenadora do projeto, explica que o manejo e abate das larvas utilizadas nos estudos seguiram as orientações de pesquisadores da FZEA e as normas de boas práticas de fabricação de e segurança de alimentos.
A alimentação das larvas vinha de restos de comida de restaurantes, e seu cultivo pode ser realizado em espaços reduzidos, que têm menor consumo de água quando comparado com rebanhos tradicionais.
“A farinha de inseto é altamente sustentável, não precisa de grandes espaços, nem de muitos recursos hídricos”, explica Alessandra.
O óleo extraído do processo pode ser aplicado na indústria de cosméticos, segundo as pesquisas, enquanto a farinha possui valores nutricionais relevantes, que é uma vantagem para o consumo humano.
O produto possui um alto teor de de proteínas quando comparado com as fontes vegetais, melhor digestibilidade do que algumas proteínas animais e vegetais –o que ajuda na saúde intestinal–, aminoácidos essenciais, além de lipídios e fibras.
As pesquisas estimaram que, na sua fase larval, a mosca possui uma porcentagem de proteínas que varia de 40% a 63% (contra 23,5% do feijão e 26,% da lentilha), enquanto a de lipídios pode chegar a 35%.
Consumo de insetos
A farinha da larva da Hermetia illucens é liberada para a alimentação animal no Brasil desde 2020, após a instrução normativa 110 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), mas a sua inclusão na alimentação humana ainda está em discussão no país.
O debate sobre liberação dos insetos para o consumo humano acontece no mundo todo. Em 2021, a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar liberou o consumo do besouro tenébrio (Tenebrio molitor).
Vários pedidos para autorizar a produção se insetos na União Europeia vêm sendo solicitados, inclusiva da larva da mosca-soldado-negra.
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), os insetos terão um papel central para lidar com as previsões de insegurança alimentar, aumento dos custos da produção animal, crescimento demográfico e problemas ambientais.
A expectativa é que os insetos possam se tornar novas fontes de proteínas, tanto para animais como para humanos, com menores custos de produção e impacto ambiental reduzido.
Vídeo: Agência Europeia autoriza venda de larvas como alimento
*Publicado por Iasmin Paiva, com informações de Luiz Prado, do Jornal da USP