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    Dr. Sanjay Gupta: 5 equívocos comuns sobre a Covid-19 — e o que a ciência diz

    Correspondente médico da CNN dos Estados Unidos lista mitos e concepções errôneas sobre a pandemia do novo coronavírus

    Pesquisa sobre uma potencial vacina para a Covid-19 no laboratório da AstraZeneca em Sydney, Austrália
    Pesquisa sobre uma potencial vacina para a Covid-19 no laboratório da AstraZeneca em Sydney, Austrália Foto: Dan Himbrechts - 19.ago.2020 / AAP Image via Reuters

    Dr. Sanjay Gupta, Correspondente médico da CNN dos Estados Unidos*

    Desde o início de 2020, quando começamos a ouvir sobre um novo coronavírus, depois batizado oficialmente como SARS-CoV-2, nossa compreensão foi evoluindo sobre que esse vírus é, como infecta as pessoas, quem infecta e como podemos nos proteger. O conhecimento cresceu.

    Mas essa evolução — e as mudanças de informações e recomendações que a acompanharam — também semeou confusão e, em alguns casos, desinformação deliberada.

    “Assim como a Covid-19 se espalhou pelo mundo, também se espalharam rumores, inverdades e desinformação. E podem ser igualmente perigosos”, disse Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), na quarta-feira.

    A desinformação levou as pessoas a se auto-prejudicarem com base em falsidades, se automedicarem com produtos químicos tóxicos ou medicamentos perigosos e não tomarem os cuidados que deveriam tomar, disse Tedros.

    Essa desinformação também afetou nossa confiança nas instituições e sistemas de saúde, o que pode resultar em pessoas virando as costas para novos tratamentos e vacinas por não confiarem neles.

    Tedros disse que a OMS e seus parceiros estão “conclamando todos os países a implementarem planos de ação nacionais para promover informações de saúde baseadas na ciência e combater a desinformação. E apelamos à mídia, empresas de tecnologia, sociedade civil, pesquisadores e pessoas em todos os lugares para evitar que a ‘infodemia’ se espalhe “.

    Aqui estão alguns mitos e concepções errôneas comuns, e o que a ciência já sabe sobre eles.

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    Equívoco nº 1: apenas idosos são afetados pelo vírus

    Em um comício na última segunda-feira, o presidente americao Donald Trump disse: “[o vírus] afeta pessoas idosas. Pessoas idosas com problemas cardíacos e outros, se tiverem problemas. Isso é o que realmente afeta. É isso. Você sabe, em alguns estados milhares de pessoas [pegaram] e ninguém jovem. Abaixo de 18 anos, ninguém”.

    O fato é que pessoas de todas as idades foram afetadas pelo vírus. Embora as pessoas mais velhas tenham muito mais probabilidade de ficar muito doentes com a Covid-19 ou morrer se forem infectadas, as pessoas mais jovens não estão de forma alguma imunes.

    Na verdade, um novo estudo publicado na quarta-feira pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC) descobriu que adultos jovens de 20 a 29 anos representavam mais de 20% de todos os casos confirmados de Covid-19 nos Estados Unidos durante junho, julho e agosto — a maior taxa de incidência de todas as faixas etárias.

    O Centro Nacional de Estatística em Saúde dos Estados Unidos contabilizou mais de 1.800 mortes relacionadas à Covid-19 em jovens com menos de 35 anos, incluindo 419 em pessoas com menos de 25 anos. Além disso, 851 crianças menores de 18 anos foram hospitalizadas.

    Pessoas mais velhas podem ser mais suscetíveis porque têm mais doenças pré-existentes (chamadas de comorbidades) que tornam a infecção pelo coronavírus pior, ou seus sistemas imunológicos podem estar enfraquecidos com a idade.

    Alguns jovens também têm comorbidades que os colocam em maior risco de adoecerem. E, em algumas crianças, o vírus pode causar uma reação exagerada do sistema imunológico, criando inflamação e desencadeando uma cascata de reações químicas conhecidas como tempestade de citocinas, que causa estragos no corpo. É uma condição chamada síndrome inflamatória multissistêmica em crianças, conhecida como MIS-C.

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    Equívoco nº 2: as máscaras não protegem 

    Esse é talvez o equívoco mais controverso e politizado de todos. No início da pandemia, disseram-nos que as máscaras não eram importantes para aqueles que não mantinham contato regular e próximo com pessoas doentes. Além disso, devido à escassez que continua até hoje, fomos solicitados a salvar as máscaras N-95 para os funcionários da linha de frente.

    Mas as máscaras se tornaram obrigatórias depois que começamos a entender dois fatos muito importantes. A primeira é que as pessoas podem espalhar o vírus mesmo sem apresentar sintomas. E a segunda é que o vírus muito provavelmente se espalha pelo ar, em pequenas gotículas contendo vírus chamadas aerossóis, e não apenas por uma pessoa que entra em contato com uma superfície infectada ou grandes gotículas respiratórias.

    O maior especialista em doenças infecciosas da Casa Branca, Dr. Anthony Fauci, abordou a reversão da orientação sobre máscaras faciais durante uma conferência na CNN na última terça-feira. “Uma das coisas que o público precisa entender é que esta é uma situação em evolução”, disse ele.

    “Não sabíamos que 40% a 45% das pessoas eram assintomáticas, nem sabíamos que uma proporção substancial de pessoas infectadas se infectava de pessoas sem sintomas. Isso torna extremamente importante que todos usem uma máscara”, disse ele, observando que “os dados agora são muito, muito claros.”

    Como funcionam as máscaras? Elas protegem outras pessoas contra as gotículas contendo vírus do usuário da máscara, que são expelidas para o ar por meio da respiração, espirro, tosse, fala ou grito.

    Alguns estudos descobriram que as máscaras podem reduzir a quantidade de gotículas que uma pessoa respira no ar em até 90%. E outro estudo descobriu que as máscaras reduzem a transmissão de vírus respiratórios em até 56% .

    Mas nem todas as máscaras são iguais, então escolha com sabedoria. As máscaras cirúrgicas — as de papel que os médicos usam — têm um filtro com carga eletrostática que agarra as partículas virais como um cobertor agarra suas meias na secadora.

    Evite máscaras com válvulas; embora tornem a expiração um pouco mais fácil, eles liberam ar não filtrado — portanto, se o usuário estiver contaminado, não protege os outros, o que anula o propósito da máscara em primeiro lugar.

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    Pessoas de máscara caminham em Belém, no Pará
    Pessoas de máscara caminham em Belém, no Pará
    Foto: Bruno Cecim/Ag. Pará (28.jul.2020)

    Equívoco nº 3: só se pega Covid-19 após contato próximo com alguém que apresente sintomas

    Houve um caso emblemático em um coral no estado de Washington: dos 61 membros, havia uma pessoa sintomática e após 2,5 horas de prática em dois dias separados, 87% do grupo adoeceu.

    Foi uma evidência inicial de que o vírus poderia se espalhar não apenas pelo toque ou por meio de gotículas respiratórias (que tendem a cair no chão rapidamente e não viajar para longe), mas por meio de aerossóis, que podem permanecer no ar por horas e viajar muito mais longe do que 2 metros, especialmente em locais com baixa circulação de ar.

    Embora o CDC e a OMS ainda não reconheçam explicitamente isso, eles estão avançando nessa direção. O CDC chegou a publicar novas orientações sobre transmissão aerotransportada no fim de semana, mas a agência voltou às orientações anteriores na segunda-feira, explicando que o novo texto era uma versão preliminar que ainda não havia sido totalmente revisada.

    “O interessante sobre isso é que não muda nada do que temos dito”, disse Fauci durante a conferência de terça-feira. “Isso significa usar sua máscara, significa evitar contato próximo, significa evitar multidões.”

    Fauci também reiterou: “ao ar livre é melhor do que dentro de casa, porque, se você tem aerossol dentro de casa, pode ter alguma recirculação.”

    Considere que os estudos mostraram que cerca de 80% dos casos se originam de apenas cerca de 10% a 20% das pessoas. Não é porque esses indivíduos são de alguma forma diferentes, mas sim pela situação em que se encontram: espaços internos lotados como bares, restaurantes, fábricas, prisões ou reuniões que aproximam as pessoas, como casamentos ou igreja — eventos e espaços que favorecem a transmissão.

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    Equívoco nº 4: o vírus funciona como uma gripe

    O presidente Donald Trump insistiu: “isso é gripe, é como uma gripe”.

    Mas não é, na realidade. É verdade que Covid-19 e uma gripe são causados por vírus respiratórios e podem compartilhar alguns sintomas semelhantes, incluindo febre, fadiga e tosse. E, em ambos os casos, algumas pessoas apresentam sintomas mais leves do que outras.

    Mas também existem grandes diferenças. Embora os números mudem dependendo de algumas variáveis, de acordo com a estimativa mais recente do CDC, a probabilidade de morrer de Covid-19 — uma taxa de mortalidade por infecção — é muito baixa para pessoas com menos de 50 anos. Mas, para pessoas de 50 a 69 anos, é de 0,5%; e, para pessoas de 70 anos ou mais, salta para 5,4%. As chances gerais de morrer de gripe são de cerca de 0,1%.

    Além disso, este ano houve mais de 200.000 “mortes em excesso” até agora, em comparação com o ano passado. A maior diferença: Covid-19.

    De acordo com o CDC, “esses óbitos podem representar mortes por Covid-19 classificadas incorretamente ou podem estar indiretamente relacionadas à pandemia (por exemplo, mortes por outras causas que ocorrem no contexto de escassez de serviços de saúde ou sistemas de saúde sobrecarregados).”

    E, de acordo com as estatísticas do CDC, a Covid-19 provavelmente estará entre as 10 principais causas da morte do país em todas as idades em 2020. 

     

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    Comércio
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    Foto: Marcelo Camargo (05/08/2020)/Agência Brasil

    Equívoco nº 5: todos vão receber vacinas nos próximos meses

    Tem havido muita especulação sobre quando teremos uma vacina, com algumas projeções otimistas já em outubro. Vários dos desenvolvedores acreditam ter resultados para isso.

    Mas Fauci e outros líderes de saúde pública disseram que é altamente improvável que uma vacina esteja disponível até o dia das eleições americanas (3 de novembro). E a Agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA (FDA) está considerando novas regras para autorização de uma vacina contra a Covid-19 — o que, de acordo com três fontes familiarizadas com a situação, inviabilizaria aprovação até a eleição.

    Isso frustraria as esperanças do presidente Trump, que disse repetidamente que a vacina poderia estar pronta em 3 de novembro.

    Mesmo se uma vacina obtivesse autorização de uso de emergência ou aprovação total neste outono do Hemisfério Norte, não há como fisicamente haver doses suficientes disponíveis imediatamente para todos.

    “Se for eficaz em novembro ou dezembro, não teremos doses de vacina suficientes. Teríamos alguns milhões em novembro e talvez 10, 20 milhões de cada em dezembro. Isso será o suficiente para começar a vacinar certas populações, mas não toda a população”, disse-me o Dr. Moncef Slaoui, o chefe da Operação Warp Speed, a iniciativa de vacinas do governo americano.

    Slaoui — que observou que não é certo ainda que alguma vacina será eficaz porque os dados não estão disponíveis — disse que certos grupos, como profissionais de saúde e pessoas vulneráveis à doença, seriam priorizados. “Para o resto de nós, está mais para meados de 2021”, disse ele, um cronograma também apresentado por Fauci.

    Slaoui também voltou ao que Fauci e outros têm enfatizado. “Vamos nos concentrar no que a ciência nos diz para nos ajudar a superar isso. Estou animado como qualquer pessoa em receber uma vacina — mas, enquanto isso, existem coisas simples e eficazes que podemos fazer por nós mesmos: lavar as mãos, evitar grandes reuniões e vestir uma máscara.”


    *Nadia Kounang e Andrea Kane contribuíram para esta matéria

    (Este texto é uma tradução. Leia o original aqui)