Vírus respiratório lota hospitais pediátricos nos EUA
Microrganismo é causador de resfriados comuns, mas quadros podem se agravar em crianças ou pessoas com comorbidades
Quando Amber Sizemore e sua família fizeram uma viagem para fora do estado para comemorar o aniversário dela na semana passada, a expectativa era que a filha Raegan pudesse nadar. Mas a bebê de 15 meses de idade, normalmente cheia energia e curiosidade, estava bem diferente no sábado da viagem.
“Ela odiou tudo, e normalmente adora água”, contou a mãe. No domingo, quando a família voltava para Ohio, a menina estava “tossindo loucamente”. “Era uma tosse tão forte que ela até vomitou”, relatou. Raegan também parou de comer e apresentou febre.
Sem sucesso com o Tylenol, Sizemore a levou ao posto de saúde e disse aos funcionários da unidade que o VSR, ou o vírus sincicial respiratório, um vírus comum de resfriado, estava circulando na creche onde a menina passa o dia –e onde, por sinal, a mãe também trabalha.
O teste para a presença do vírus deu positivo. Assim que viram os sinais vitais de bebê, os profissionais do UH Rainbow Babies & Children’s Hospital, em Cleveland, sabiam que tinham de interná-la. Ela precisava de oxigênio.
“Foram todos excelentes aqui e cuidaram dela, mas a parte mais assustadora é que, se eu ainda não soubesse que ela estava exposta ao VSR, talvez tivesse esperado passar sozinho”, disse Sizemore. “Estou feliz por não ter esperado”.
A maioria das crianças pega o VSR num determinado momento antes dos 2 anos de vida, de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos. Os casos são normalmente leves. Os sintomas podem parecer um resfriado comum e incluem nariz congestionado, diminuição do apetite, tosse, espirros, febre e chiado no peito. Eles normalmente duram uma semana ou duas, e somem com repouso e ingestão de mais líquidos.
Mas, em algumas crianças, especialmente nas pequenas, o VSR pode ser perigoso, levando à desidratação, problemas respiratórios e doenças mais graves, como bronquiolite ou pneumonia.
Aumento nos casos
Agora, de acordo com médicos que falaram com a CNN, há um aumento “sem precedentes” nos casos de VSR entre crianças nos EUA.
O CDC não rastreia hospitalizações ou mortes por VSR como faz com a gripe, mas disse na quinta-feira (20) que houve um aumento nos casos de VSR em muitas partes do país. Vários hospitais infantis informaram à CNN que estavam “sobrecarregados” com pacientes numa altura do ano em que é incomum haver um aumento de pacientes com esse tipo de vírus.
No geral, os leitos hospitalares pediátricos estão mais cheios do que nos últimos dois anos, de acordo com dados federais.
O Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA não especifica o motivo das internações, mas cerca de três quartos dos leitos hospitalares pediátricos disponíveis em todo o país estão ocupados atualmente. Em comparação, essa ocupação era de cerca de dois terços em média diária nos últimos dois anos.
“Nunca vi este nível de surto”
Com a onda de casos de VSR, o hospital UH Rainbow recebeu tantos pacientes que precisou reencaminhar alguns no início de outubro, o que significa que não podia mais receber casos de emergência externas. A unidade voltou a aceitar pacientes, mas segue sobrecarregada com casos de VSR.
Tem havido um aumento tão dramático nos casos no estado de Connecticut que o Connecticut Children’s Hospital tem trabalhado em parceria com governo estadual e a secretaria de saúde pública para determinar se pede ajuda da Guarda Nacional para expandir a sua capacidade de cuidar dos pequenos pacientes.
“Trabalho com isso há um bom tempo. Estou no Connecticut Children’s há 25 anos e nunca vi este nível de surto especificamente com o VSR no nosso hospital”, disse à CNN o médico Juan Salazar, vice-presidente executivo e médico chefe do hospital.
No Texas, onde os casos geralmente ocorrem em dezembro ou janeiro, o departamento de emergência da Cook Children’s em Fort Worth está registrando um número significativo de casos de casos do vírus. Quase metade da UTI está cheia de casos de VSR, disse Kim Brown, porta-voz do hospital. Entre 2 e 8 de outubro, havia 210 internações provocadas por esse vírus no Cook Children’s; uma semana depois, 288.
Um desses pacientes é a bebê de quatro meses de Jeff e Zoey Green, chamada Lindy, que foi internada no domingo. No hospital, a febre de Lindy era tão alta que chegaram a usar bolsas de gelo artificial para resfriá-la.
“Não sei como, mas ela dormiu com bolsas de gelo em cima dela”, disse Zoey Green, segurando Lindy, exausta, no hospital. Ela disse que está tentando mantê-la hidratada para que não tenha que voltar a receber soro intravenoso. “Só queremos que ela melhore”, desabafou.
A médica Mallory Davis, especialista em prevenção de infecções no Hospital Infantil Helen DeVos em Grand Rapids, Michigan, também relata um surto antes do período normal.
“Estamos lotados, e os nossos números seguem bastante altos enquanto tentamos descobrir como acomodar todas as crianças doentes na comunidade”, disse a doutora Davis.
O Children’s Hospital Colorado teve um aumento antes do normal das internações por VSR e está começando a registrar os primeiros casos de gripe da estação, segundo Kevin Messacar, especialista em doenças infecciosas e professor associado da Faculdade de Medicina da Universidade do Colorado.
“Desde o fim do verão temos registrado um aumento nos casos de rinoviroses e enteroviroses, logo após a volta às aulas, e agora temos VSR e parainfluenza”, detalhou. “Com a temporada de gripe se aproximando rapidamente daquilo que parece ser um início precoce, estamos preocupados com o aumento persistente dos volumes de crianças doentes que necessitam de internação”.
Na UH Rainbow Babies, os funcionários torcem para que as coisas não piorem muito. “Quero dizer, espero que estejamos no pico neste momento, porque, se não estivermos, socorro!”, disse Amy Edwards, diretora médica adjunta para o controle de infecções pediátricas.
Os casos de VSR podem muitas vezes encher hospitais, mesmo fora das estações de alta, já que não existem muitos tratamentos e eles podem exigir vários dias de cuidados em casos graves, disse Edwards. As crianças doentes “precisam de suporte de oxigênio e, sendo assim, não podem ficar em casa”, afirmou.
Os especialistas acreditam que os casos nos EUA podem estar subindo agora devido à atual fase da pandemia de Covid-19.
A temporada típica de VSR parece ter mudado depois que todos ficaram em casa em 2020 e 2021 para evitar a propagação do coronavírus. As contagens de casos foram baixas e isso criou uma “lacuna de imunidade”.
As crianças que normalmente teriam sido contaminadas pelo vírus nesses anos estão, em vez disso, pegando agora.
Quem é vulnerável
O CDC diz que a maioria das crianças vai pegar o vírus em algum momento da vida antes dos 2 anos. Trata-se de um vírus altamente contagioso que muitas vezes não causa doenças graves, exceto em idosos, pessoas com doenças cardíacas ou pulmonares crônicas ou com um sistema imunológico enfraquecido, e em alguns bebês e crianças.
Não há tratamento específico para VSR e nenhuma vacina. Os sintomas geralmente duram uma ou duas semanas e diminuem com muita hidratação e repouso.
Para algumas crianças, no entanto, pode ser uma doença muito mais grave. O vírus pode ser especialmente perigoso para prematuros, recém-nascidos, crianças com sistemas imunológicos enfraquecidos ou distúrbios neuromusculares, e para menores de 2 anos com doença pulmonar e cardíaca crônica, diz o CDC.
O VSR pode evoluir para bronquiolite, na qual as pequenas vias aéreas podem ficar inflamadas e congestionadas, ou para pneumonia. Uma criança pode precisar ficar internada para receber oxigênio extra ou até ventilação mecânica.
Como o vírus se espalha
Uma pessoa infectada pode passar o VSR por meio da tosse ou espirros. Se as gotículas respiratórias caem numa superfície como uma maçaneta ou mesa e alguém tocar nela e, em seguida, tocar no rosto, a pessoa pode ficar doente.
Sintomas
O VSR é um vírus comum, mas pode causar doenças graves, especialmente em crianças pequenas e idosos. Os sintomas podem aparecer em estágios e não todos de uma vez, de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA.
Os sintomas incluem:
- Nariz congestionado;
- Diminuição do apetite;
- Tosse e espirro;
- Febre;
- Chiado no peito.
“Em bebês, os únicos sintomas podem ser irritabilidade, diminuição da atividade e dificuldades respiratórias”, segundo o CDC.
Geralmente, é uma doença tão leve que os adultos não percebem que têm ou pensam que não é mais do que um resfriado ou alergia e interagem com outras pessoas.
“Não se trata de um vírus que causa fadiga, como é o da gripe ou da Covid; a pessoa se sente bem”, afirmou Edwards. “Só que aí seu vizinho tem aquele bebê fofo e você vai visitar, leva alguma coisa, beija esse bebê novinho. Você não se sente doente. Só que, infelizmente, você passa o vírus para ele, que pode até ficar internado depois”.
Os irmãos mais velhos podem também transmitir o vírus aos mais novos. “Os bebês babam nos outros e colocam tudo na boca, então as creches também são um foco de transmissão” disse Edwards.
Se o seu filho está com tosse ou letárgico, ou se simplesmente anda parecendo outra criança, é uma boa pedida levá-lo ao pediatra. Ali, ele pode ser examinado para VSR, gripe, Covid-19 ou estreptocose. Os pediatras dizem que uma visita ao pronto-socorro pode ser necessária se o bebê estiver desidratado; se tiver respiração difícil, trabalhosa, superficial ou rápida; se tiver febre alta ou pele azulada; ou se deixar de responder. O CDC diz que a maioria melhora com cuidados médicos e pode frequentemente ir para casa depois de alguns dias.
Como evitar a contaminação
Segundo os médicos, a melhor maneira de prevenir infecções por VSR é ensinar as crianças a tossir e espirrar num tecido ou nos cotovelos em vez nas mãos. Tente também manter limpas as superfícies frequentemente tocadas.
“A higiene das mãos é a coisa mais importante que podemos fazer para nos manter seguros para nós e para os outros”, aconselhou Davis, do hospital infantil em Grand Rapids. Ela diz às pessoas para nunca tocarem no rosto, a menos que tenham lavado as mãos recentemente.
Quando crianças ou adultos estão doentes, eles precisam fazer algo fundamental: “Fique em casa quando estiver doente para que não propague qualquer doença respiratória que você tenha”.
Sizemore, citada no começo da reportagem com a filha ainda internada com VSR mas já em melhores condições, também aconselha as pessoas a levar o vírus a sério.
“Gostaria que os outros pais soubessem que não dá para ficar esperando a tosse passar sozinha, é preciso levar os sintomas a sério”, aconselhou. “A situação poderia ter sido muito pior se não tivesse buscado ajuda para a Raegan.”
* Brenda Goodman, Jamie Gumbrecht, Deidre McPhillips e Chris Boyette, da CNN, contribuíram para esta reportagem.