Quem são os profissionais por trás dos respiradores de pacientes com COVID-19
Pouco conhecidos, terapeutas respiratórios são fundamentais para pacientes infectados com o novo coronavírus
A rápida disseminação do novo coronavírus fez com que muitos países entrassem em uma disputa para comprar ventiladores pulmonares para se preparar para o ápice de casos da doença.
E, embora a escassez de ventiladores continue sendo um problema sério, muito menos atenção foi dada aos profissionais de saúde necessários para operar essas máquinas: os terapeutas respiratórios.
“Não é apenas essa máquina sobre a qual falam na TV que não temos o suficiente. É muito complexo”, disse Julie Eason, diretora do departamento de terapia respiratória do Hospital Universitário do Brooklyn, parte da SUNY Downstate Health Sciences University.
“Se você não configurar corretamente, o resultado do paciente será diferente. Você precisa de pessoas qualificadas e com muita experiência fazendo isso para obter bons resultados com esses pacientes”, disse.
O terapeuta respiratório é treinado especificamente para tratar pessoas com problemas respiratórios. Em meio à pandemia de coronavírus, a especialidade da função trouxe a eles um novo nível de reconhecimento para um trabalho que sempre esteve na lista das funções desconhecidas dentro dos hospitais.
“Até hoje, quando eu dizia às pessoas que sou terapeuta respiratório, elas me olhavam sem entender [o que eu faço]”, disse Lisa Shultis, terapeuta respiratória e diretora do programa de cuidados respiratórios da Universidade de Long Island. “Agora eles me olham com medo.”
Terapeutas respiratórios são responsáveis por acompanhar os níveis de oxigênio dos pacientes do COVID-19, gerenciar a respiração deles e, se necessário, os entubar e instalar um ventilador mecânico.
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Existem 155.000 terapeutas respiratórios registrados nos EUA, de acordo com a Associação Americana de Cuidados Respiratórios (AARC, em inglês). Ainda assim, o trabalho deles permanece “praticamente desconhecido”, disse Tom Kallstrom, CEO e diretor-executivo da AARC.
“Nos programas de médicos [na TV], eles nunca mostram terapeutas respiratórios”, disse ele. “Eles mostram outros profissionais fazendo o que nós fazemos. Sou grato por saber que pelo menos [agora] as pessoas sabem quem somos.”
O que os terapeutas respiratórios fazem?
Como o nome sugere, os terapeutas respiratórios concentram-se na respiração dos pacientes – questão central da pandemia do novo coronavírus.
Em tempos normais, os terapeutas respiratórios tratam condições agudas, como bebês prematuros com pulmões subdesenvolvidos ou adultos com ataques cardíacos, além de problemas crônicos, como asma ou doença pulmonar obstrutiva crônica.
Agora, porém, o coronavírus é o foco. O coronavírus causa o COVID-19, que afeta os pulmões e pode causar pneumonia, falta de ar e, no pior dos casos, síndrome respiratória aguda grave (SRAG).
“Esses pacientes são muito diferentes dos pacientes que já vimos antes”, disse Eason. “Normalmente, temos alguns pacientes que estão neste nível de doença. [Agora] nossas UTIs estão cheias deles. Nenhum deles consegue respirar [sem auxílio].”
Um tratamento para esses problemas é fornecer oxigênio suplementar através de uma cânula nasal, um dispositivo que entra no nariz do paciente. Se isso não funcionar, um tratamento mais extremo é colocar um tubo na garganta do paciente, conhecido como entubação, e conectá-lo a um ventilador mecânico que respire por ele. Muitas vezes, essa é a melhor estratégia para recuperar um paciente em estado deteriorado de saúde.
Os terapeutas respiratórios têm a tarefa de acompanhar os níveis de oxigênio do paciente e trabalhar com os médicos para decidir quando usar esses tratamentos. “Requer muito conhecimento, experiência e habilidade para aconselhar um médico sobre a melhor maneira de ventilar [um paciente]”, disse Tom Barnes, membro do corpo docente e consultor do programa de mestrado de Liderança em Cuidados Respiratórios da Northeastern University.
Seu trabalho ajuda a diminuir as responsabilidades de médicos e enfermeiros. “Nenhuma das partes têm o conhecimento e treinamento em ventiladores mecânicos que um terapeuta respiratório tem”, disse Kallstrom. “É um sistema com três especialistas. Você precisa do seu médico, do seu enfermeiro e do terapeuta respiratório trabalhando continuamente juntos.”
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Às vezes, os terapeutas respiratórios fazem as entubações. Eles montam e gerenciam os ventiladores. Então, eles ajustam o aparelho para as necessidades do paciente: o volume da respiração, o número de respirações por minuto, a concentração de oxigênio, a pressão das vias aéreas e mais variáveis. E eles configuram alarmes na máquina para que, se algo der errado, o ventilador alerte um atendente próximo rapidamente.
“É como sentar-se no cockpit de um avião: você não saberia o que fazer”, disse Kallstrom. “Não acho que um ventilador seja tão confuso, mas existem muitos botões e modos que um ventilador moderno tem.”
Também pode ser perigoso. Como os terapeutas respiratórios às vezes são os que fazem as entubações, eles têm contato com as vias aéreas abertas de um paciente infectado e correm riscos de pegar o vírus.
“Você precisa ver para onde está indo com esse tubo, para entrar na traqueia e não no esôfago. É muito difícil quando você faz isso com máscara, óculos, e todo o equipamento”, disse Shultis. “O paciente está respirando bem no seu rosto. É por isso que é muito perigoso. É por isso que é imperativo que tenhamos o equipamento de proteção individual certo, especialmente para os terapeutas respiratórios.”
Shultis, Kallstrom e Barnes disseram que ficaram frustrados ao ver membros do governo e a mídia discutirem a necessidade de ventiladores sem reconhecer o papel dos terapeutas respiratórios.
“Eles estão por aí trabalhando duro e é difícil quando as pessoas não os reconhecem”, disse Barnes.
Shultis disse que, mesmo dentro de hospitais, os terapeutas respiratórios geralmente não são reconhecidos em pé de igualdade com outros profissionais de saúde.
“Chamem-nos pelo nome da nossa profissão. Não somos apenas as pessoas que comandam os ventiladores. Somos terapeutas respiratórios. Somos uma profissão importante na equipe de saúde”, disse ela.