Burnout parental: entenda o quadro de exaustão que afeta mães e pais
Estado de exaustão física e emocional pode afetar mães e pais devido à sobrecarga de responsabilidades relacionadas ao cuidado e à educação dos filhos
Exaustão emocional, falta de energia e pouca realização profissional são alguns dos sintomas que caracterizam a síndrome de Burnout. A condição é associada principalmente ao contexto do ambiente de trabalho, tendo sido reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um fenômeno ocupacional.
O estado de exaustão física e emocional também pode afetar mães e pais devido à sobrecarga de responsabilidades relacionadas ao cuidado e à educação dos filhos. O chamado “Burnout parental” é uma condição psicológica com consequências para as saúdes mental e física.
“Um dos principais sinais é a exaustão emocional constante. Pais que estão sofrendo de Burnout podem sentir-se sobrecarregados emocionalmente, sem energia para lidar com as demandas diárias da criação dos filhos. Além disso, a despersonalização é um aspecto importante do Burnout parental. Nesse caso, os pais podem desenvolver sentimentos de distanciamento emocional em relação aos filhos, manifestando indiferença, insensibilidade ou mesmo sentimentos negativos em relação a eles”, afirma a médica psiquiatra Jéssica Martani.
O burnout parental precisa ser investigado e tratado porque gera diversos sintomas emocionais e físicos que prejudicam a vida dos pais, afirma a pesquisadora Ana Letícia Senobio dos Santos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “É essencial que os pais procurem ajuda se acharem que estão sofrendo de Burnout parental, uma vez que essa condição piora a qualidade de vida”, orienta Ana.
Assim como no Burnout causado pela relação nociva com o trabalho, a diminuição da realização pessoal também é um sinal do problema relacionado à criação dos filhos.
“Pais com Burnout parental podem sentir-se inadequados, incapazes de cumprir as expectativas como pai ou mãe, o que resulta em uma perda de satisfação pessoal e realização na parentalidade. Além disso, o Burnout parental pode se manifestar através de sintomas físicos, como fadiga persistente, distúrbios do sono, dores de cabeça e musculares frequentes”, afirma Jéssica.
O estresse é algo natural, mas reconhecer que ele se tornou patológico é um desafio, afirma a psicóloga especialista em emoções Luana Ganzert. Ela recomenda atenção à intensidade dos sintomas, como falta de paciência e baixa tolerância.
“Crianças exigem cuidados e muita atenção, e quando o adulto está com baixa tolerância a coisas simples como, por exemplo: uma pergunta no momento de concentração, uma recusa ao ouvir o que a criança tem a falar, justificando a falta de tempo, ou alegando outra prioridade no trabalho, tudo isso, serve de alerta ao desenvolvimento da síndrome de Burnout parental”, afirma Luana.
Fardo desigual para as mães
O peso da criação dos filhos tende a cair com mais intensidade sobre as mulheres em relação aos homens, afirmam os especialistas.
“Recai sobre elas a dupla função de uma cultura que responsabiliza muito mais as mães pelos cuidados com os filhos do que os pais. Mas, há uma tendência para que isso se transforme uma sociedade inteira discute a função da paternidade. No entanto, ainda é muito comum que as mães fiquem com a carga maior dos cuidados com os filhos”, afirma o psicólogo Ronaldo Coelho.
O especialista afirma que as discussões sobre masculinidade devem envolver a ampliação da função do homem nesse contexto. “A licença paternidade também é uma discussão importante para que os homens possam estar mais presentes nos cuidados, principalmente com os recém-nascidos”, pontua.
Priorizar o autocuidado e cultivar uma rede de apoio são algumas das estratégias recomendadas para aliviar o cansaço excessivo do cuidado com os filhos.
“As mães muitas vezes colocam as necessidades dos outros antes das suas. É essencial reservar um tempo para si mesma todos os dias. Priorize o autocuidado, reserve um tempo para descansar, relaxar, fazer atividades que você goste e que lhe tragam prazer”, afirma Jéssica.
A especialista recomenda o estabelecimento de limites saudáveis nas relações, como aprender a dizer “não” diante de um momento de sobrecarga. Simplificar as tarefas diárias, como organizar um cronograma familiar, delegar tarefas apropriadas às crianças e estabelecer rotinas definidas podem tornar a administração da casa mais simples e a reduzir o estresse.
“Não tenha medo de pedir ajuda quando precisar. Conte com o apoio de seu parceiro, familiares, amigos ou outros membros da comunidade. Divida as responsabilidades parentais e as tarefas domésticas com os outros membros da família, sempre que possível”, diz a psiquiatra.
Os especialistas enfatizam a importância de contar com uma rede de apoio, incluindo familiares e amigos, além de grupos de mães, que compartilham experiências e dificuldades. “Um caminho são as redes de apoio, sempre pensando com quem que se pode contar são avós, tios, padrinhos, amigos ou mesmo outros profissionais que podem ajudar no cuidado com o bebê ou com a criança pequena. Isso vai ser importante para evitar o desgaste emocional e o possível Burnout”, diz Coelho.
“Participar de grupos de mães ou comunidades de apoio pode ser muito benéfico. Esses espaços oferecem uma oportunidade para compartilhar experiências, desafios e buscar conselhos de outras mães que estão passando por situações semelhantes. Você pode encontrar apoio emocional, trocar ideias e aprender estratégias de outras mães”, acrescenta Jéssica.
Pesquisa do Burnout parental no Brasil
Com o objetivo de mensurar a incidência do Burnout parental no Brasil, pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) desenvolveram um questionário.
A aplicação integra a pesquisa de mestrado da pesquisadora Ana Letícia Senobio dos Santos, no âmbito do Programa de Pós-graduação em Psicologia: cognição e comportamento da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich).
O levantamento busca identificar as condições que podem desencadear o Burnout parental, com o objetivo de fornecer dados para a proposição de políticas públicas, especialmente para pais de crianças com condições clínicas como o transtorno do espectro do autista.
“Quando descobrimos os fatores de risco, conseguimos saber onde intervir e como ajudar esses pais na clínica psicológica. Além disso, mapear esses pais nos ajudará a implementar novas posturas clínicas e políticas públicas que atendam a eles”, diz Ana.
O estudo desenvolvido por Ana Letícia faz parte de pesquisa mais ampla desenvolvida pelo Laboratório de Avaliação e Intervenção na Saúde (Lavis) do Departamento de Psicologia da UFMG. O questionário está disponível online e pode ser respondido, até o fim de junho, por pais e mães brasileiros.
“Já sabemos que o perfeccionismo é um dos fatores de risco associados ao burnout parental. Muitas vezes, os pais sentem a necessidade de ser perfeitos e de corresponder àquilo que a sociedade espera deles. Outro fator que pode interferir é a idade dos filhos. Investigar esses padrões nos dará ferramentas para lidar com o problema”, avalia.