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    Especialistas explicam como e por que acontece a redução da imunidade pós-vacina

    Estudos apontam redução de anticorpos com o passar do tempo, mas a resposta imunológica conta com outros fatores de proteção

    Lucas Rocha, da CNN, em São Paulo

    O desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19 aconteceu em prazo recorde. Os processos que podem levar até 10 anos foram concluídos em menos de um ano com o objetivo de frear o avanço da pandemia.

    Após as análises que certificaram que os imunizantes são seguros e eficazes contra o desenvolvimento de doenças graves, hospitalizações e mortes causadas pela infecção do novo coronavírus, os cientistas se concentram em uma outra etapa: entender quanto tempo dura a proteção oferecida pelas vacinas.

    A resposta para essa pergunta permanece incerta, mas estudos recentes ajudam a montar o quebra-cabeças da imunidade induzida pelas vacinas.

    Vacinas de adenovírus x RNA mensageiro

    Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Oxford, no Reino Unido, mostrou que a efetividade da vacina da Pfizer reduziu em comparação com a prevalência da variante Delta no país. A efetividade da vacina após a segunda dose reduziu mais rapidamente, alcançando taxas semelhantes à do imunizante da AstraZeneca, que mostrou poucas alterações no mesmo estudo.

    Um amplo estudo do Reino Unido, publicado em julho, revelou que após a segunda dose, o imunizante da Pfizer mostrou uma efetividade de até 93,7% entre as pessoas com a variante Alfa e de 88% contra a variante Delta. Já para a vacina da AstraZeneca, a efetividade de duas doses foi de 74,5% para infecções com a Alfa e de 67,% diante da variante Delta.

    Um estudo publicado na revista Science avaliou a quantidade de anticorpos produzidos pela vacina de RNA mensageiro da Moderna ao longo de sete meses. A pesquisa avaliou os impactos de diferentes variantes do novo coronavírus, incluindo as variantes de preocupação Alfa, Beta, Gamma e Delta, originárias do Reino Unido, África do Sul, Brasil (Manaus) e Índia, respectivamente. A análise mostrou que a maior parte dos indivíduos apresentou uma persistência de anticorpos ao longo do período, contra todas as variantes, embora os níveis tenham baixado após seis meses.

    Os resultados dos estudos recentes abriram uma discussão se a proteção das vacinas de adenovírus, como as da AstraZeneca, Janssen, Sputnik V e CanSino, pode ser mais duradoura do que aquela conferida pelos imunizantes de RNA mensageiro, como os da Pfizer e da Moderna.

    Para os especialistas consultados pela CNN, não é possível afirmar que a tecnologia utilizada na produção das vacinas seja a razão principal para a varianção da efetividade. Os pesquisadores explicam que a formação da imunidade a partir das vacinas é um fenômeno complexo que está sujeito a uma série de variáveis, como o perfil da população vacinada, incluindo idade e questões genéticas, além das variantes do novo coronavírus em circulação.

    O pesquisador Jorge Kalil Filho, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), destaca que o conhecimento sobre a imunidade em relação à Covid-19 está em constante evolução.

    Para o pesquisador Luiz Almeida, microbiologista do Instituto Questão de Ciência, as diferenças entre a queda de imunidade das vacinas de adenovírus e de RNA mensageiro estão provavelmente relacionadas ao intervalo entre as duas doses.

    “O que está acontecendo é que por conta de termos feito um intervalo maior entre as doses da AstraZeneca, o nosso sistema imunológico acaba criando uma resposta mais prolongada para combater o coronavírus. Não é que as outras estão perdendo a eficácia. Estamos vendo que é esperado diminuir a quantidade de anticorpos, mas as células de memória tem que prevalecer”, explica o pesquisador.


    “Estamos vendo que tem um decaimento mais rápido de anticorpos com as vacinas de RNA do que com as vacinas de adenovírus, muito provavelmente por conta do intervalo entre as doses que estamos utilizando entre elas”, completa.

    Segundo o microbiologista, a eficácia e a efetividade das vacinas de RNA são extremamente altas. “Essa queda de efetividade está saindo dos 95% indo para cerca de 82% quando estamos falando de casos graves e mortes. Para a AstraZeneca, a gente via que era uma prevenção alta. A geral era de quase 70%, para a prevenção de mortes e casos graves era mais de 80% e não vimos uma queda tão brusca”, disse.

    Por que você não deve ser preocupar com isso agora

    As vacinas contra a Covid-19 são desenvolvidas a partir de diferentes tecnologias. Os imunizantes considerados clássicos, como a Coronavac, utilizam o vírus inativado ou atenuado, incapaz de se replicar. As vacinas também podem ser produzidas a partir de adenovírus enfraquecido, microrganismo que causa resfriado em chimpanzés, que transportam os genes virais do coronavírus para dentro das células humanas, como as vacinas da AstraZeneca, da Janssen e a Sputnik V. Um terceiro tipo de tecnologia são as vacinas genéticas, como a da Pfizer e da Moderna, que utilizam o material genético do novo coronavírus (RNA mensageiro ou mRNA).

    Embora cada tecnologia adote uma metodologia diferente, o objetivo é o mesmo: estimular a produção de anticorpos neutralizantes que vão reconhecer e eliminar o SARS-CoV-2, vírus causador da Covid-19.

    Tipos de vacinas existentes
    Tipos de vacinas existentes
    Foto: Arte/CNN Brasil

    Além disso, a resposta do sistema imunológico é complexa e vai além da ação de anticorpos. Quando as vacinas são inoculadas no organismo, elas também contam com uma função essencial de ativação de outras células de defesa do organismo, os chamados linfócitos T.

    A resposta celular gerada pelos imunizantes também envolve células de memória do sistema imunológico que permanecem no organismo. Assim, quando o indivíduo entra em contato com o novo coronavírus por meio de uma infecção natural, elas ativam a produção de anticorpos que respondem contra a infecção, evitando principalmente os casos graves, hospitalizações e mortes pela doença.

    Como funcionam as vacinas à base de adenovírus

    O adenovírus é um microrganismo responsável pelo resfriado comum em humanos ou chimpanzés. A estrutura do adenovírus é utilizada como meio de transporte para as informações virais do coronavírus pelas vacinas da AstraZeneca, Janssen, Sputnik V e CanSino. Para que isso aconteça sem riscos para a saúde, a produção de todos os imunizantes conta com um processo de inativação dos adenovírus que perdem sua capacidade de multiplicar no organismo humano.

    “A vacina de adenovírus fantasia um vírus que fica parecendo com um coronavírus e as nossas próprias células acabam produzindo a proteína Spike [principal mecanismo de entrada do vírus nas células humanas], a primeira resposta que temos contra isso é a formação de anticorpos. Dá um pico na produção de anticorpos, depois isso tem uma tendência natural de decair”, explica Luiz.

    Segundo o pesquisador, o próximo passo da formação da imunidade é a ativação da resposta celular, que inclui a ativação das células de defesa do sistema imunológico. “A resposta celular demora um pouco mais de tempo para acontecer. Temos células que conseguem reconhecer e destruir as células que estão infectadas pelo coronavírus e também células de memória, que guardam as informações do coronavírus e voltam a produzir anticorpos quando encontram o vírus no organismo”, explicou Luiz.

    Por dentro das vacinas de RNA mensageiro

    As vacinas à base de RNA mensageiro (mRNA) utilizam uma partículas de gordura que contém as informações do material genético do novo coronavírus. Quando inoculadas no organismo, as partículas ‘entregam’ as informações do SARS-CoV-2 para as células humanas que passam a produzir diversas cópias.

    “Essa informação genética é exatamente para a produção da proteína Spike. Não vai produzir nada do resto do vírus, apenas a pontinha da proteína S que é como se fosse a chave da fechadura para entrar nas nossas células”, explica Luiz.

    Quando as células humanas passam a produzir a proteína Spike, surge um alerta para o sistema imunológico que passa a gerar anticorpos e, posteriormente, a memória imunológica, que é o reconhecimento do vírus diante de uma infecção natural e a produção de anticorpos para combatê-lo.

    “Todo o resto do processo é exatamente igual para as duas tecnologias de vacinas: produz anticorpos, depois de um tempo decai, produz células de memória. Se der um impulso, volta a ter anticorpos e treina mais as células de memória”, afirma.

    Vacinas são eficazes e seguras

    Os pesquisadores explicam que as diferenças entre as vacinas de adenovírus e de RNA mensageiro são pontuais e que os dois tipos de imunizantes são eficazes e seguros contra a Covid-19.

    “Os adenovírus utilizam meio que um ‘cavalo de tróia’ que vai entregar a informação para que as células passem a produzir a proteína Spike. Enquanto as vacinas de RNA não usam nenhum vírus, usam uma partícula de gordura ou lipídica que vai entregar a informação genética para que as células comecem a produzir essa peça”, diz Luiz.

    “São mecanismos diferentes para fazer a mesma coisa, ambos fazem com a mesma premissa de produzir só a proteína S para apresentar ao sistema imunológico para que ele possa aprender a se defender”, conclui.

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