Médica é agredida por indígenas após morte de criança Yanomami em Roraima
Falta de helicóptero pronto para transporte dificultou resgate da profissional
Na tarde da última quarta-feira (15), a médica Maria Vanessa Dantas, de 38 anos, estava fazendo um tratamento de tungíase, um tipo de parasitose, em uma criança indígena, no posto de saúde da comunidade. A paciente começou a convulsionar e no Pólo Xitei não teria medicação para convulsão. Então, os indígenas levaram a criança para a comunidade, onde ela morreu.
Em contrato firmado com o Ministério da Saúde, um helicóptero fica na terra indígena para deslocamentos de urgência médica, mas, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), desde o dia 17 de junho, a Icarai Turismo Táxi Aéreo estava suspensa, conforme portaria 1569/2020.
O motivo foi a empresa não ter demonstrado possuir controle sobre a qualificação de seus tripulantes, permitindo que estes tripulassem aeronaves sem estarem aptos pelos critérios do Regulamento Brasileiro da Aviação Civil (RBAC) de número 135.
Uma profissional da saúde que trabalha no local e que pediu para ter a imagem preservada disse que, apesar do helicóptero estar na aldeia, eles ficaram sem alternativas pela falta de um resgate aéreo — e essa inércia causou um tumulto.
“Quando acontece alguma coisa com os indígenas, eles começam a gritar na língua deles, a gente consegue compreender muito pouco, mas sabe que é um lamento da morte. A informação que a gente tem é que logo depois a criança morreu e o pai dela foi ao posto atrás da médica com uma flecha para matar ela”, revela.
Segundo a colega, Vanessa ficou escondida no posto, mas horas depois ela foi encontrada por seis indígenas que invadiram o local.
“Eles estavam armados com pau, machado, facão e começaram a agredir ela. Ela teve os dois braços quebrados, fratura no crânio e vários cortes pelo corpo. As agressões duraram entre 10 a 15 minutos. Depois que eles foram embora, a equipe de técnicos de enfermagem começou cuidar dela porque ela estava desmaiada e havia perdido muito sangue”, lembra a profissional.
Ela diz ainda que a equipe teve que esperar amanhecer da quinta-feira (16), para conseguir fazer contato de socorro por rádio com o Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y). Um helicóptero de outra empresa foi solicitado e a equipe foi retirada do local e, horas depois, foram levados da comunidade Surucuru para a capital Boa Vista, em um avião pequeno.
Procurada, a Secretaria de Estado da Saúde de Roraima (Sesau), por meio da direção do Hospital Geral de Roraima Rubens de Souza Bento, informa que a médica agredida no Dsei Yanomami, deu entrada no setor de grandes traumas, na noite desta quinta-feira. Informam ainda que a paciente recebeu atendimento pela equipe médica de plantão e passou por procedimento cirúrgico para correção ortopédica. Maria Vanessa continua internada, sem previsão de alta hospitalar e, no momento, apresenta quadro de saúde estável.
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A CNN teve acesso a um documento interno da Coordenação Distrital da Dsei Yanomami enviado ao Ministério da Saúde com uma manifestação de repúdio. Leia a seguir:
“O Distrito Yanomami, vem a público expressar sua profunda indignação quanto ao fato ocorrido no Xitei, envolvendo uma médica do programa Mais Médicos para o Brasil, que foi agredida pela comunidade”
Tendo em vista que, o distrito tem como objetivo prestar assistência básica a saúde indígena, conforme a PNASPI, para tanto desloca seus profissionais através de escalas diárias para cuidar da população que tanto necessita no ambiente em que vive.
Considerando a nota emitida pela Texoli Associação Ninam do Estado de Roraima-TANER, informo que, o cuidar da vida humana é prioridade para o Dsei Yanomami, assim como, o respeito pela cultura da clientela assistida.
Por conseguinte, realizamos um conjunto de ações de saúde com objetivo mitigar possíveis danos que possam evoluir a óbito dentro das comunidades indígenas. Dessa forma, ficamos profundamente consternado com agressão sofrida pela Médica, em plena realização de do seu trabalho como profissional na comunidade do Xitei”, diz o documento.
Procurados, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e o Ministério da Saúde ainda não responderam os questionamentos da reportagem.