STF julga disputa sobre data da cobrança do difal do ICMS
Ministros deverão definir se pagamento do diferencial de alíquota vale desde 2022, como defendem governadores, ou a partir de 2023, de acordo com empresas
O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar nesta quarta-feira (29) as ações que discutem a cobrança bilionária do diferencial de alíquota (difal) do ICMS. O caso é o primeiro item da pauta.
A disputa envolve empresas e governadores sobre o momento em que o pagamento deveria começar: se em 2022 ou só a partir de 2023.
Os estados entendem que a cobrança vale desde o ano passado e argumentam que o impacto na arrecadação é de cerca de R$ 10 bilhões.
O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) é um tributo estadual. O difal é uma forma de equilibrar a arrecadação do imposto nas transações entre o estado de origem da empresa e o estado do consumidor. A cobrança é relevante no contexto de aumento de compras online.
O setor privado, principalmente o varejo, defende que a cobrança só deveria valer a partir de 2023. Citam o princípio da anterioridade anual – tempo de “espera” até o próximo exercício financeiro para que um novo imposto passe a valer.
A discussão é feita no Supremo em três ações que serão julgadas conjuntamente. Os processos foram apresentados pelos governos de Alagoas e do Ceará e pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).
O relator dos casos é o ministro Alexandre de Moraes. Na sessão da última quinta-feira (23), as partes envolvidas nos processos fizeram suas manifestações no plenário da Corte.
As ações começaram a ser julgadas em setembro de 2022, no plenário virtual do STF. Em dezembro, o placar estava em 5 a 3 para que a cobrança tivesse validade a partir de 2023. A posição é favorável às empresas e contrária aos interesses dos estados.
Esse placar será zerado e a análise começará do zero no plenário físico. Isso porque o julgamento virtual foi interrompido por uma decisão da ministra Rosa Weber (já aposentada), que à época presidia a Corte. Ela resolveu tirar o caso do sistema virtual e remetê-lo ao plenário físico.
A medida foi tomada depois de Weber ter se reunido com quinze governadores. Na ocasião, eles manifestaram preocupação com a queda na arrecadação em caso de derrota no julgamento.
A cobrança do difal do ICMS foi estabelecida em uma emenda constitucional de 2015 e havia sido regulamentada por um convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
Em 2021, o STF declarou inconstitucional essa cobrança sem a existência de uma lei complementar para disciplinar esse mecanismo. Em dezembro do mesmo ano, o Congresso aprovou a norma sobre o tema, que só foi sancionada em 4 de janeiro de 2022.
A data da sanção originou a discussão sobre o início da cobrança, dada a anterioridade anual, conforme citado pelas empresas. Estados, por sua vez, argumentam que a lei não criou um novo imposto, se limitando a definir uma forma de divisão do tributo entre as unidades da federação.
Terceirização
A sequência da pauta traz recursos que discutem a extensão dos efeitos de uma decisão da Corte, de 2018, que validou a possibilidade de terceirização da atividade-fim em todas as atividades empresariais.
Essa forma de contratação passou a ser permitida com as leis da Terceirização e da Reforma Trabalhista, aprovadas em 2017 no governo de Michel Temer (MDB). Mas ainda havia a discussão judicial de processos que se arrastavam desde antes dessas normas.
Isso porque o Tribunal Superior do Trabalho (TST) tinha um entendimento diferente sobre o tema. O conjunto de decisões dessa Corte ao longo do tempo foi consolidado em uma súmula de 2011 que entendia como ilegal a terceirização da atividade-fim.
Em agosto de 2018, o Supremo decidiu que é lícita a terceirização em todas as etapas do processo produtivo, independentemente de se dar na área-meio (como serviços de limpeza ou segurança, por exemplo) ou na atividade-fim (a própria atividade da empresa, sua finalidade principal).
A posição foi tomada em dois processos, que foram julgados de forma conjunta, relatados pelos ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Fux.
No processo sob a condução de Fux, foi aprovada a seguinte tese de julgamento: “É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”.
A outra ação não teve uma tese, mas o relator havia esclarecido que o entendimento não afetaria automaticamente processos já encerrados que discutiram terceirização (por exemplo, não haveria uma anulação imediata de casos em quem empresas tenham sido condenadas por terceirização, antes da definição do STF pela legalidade dessa forma de contratação).
Depois, no processo sob a relatoria de Fux, a Corte chegou a “modular” os efeitos da decisão, em 2022.
Na ocasião, ficou decidido que os efeitos do entendimento que validou a terceirização só valeriam aos processos que ainda estavam em curso na data da conclusão do julgamento (em 30 de agosto de 2018). Os ministros também decidiram proibir a possibilidade de ajuizar ações rescisórias com o objetivo de derrubar decisões já encerradas sobre o tema.
A empresa Celulose Nipo Brasileira S/A (Cenibra) e a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) recorreram dessa modulação. São esses recursos que serão analisados agora pela Corte.
Os ministros começaram esse julgamento em setembro deste ano, em sessão virtual, mas a análise foi remetida ao plenário físico por um pedido de destaque de Cristiano Zanin.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestou por manter essa limitação feita pelo STF em 2022, impedindo que a validação da terceirização interfira nos processos já encerrados.
Cenibra e Abag dizem que há “contradição” na decisão do Supremo que modulou os efeitos da validade da terceirização.
Argumentam, por exemplo, que o STF só limitou os efeitos da decisão em um dos processos, e que o outro caso não teve essa diminuição no alcance do entendimento.