STF mantém decisão que autoriza polícia a pedir dados ao Coaf sem autorização judicial
Órgãos de investigação manifestavam preocupação sobre efeito que proibição teria em apurações
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou, nesta terça-feira (2), um recurso contra decisão que validou o uso de relatórios de inteligência produzidos pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) requisitados pela polícia sem autorização judicial prévia.
A decisão foi por unanimidade. Ela apoia a posição do ministro Cristiano Zanin, dada em novembro de 2023.
Para os ministros, o Supremo já estabeleceu que é válido o compartilhamento dos dados bancários e fiscais obtidos pela Receita Federal e pela Unidade de Inteligência Financeira (o antigo Coaf) com o Ministério Público ou polícias.
Decisão do STJ derrubada
No final do ano passado, Zanin derrubou um acórdão da sexta turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que havia barrado o uso de relatórios de inteligência do Coaf solicitados pela polícia.
A ação analisada pelo ministro era de um caso específico do Pará, mas havia uma preocupação de órgãos de investigação de que os efeitos da decisão do STJ pudessem dificultar diversas apurações pelo país.
Zanin citou essa repercussão em sua decisão e a repetiu no julgamento desta terça (2).
“Em audiências no meu gabinete, autoridades da Polícia Federal, do Banco Central e do próprio Coaf externaram preocupação com o efeito multiplicador do acórdão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça”, afirmou o ministro.
Conforme Zanin, o entendimento do STJ, além de dificultar as investigações, poderia acarretar “graves implicações” ao Brasil.
Isso porque existe, em termos de inteligência financeira, um padrão internacional de combate à lavagem de dinheiro, evasão de divisas, terrorismo e tráfico de drogas que, com todas as vênias, foi desconsiderado pela decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça
Cristiano Zanin
Entenda
O STF definiu em 2019 a possibilidade do compartilhamento de dados financeiros sem autorização judicial prévia. Em setembro de 2023, a sexta turma do STJ aplicou a tese do Supremo de forma mais restrita, para um caso concreto.
O relator no STJ, ministro Antonio Saldanha Palheiro, entendeu que o compartilhamento só seria válido quando os órgãos de controle identificarem indícios de irregularidades e enviarem ao MP ou à polícia. Para o magistrado, a polícia não poderia pedir os dados ao Coaf, por exemplo, por iniciativa própria e sem decisão da Justiça.
Ao derrubar essa decisão do STJ, Zanin entendeu que a interpretação dada pelo tribunal não é compatível com o que o STF decidiu.
O caso concreto era de uma proprietária de uma empresa de bebidas de Belém, que conseguiu no STJ a anulação do uso de relatórios de inteligência financeira numa investigação de suposta lavagem de dinheiro. O Ministério Público do Pará (MP-PA), então, recorreu ao STF para derrubar essa decisão.
Entidades da advocacia criminal eram favoráveis ao entendimento do STJ. A Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim), por exemplo, disse que o compartilhamento das informações do Coaf representa uma “quebra de sigilo” bancário.
Já Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) disse que o compartilhamento com o Ministério Público de informações de órgãos administrativos de fiscalização e controle “é amplamente utilizado em países democráticos e não representa qualquer quebra de sigilo ou violação de direitos dos investigados”.