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    Eleições 2022

    Presidente eleito encontrará país bem diferente daquele que presidiu

    Mudanças nas relações de trabalho, crescimento dos evangélicos e maior poder do Congresso são desafios para Lula

    Fernando Molica

    Eleito pela terceira vez para a Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) encontrará um país bem diferente daquele que administrou entre janeiro de 2003 e dezembro de 2010. Ao longo da campanha, o petista adaptou seu discurso, abandonou a ideia de revogar a reforma trabalhista de Michel Temer (MDB), passou a falar mais para os pequenos empresários e deixou de tratar o aborto como questão de saúde pública.

    Mas a quase escorregada ao falar de MEIs (microempreendedores individuais) no debate da Globo revelou que, lá no fundo, Lula ainda está preso ao sonho da carteira assinada, algo que milhões de brasileiros, até por falta de empregos bem remunerados, passaram a apostar mais no empreendedorismo, no individualismo e menos na busca de soluções coletivas como as que marcavam o sindicalismo, seu berço político.

    Uma lógica muito presente em igrejas evangélicas –a ideia de que a prosperidade é uma benção divina– e no pensamento liberal que ganhou força nos últimos dias.

    Por falar em evangélicos, Lula não poderá mais ignorar a força política do grupo. Em seus governos, estabeleceu uma boa relação com lideranças de igrejas que acabaram seduzidas por vantagens fiscais e outras benesses concedidas por Jair Bolsonaro (PL).

    O desafio agora será conversar com os fieis, de tentar estabelecer algum consenso em relação à chamada pauta de costumes e não fechar as portas para reivindicações de movimentos identitários presentes na esquerda.

    O petista também encontrará um Congresso Nacional que, pela fraqueza política de um presidente ameaçado por impeachment, acabou amealhando muito poder e muitas verbas. A eventual declaração, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), da inconstitucionalidade do orçamento secreto facilitaria a vida de Lula, que assim retomaria o controle de praticamente todos os investimentos federais.

    Mas isso também obrigaria o futuro presidente a negociar para conquistar maioria num Congresso que, apesar de ter ficado mais conservador, é formado, em sua maioria, por parlamentares que não são de esquerda nem de direita, e que, desde sempre, investem na troca de votos por algum tipo de concessão.

    Ele vai precisar da Câmara e do Senado para, logo de cara, conseguir viabilizar a continuação de bondades como o Auxílio Brasil de R$ 600 e o cumprimento da promessa de dar aumento real ao salário mínimo. Isso sem terminar de quebrar um país que perdeu o teto e vê o chão tremer em consequência de uma polarização que tende a comprometer o período de lua de mel que caracteriza o início de um mandato.

    Marcado por escândalos como o do Mensalão e do Petrolão, Lula sobreviveu a tantas acusações, a uma prisão, um renascimento quase inacreditável. Mas sabe que será vigiado de perto, que oposição, imprensa, Ministério Público e redes sociais estarão atentos para eventuais desvios, o que tem que ser feito com qualquer governo.

    Terá que fortalecer instituições de combate à corrupção enfraquecidas por Bolsonaro e provar ser capaz de, como disse Ciro Gomes (PDT), encantar tantas serpentes –sem ser vítima do veneno que, por pouco, não impediu sua nova eleição.