O que sabemos sobre o novo surto de doenças respiratórias na China
Autoridades chinesas afirmaram que não identificaram nenhum patógeno incomum ou novo
Um novo alerta sobre surtos de doenças respiratórias e casos de pneumonia em crianças na China chamou a atenção da comunidade internacional nesta semana.
Desde meados de outubro, o norte da China relatou um aumento de doenças semelhantes à gripe, em comparação com o mesmo período dos três anos anteriores, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Nos últimos dias, a imprensa de cidades como Xian, no noroeste do país, publicou vídeos de hospitais lotados de pais e crianças aguardando exames. Fotos de crianças fazendo lição de casa enquanto recebiam soro intravenoso no hospital também foram postadas nas redes sociais.
Além disso, houve preocupação com um alerta publicado na terça-feira (21) pelo serviço de monitoramento ProMED, que faz parte da Sociedade Internacional de Doenças Infecciosas, sobre uma “pneumonia não diagnosticada – China (Pequim, Liaoning)”.
O alerta foi publicado depois que uma notícia sobre o assunto foi veiculada pela FTV News de Taiwan, também na terça-feira.
O texto padrão do aviso é similar ao utilizado no surgimento da Covid-19, em 30 de dezembro de 2019: “Pneumonia não diagnosticada – China (Hubei)”.
Entretanto, cientistas ponderaram que a semelhança entre os dois alertas não significa que os casos tenham sido causados por um patógeno emergente que poderia desencadear uma pandemia.
Eles destacaram que, com base nas informações até o momento, é mais provável que seja um aumento em outras infecções respiratórias comuns, como a gripe, como foi visto em muitas partes do mundo depois que as restrições da Covid foram suspensas. Isso também poderia sinalizar um ressurgimento da própria Covid.
China diz que não há “patógeno incomum”
Nesta quinta-feira (23), as autoridades de saúde chinesas informaram que não detectaram nenhum patógeno incomum ou novo, assim como quadros clínicos incomuns, inclusive em Pequim e na província de Liaoning, no nordeste do país, de acordo com um comunicado Organização Mundial da Saúde. O número oficial de casos não foi divulgado.
A OMS havia pedido mais informações à China na quarta-feira (22), como tendências na circulação de agentes patogênicos conhecidos e a carga sobre os sistemas de saúde.
Também foram requisitadas informações epidemiológicas e clínicas, bem como resultados laboratoriais, através do mecanismo do Regulamento Sanitário Internacional.
A OMS sempre solicita informações dos países quando são registradas doenças não diagnosticadas ou desconhecidas, o que acontece com bastante regularidade.
No entanto, a entidade nem sempre divulga um comunicado à imprensa sobre isso, como fez na quarta-feira. Isso aconteceu após uma série de perguntas da imprensa mundial.
A organização também afirmou estar em contato com médicos e cientistas através das parcerias e redes técnicas existentes na China.
A OMS pontuou ainda que a China possui sistemas para coletar informações sobre tendências na incidência de doenças e para relatar esses dados a plataformas como o Sistema Global de Vigilância e Resposta à Gripe.
“Surto sazonal”, diz epidemiologista
O aumento das doenças respiratórias na China acontece em um momento em que o país se prepara para a sua primeira temporada de inverno completa desde que suspendeu as restrições rigorosas contra a Covid-19, em dezembro do ano passado.
Muitos outros países registraram aumentos semelhantes nos casos de doenças respiratórias após a flexibilização das medidas contra a pandemia.
“Trata-se apenas de um aumento sazonal relativamente grande, talvez em parte devido ao acaso, e em parte porque há uma certa ‘lacuna de imunidade’ devido a menos casos de inverno nos últimos três anos”, explicou Ben Cowling, epidemiologista da Universidade de Hong Kong.
As autoridades chinesas também atribuíram o fato à suspensão das restrições da Covid-19 e à circulação de vírus como o da gripe e o Mycoplasma pneumoniae, que causa uma infecção bacteriana comum que normalmente afeta crianças mais novas e que circula desde maio.
Além disso, vírus da gripe, vírus sincicial respiratório (VSR) e adenovírus estão em circulação desde outubro.
As autoridades da Comissão Nacional de Saúde da China realizaram uma conferência de imprensa em 13 de novembro para relatar um aumento na incidência de doenças respiratórias.
A pneumonia não diagnosticada não foi mencionada na coletiva de imprensa da semana passada, de acordo com uma transcrição, mas um porta-voz chinês disse que todos sentiam que houve um aumento de doenças respiratórias este ano em comparação com três anos atrás.
Ele afirmou que a monitoração global do Mycoplasma pneumoniae tem estado em baixa nos últimos três anos e os surtos são cíclicos, ocorrendo a cada três a sete anos.
A Comissão Nacional de Saúde da China não respondeu imediatamente a um pedido de comentário da Reuters.
Nesta quinta-feira (23), a agência de comunicação estatal chinesa Xinhua publicou uma entrevista com representantes da comissão de saúde chinesa na qual aconselhavam os pais sobre o que fazer.
Na entrevista também foi mencionado que os grandes hospitais estavam recebendo um grande número de pacientes e que os tempos de espera eram longos.
Especialistas pedem cautela
Brian McCloskey, um especialista em saúde pública queassessorou a OMS sobre a pandemia, ressaltou: “O que estamos vendo é o sistema do Regulamento Sanitário Internacional da OMS em ação”, referindo-se às regras que regem como os países trabalham com a organização em possíveis surtos.
“Não vou apertar o botão de pânico de pandemia com base no que sabemos até agora, mas estarei muito interessado em ver a resposta da China à OMS e ver a avaliação da OMS após isso”, destacou.
Além disso, Marion Koopmans, virologista holandesa que também assessorou a OMS sobre a Covid-19, afirmou que “temos que ser cuidadosos. Realmente precisamos de mais informações, especialmente informações de diagnóstico”.
“Há uma hipótese plausível de que isso pode ser o que vimos em outras partes do mundo quando as restrições foram suspensas”, acrescentou. A mesma opinião foi compartilhada por todos os cientistas contactados pela Reuters.
O virologista Tom Peacock, do Imperial College de Londres, que acompanhou de perto o surgimento de novas variantes do coronavírus, afirmou que há boas ferramentas disponíveis para detectar “muito rapidamente” os vírus emergentes da gripe ou do coronavírus, de modo que parece improvável que isso tenha acontecido sem que se percebesse.
“Suspeito que pode acabar sendo algo mais ‘mundano’ ou uma combinação de coisas — como Covid e gripe –, mas espero que saibamos mais em breve”, concluiu.
Medidas recomendadas pela OMS
A OMS ressaltou que, embora precisasse de informações adicionais, recomendou que a população na China siga medidas para reduzir o risco de doenças respiratórias.
Isso inclui:
- vacinação;
- manter distância de pessoas doentes;
- ficar em casa quando doentes;
- fazer testes e receber cuidados médicos conforme necessário;
- usar máscaras conforme apropriado;
- garantir uma boa ventilação; e
- lavar regularmente as mãos.
A organização de saúde não desaconselha viagens e comércio, pois tem monitorado a situação junto às autoridades.