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    Sergio Vale: Governo lança boa proposta para nova regra do teto

    Norma atual não engloba adequadamente os momentos de crise; riscos fiscais estão acima de ideologias e deveriam ser discutidos pelos espectros políticos

    Sergio Vale

    O governo lançou um balão de ensaio para uma nova regra do teto de gastos a partir do ano que vem. Mesmo que Bolsonaro não seja reeleito, o que parece o mais provável com as pesquisas recentes, a proposta merece atenção.

    Segundo o diagnóstico do Ministério da Economia, a meu ver correto, a regra atual não tem mecanismos contracíclicos e, dada a dificuldade de mudar os gastos obrigatórios, a queda rápida dos gastos em proporção do PIB comprimiu sobremaneira os gastos discricionários.

    Para ajustar isso, o governo lança a ideia de atrelar a regra do teto a dois componentes: o ciclo econômico e o tamanho da dívida bruta. Na proposta, que não vou detalhar aqui, o gasto público cresceria de acordo com o PIB, considerando um redutor de um ponto percentual caso a dívida esteja abaixo de 60% do PIB. Caso a dívida esteja entre 60% e 80% do PIB o redutor seria de 2%.

    Acima de 80% não haveria crescimento real do gasto. Além disso, abre-se a possibilidade de que em recessões o gasto aumente na mesma proporção da queda do PIB, em um efeito contracíclico que seria revertido na saída da recessão.

    Esse mecanismo mantém a regra do teto, mas mais flexível e crível, dado que não se correria o risco de em uma recessão ficarmos na dúvida sobre o que gastar a mais. Além disso, atrela a um parâmetro de dívida e corretamente sinaliza que há um teto para que essa regra funcione dessa forma.

    Há muito tempo acreditava que a regra do teto precisava ser aperfeiçoada para englobar alguma flexibilidade em relação aos movimentos cíclicos da economia, e a direção dada pelo governo vai no caminho correto.

    De qualquer maneira resta ainda discutir o forte aumento de gastos esperados para o ano que vem. Tenho impressão de que haverá uma janela em 2023 em que haverá uma forte licença para gastar com uma nova regra valendo a partir de 2024, especialmente se Lula for eleito.

    Para acomodar os gastos com precatórios, aumentos do funcionalismo e gastos sociais e de investimentos, parece que haverá um cheque em branco fiscal significativo ano que vem, mas que teria que ser acordado em troca de uma regra fiscal crível como esta lançada pelo governo a partir de 2024.

    Evidentemente, regras fiscais no Brasil têm o defeito de serem permanentemente quebradas. Mas a regra original, no meu entender, ao não englobar adequadamente os momentos de crise, tinha essa dificuldade de ser burlada como acabou acontecendo. Não teríamos passado pela elevada incerteza fiscal em que estamos vivendo desde 2020.

    Mas precisa haver um comprometimento entre os amplos espectros políticos sobre essa regra para que ela seja de fato crível. Por exemplo, se o governo Lula aprovasse a regra proposta pelo governo Bolsonaro a partir de 2024 com aumentos temporários programados para 2023 poderia ser um caminho do meio pluripartidário que tiraria muito do risco fiscal que estamos vivendo.

    Precisamos passar da ideologia para a análise concreta dos riscos fiscais, mas sem a ilusão de que poderemos manter tudo como está, pois politicamente sabemos que isso não vai acontecer.

    Se Lula de fato foi mais ao centro seria um belo gesto se houvesse um trabalho conjunto para pensar essa questão fiscal. Mas a polarização me parece um véu que tem cegado nossa política econômica consistentemente.

    Este texto não representa, necessariamente, a opinião da CNN Brasil.

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