STF julga ação que pode diminuir validade de patentes e favorecer genéricos
Processo contesta a prorrogação da exclusividade de patentes com demora na aprovação
O Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar no próximo mês uma ação movida pela Procuradoria Geral da República para limitar em 20 anos o tempo de exclusividade da fabricação de um produto, a partir da solicitação da patente. O que já é previsto na legislação, mas uma brecha permite que o prazo de proteção chegue a até 30 anos caso o tempo de avaliação do processo pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) ultrapasse os dez anos.
O INPI reconhece que 46% das 66.182 patentes em vigor estão com prazo de validade maior do que 20 anos, devido ao previsto no parágrafo único do Art. 40 da Lei da Propriedade Industrial (9.279/1996).
“O problema não são os 20 anos, mas a prorrogação, esticar de maneira inconstitucional. Todo mundo quer proteger o inventor, mas precisa ser só no período previsto em lei”, afirma o advogado André Ramos Tavares.
Na ação, a PGR cita 74 medicamentos que tiveram ou que poderão ter patente estendida. Entre eles está o Remdesivir, aprovado pela Anvisa para tratamento da Covid-19. No entanto, o remédio teve três patentes aprovadas pelo Inpi entre outubro de 2020 e janeiro deste ano, após pedido de prioridade na análise do processo feito pelo Ministério da Saúde.
Os processos foram finalizados poucos meses antes de ultrapassar os 10 anos de avaliação. Nesse caso, as patentes do Remdesivir terão validade máxima de 20 anos.
Segundo o presidente da FarmaBrasil, entidade que representa a indústria farmacêutica de pesquisa, quanto mais longa a patente, maior o tempo para iniciar a produção de medicamentos genéricos, que são mais baratos.
“Não podemos nos arriscar a não ter acesso a esses medicamentos por causa de uma coisa que é contra a Constituição. Com relação aos preços, toda vez que o Brasil tem um genérico tem que ter uma redução de mínimo 35% sobre o preço do medicamento de referência. Quando se tem concorrência, tem reduções maiores que isso”, explica ele.
A assistente de RH Carina Toledo de Almeida não tem opção de comprar genéricos para o tratamento da esclerose múltipla. Ela depende de uma medicação que custa R$ 70 mil por ano e, por causa da extensão, terá patente válida até 2030.
“Se eu não tomar a medicação corro o risco de ficar na cadeira de rodas, de perder a visão, de perder qualquer movimento, seja dos braços e das pernas, ficar com constante formigamento. Se o convênio não cobrir eu vou ter que entrar com ação judicial e o trâmite é muito demorado”, conta ela.
A ação também cita os danos aos cofres públicos. Segundo estudo feito pela universidade federal do Rio de Janeiro, entre 2014 e 2018, o governo federal gastou mais de R$ 10 bilhões com nove medicamentos que teriam a patente expirada, mas receberam prorrogações. “É uma questão que precisa ser equacionada, mas não vai solucionar o nosso problema atual, que é também um problema de lei”, diz o advogado André Ramos Tavares.
Em nota, o INPI informou que tem trabalhado para avaliar os pedidos mais rapidamente e que a expectativa para este ano é diminuir para 22% o número de processos que ultrapassem os dez anos de avaliação. Também por meio de nota, a Roche, laboratório que produz a medicação da Carina, disse que entende que o assunto deve ser discutido pela sociedade, mas lembra que a patente é um mecanismo que fomenta a inovação na saúde, que tem altos custos por causa do longo tempo dedicado à pesquisa científica e ao desenvolvimento.