Presidenciáveis comentam reflexos dos 6 meses de Guerra na Ucrânia para o Brasil
Candidatos à Presidência listam medidas que tomariam caso eleitos para minimizar impacto do conflito na economia brasileira
A invasão russa à Ucrânia, que completa seis meses nesta quarta-feira (24), deu origem a uma guerra que ainda persiste e produz efeitos políticos e econômicos em todo o mundo. Para falar sobre os impactos da continuidade do conflito no Brasil, a CNN procurou os 12 candidatos à Presidência. Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Soraya Thronicke (União Brasil), Vera Lucia (PSTU) e Sofia Manzano (PCB) responderam.
Os candidatos Jair Bolsonaro (PL), Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB), Felipe d’Avila (Novo), Pablo Marçal (Pros), José Maria Eymael (DC), Leonardo Pericles (UP) e Roberto Jefferson (PTB) não responderam até a publicação deste texto.
No Brasil, a guerra interferiu, por exemplo, nos preços dos grãos e dos fertilizantes. Conforme a tabela de preços mínimos da safra de verão do Ministério da Agricultura, de 6 de julho, os reajustes chegaram a ter uma alta de até 107%. Já dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) apontam que, entre março de 2020 e março de 2022, a ureia, principal fertilizante derivado do nitrogênio, teve um aumento de 224%. O fósforo subiu 239%, e o potássio, 269%.
A Rússia invadiu a Ucrânia em 24 de fevereiro. O presidente russo, Vladimir Putin, justificou a ação na TV afirmando haver um “genocídio” em curso no leste ucraniano promovido por tropas “neonazistas” do país contra russos étnicos e separatistas da região.
O governo russo exige a desmilitarização da Ucrânia e o reconhecimento da independência de Donetsk e Luhansk, assim como o entendimento de que a Crimeia faz parte do território russo desde 2014.
A guerra já deixou 5.237 civis ucranianos mortos, segundo dados de julho do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH). Segundo informações dadas à Reuters pelo general Valeriy Zaluzhnyi, do alto escalão militar da Ucrânia, quase 9.000 soldados ucranianos foram mortos até o momento.
O que dizem os presidenciáveis
Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
A assessoria do petista respondeu a CNN com um tuíte publicado por ele em 22 de agosto: “Se eu ganhar as eleições, espero que a guerra entre Ucrânia e Rússia já tenha acabado. Caso contrário, faremos um esforço de diálogo para estabelecer novamente a paz. Não nos interessa qualquer tipo de guerra”.
Ao falar sobre o tema durante a campanha, Lula tem evitado criticar o presidente russo. Em outro tuíte de março, ele afirmou que as grandes potências “precisam entender que não queremos ser inimigos de ninguém”. “Não interessa a nós, nem ao mundo, uma nova guerra fria envolvendo Estados Unidos, China ou Rússia, arrastando o planeta inteiro a um conflito que pode colocar em risco a sobrevivência da humanidade”, escreveu.
Ainda em março, em visita ao México, o ex-presidente classificou como inadmissível que países instalem bases militares na fronteira com vizinhos. “É absolutamente inadmissível que um país reaja invadindo outro país”, disse.
Em evento na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), no final de março, Lula disse que a guerra poderia ser resolvida “em uma mesa tomando cerveja”. A declaração foi criticada por adversários e pela Embaixada da Ucrânia no Brasil.
Em julho, o petista chegou a ser incluído pelo governo da Ucrânia em uma lista de “oradores que promovem narrativas de propaganda russa”, depois de dizer que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, era tão culpado pela guerra quanto Putin.
“E agora, às vezes fico vendo o presidente da Ucrânia na televisão como se estivesse festejando, sendo aplaudido em pé por todos os parlamentos, sabe? Esse cara é tão responsável quanto o Putin. Porque numa guerra não tem apenas um culpado”, afirmou em entrevista à revista Time. Dias depois, o nome de Lula foi retirado da lista.
Na segunda-feira (21), em entrevista a veículos estrangeiros, Lula afirmou que, se for eleito, pretende “interferir” para acabar com a guerra e que o conflito não leva a nada.
Jair Bolsonaro (PL)
O candidato não respondeu até o momento da publicação.
Em fevereiro, cerca de duas semanas antes do início da guerra, Bolsonaro se reuniu com Putin, em Moscou, contrariando recomendações da comunidade internacional. Na ocasião, ele afirmou que o Brasil era “solidário à Rússia”.
Bolsonaro minimizou a possibilidade de invasão da Ucrânia. Apoiadores chegaram, inclusive, a dizer que o brasileiro teria sido o responsável por “evitar uma 3ª Guerra Mundial”. Em entrevistas, o presidente disse que o objetivo do encontro era garantir o envio de fertilizantes ao Brasil.
Após a invasão russa, Bolsonaro manteve sua posição de neutralidade e disse que o papel do presidente brasileiro não era se posicionar. “Para nós, a questão do fertilizante é sagrada. E a nossa posição, como acertada com o ministro [das Relações Exteriores] Carlos França, bem como o senhor Ronaldo [Costa Filho, embaixador do Brasil na ONU] que nos representa no Conselho, é de equilíbrio”, afirmou.
Nos últimos meses, a guerra na Ucrânia foi citada por Bolsonaro para tentar explicar a inflação e as dificuldades econômicas. No início de março, o barril de petróleo chegou a ser comercializado a quase US$ 130, diante da imposição de uma série de sanções econômicas à Rússia. No Brasil, o preço dos combustíveis acompanhou o movimento internacional. Com apoio do presidente, o Congresso aprovou, em junho, a fixação de uma alíquota única para o ICMS dos combustíveis, para reduzir os preços nas bombas.
Na segunda-feira (21), em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, o presidente afirmou que o conflito “frustrou” suas propostas. “As promessas foram frustradas pela pandemia, por uma seca enorme que tivemos no ano passado e também pelo conflito da Ucrânia com a Rússia”, disse.
Ciro Gomes (PDT)
O candidato não respondeu até o momento da publicação.
Quando Bolsonaro declarou neutralidade, o pedetista criticou sua posição. Em março, afirmou em entrevista que a posição brasileira não poderia ser “dúbia” e pediu que Bolsonaro condenasse expressamente a invasão.
“O Brasil não pode ter dubiedade, nem dupla palavra. Temos que pura e simplesmente condenar a invasão unilateral da Ucrânia pela Rússia, aferrado ao princípio mais importante da nossa política externa, que foi amadurecida há mais de século. Há mais de quase 200 anos o Brasil vai construindo uma reputação internacional de um país que não tem conflito de fronteiras, de um país que não pretende roubar um metro de ninguém, um país que lidera um continente desnuclearizado”, disse.
Em abril, o candidato criticou a “destruição” da própria indústria ao falar sobre a dependência brasileira de fertilizantes importados. “Aconteceu uma invasão da Ucrânia pela Rússia, e o Brasil simplesmente tá tendo encarecido todo o custo do fertilizante (…). Nosso solo tem prodigamente todos os insumos dos adubos mais modernos do mundo, os nitratos, os fosfatos, enfim, o nitrogênio, tudo nós temos no Brasil. Nós estamos importando 80 de cada 100 toneladas de fertilizante do estrangeiro. Por quê? Porque o Brasil destruiu a sua própria indústria”, disse.
Em relação à política de preços da Petrobras, ele tem defendido acabar com a paridade internacional e criticado os lucros da empresa.
Simone Tebet (MDB)
A candidata não respondeu até o momento da publicação.
Em março, ela divulgou uma nota conjunta, assinada também pelo presidenciável Felipe d’Avila (Novo), repudiando a invasão e cobrando uma postura mais dura do presidente brasileiro em relação a Putin.
Segundo o texto, o Brasil deveria ser “solidário” à Ucrânia. O documento também foi assinado pelos então pré-candidatos Sergio Moro (então filiados ao Podemos) e João Doria (PSDB), que abandonaram a disputa meses depois.
“Nós, pré-candidatos à Presidência da República, tornamos público o nosso repúdio à invasão da Ucrânia e oferecemos a nossa solidariedade ao povo ucraniano. Pedimos à Rússia que retome o caminho da diplomacia para a restauração da paz”, dizia a nota.
Também em março, como líder da bancada feminina no Senado, ela participou de uma reunião fechada com o então presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna, e afirmou à CNN que a produção de fertilizantes no Brasil era uma questão emergencial.
Ela disse que alguns projetos estavam sendo analisados e sugeridos a fim de amenizar as implicações do mercado internacional no custo do diesel e da gasolina.
“O que está sendo proposto é fazer um colchão de estabilização, uma forma de poupar quando se está na baixa e de injetar o dinheiro para subsidiar quando se está em alta, fazendo uma poupança”, afirmou.
Fotos –
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Felipe d’Avila (Novo)
O candidato não respondeu até o momento da publicação. Em março, ele divulgou uma nota conjunta com Simone Tebet sobre o tema.
Vera Lucia (PSTU)
A candidata respondeu com a seguinte nota:
O Brasil poderia ajudar se apoiasse o povo ucraniano contra a agressão russa. Bolsonaro apoiou o Putin no início da guerra e até hoje se recusa a denunciar a invasão russa. Lula e o PT tampouco apoiam a Ucrânia contra a invasão, capitulam também a Putin, o que é um erro grave. Nós apoiamos o povo ucraniano.
A continuidade da guerra e seus efeitos na inflação mundial e na crise econômica são de responsabilidade de Putin em primeiro lugar, mas também dos governos de todo o mundo que não enviam as armas necessárias para a vitória do povo ucraniano.
Para minimizar os efeitos da guerra na economia brasileira, podem-se adotar algumas medidas importantes para diminuir a dependência externa, a exemplo da produção de fertilizantes. É necessário reestatizar as fábricas de fertilizantes da Petrobras que foram privatizadas. Assim, vamos voltar a produzir fertilizantes em nosso país, sem ficar refém de produtores internacionais que estão preocupados em apenas lucrar.
É preciso colocar um fim na política de Preço de Paridade de Importação (PPI), que tem elevado exorbitantemente os preços do combustível e do gás de cozinha, imposta a partir do governo Temer, em 2016, e mantida por Bolsonaro.
Por essa política, os preços cobrados no Brasil são determinados pela cotação da commodity no mercado internacional, e em dólar. Ou seja, os custos da Petrobras para a exploração do petróleo são reais, mas o preço cobrado aqui é o que se cobra lá fora em dólar. Isso prejudica a população brasileira e favorece os acionistas ― banqueiros e especuladores ― que detêm os títulos da Petrobras na bolsa de Nova York.
Bem como impor o fim na política de desmonte da Petrobras, principalmente com a venda das refinarias, que visa manter o país cada vez mais dependente do petróleo refinado, fazendo que vendamos petróleo cru para comprar o refinado mais caro. É uma lógica colonial de transformar o país em fornecedor de matéria-prima e dependente de produtos de maior valor agregado.
É necessário transformar a Petrobras em uma empresa 100% estatal, sem qualquer ação na mão de especulador ou banqueiro. Uma empresa que funcionará sob controle dos trabalhadores, para suprir as necessidades da população, vendendo o combustível e o gás de cozinha aqui a preço de custo. O Brasil é um dos maiores produtores de petróleo do mundo, não tem porque pagarmos caro por combustível e gás de cozinha.
Pablo Marçal (Pros)
O candidato não respondeu até o momento da publicação.
José Maria Eymael (DC)
O candidato não respondeu até o momento da publicação.
Sofia Manzano (PCB)
A candidata respondeu com a seguinte nota:
A guerra entre Rússia e Ucrânia é resultado das contínuas provocações dos Estados Unidos e da Otan no sentido de dominar aquela região. Mesmo os Estados Unidos tendo se comprometido a não expandir a Aliança Atlântica para os países do Leste, o que aconteceu foi o contrário, e o último bastião desse processo era a Ucrânia, que para a Rússia significava um enorme perigo, pois Moscou poderia ser atingida em apenas cinco minutos.
Como de costume, os imperialistas não esperavam uma reação militar da Rússia e calcularam errado a incorporação da Ucrânia à Otan. A reação militar russo pegou todos de surpresa e não restou à Otan assistir de longe aquilo que os russos estão chamando de Operação militar especial. Posteriormente, EUA, Otan e União Europeia impuseram um conjunto de sanções contra a Rússia, esperando colocar de joelhos a economia daquele país.
Mas novamente calcularam errado porque as sanções produziram um efeito bumerangue, uma vez que a Rússia já estava preparada para isso há vários anos e no final de contas as sanções se voltaram contra os Estados Unidos e, especialmente contra a Europa. Afinal, a Rússia é a grande fornecedora de gás e petróleo para os europeus.
Com a crise, os preços dessas matérias dispararam e, consequentemente, a inflação está assolando todos os países europeus e, inclusive, os Estados Unidos. Ao contrário do que EUA-Otan e União Europeia imaginavam, o rublo está agora mais forte e está se buscando a construção de uma nova ordem monetária internacional por fora do dólar, o que terá consequências severas para os Estados Unidos.
Leonardo Pericles (UP)
Este conflito é, na verdade, uma guerra de anexação da Rússia sobre o território ucraniano. É, portanto, uma guerra imperialista.
Há cem anos, surgiu o maior país já existente, a União Soviética, um Estado plurinacional, que promoveu o princípio da autodeterminação dos povos. Assim, nascia a Ucrânia como país integrante da nação socialista.
Putin, que é um anticomunista declarado, agrediu a soberania do povo ucraniano, ocupou boa parte de seu território, sob a justificativa de que a Rússia estava ameaçada militarmente.
É fato que a Otan se armou e cercou o território russo, mas a agressão de Putin não é só defensiva. Seu principal interesse é aumentar o poder econômico, político e militar sobre a Ucrânia para favorecer a burguesia russa, que anda prosperando por toda a Europa.
Por isso, defendemos que o Brasil se posicione na ONU e nos demais espaços pela suspensão imediata da guerra, que mata civis inocentes todos os dias.
Somos também da opinião de que a Otan deve ser dissolvida. Não há motivo algum para manter esta articulação militar de países.
Entendemos que o Brasil, por representar mais da metade do PIB da América Latina, deve encabeçar um bloco de países soberano para promover as relações de cooperação em nível internacional, sem protecionismo nem favorecimento.
Ucrânia e Brasil, por exemplo, são grandes produtores de grãos e derivados e podem estabelecer várias parcerias.
Roberto Jefferson (PTB)
O candidato não respondeu até o momento da publicação.
Soraya Thronicke (União Brasil)
A candidata respondeu com a seguinte nota:
O Brasil sempre foi reconhecido por sua posição diplomática perante conflitos entre outras nações. Mais recentemente, temos acompanhado a escalada da guerra entre Rússia e Ucrânia e todas as consequências que este conflito está causando no mundo.
A postura não intervencionista do país culmina automaticamente na ausência de apoio a nações que adotam este tipo de atitude.
Quanto ao impacto da guerra na Economia do Brasil, com relação a certos produtos, como é o caso do trigo, o país se deu conta de sua dependência, o que nos obriga a diversificar a produção. Trabalhamos muito com monocultura. Da mesma forma, precisamos de fertilizantes.
Em resumo, penso que o país não pode contar apenas com uma ou duas fontes para a aquisição de matéria-prima, seja ela qual for. Essa é a primeira lição de casa!
Agora, para atender a atual demanda e não deixar nenhum nicho desabastecido, é necessário que o país direcione seu olhar para novos mercados e, dentro do que seja possível financeiramente (no tocante à alta dos preços), diversificar seus parceiros comerciais. Daí, reitero a importância de o Brasil manter boas relações comerciais com as demais nações.
Contudo, é preciso analisar, na esteira das relações internacionais e nas searas diplomática e humanitária, qual nação está mais adequada a firmar contratos e acordos com o Brasil.
Fotos – as imagens dos candidatos à Presidência nas urnas
[cnn_galeria active=”1857008″ id_galeria=”1857015″ title_galeria=”Confira as fotos dos candidatos à Presidência que serão exibidas nas urnas”/]
Debate
As emissoras CNN e SBT, o jornal O Estado de S. Paulo, a revista Veja, o portal Terra e a rádio NovaBrasilFM formaram um pool para realizar o debate entre os candidatos à Presidência da República, que acontecerá no dia 24 de setembro.
O debate será transmitido ao vivo pela CNN na TV e por nossas plataformas digitais.
Com informações de Gabriela Ghiraldelli, Salma Freua e Leonardo Rodrigues, da CNN