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    ‘Podemos usar de violência’, dizem integrantes do Antifas à CNN

    Na primeira entrevista de um grupo Antifas a uma emissora brasileira, integrantes admitem que podem usar violência em manifestações e negam vínculo político

    José Brito e Renan Fiuza

    Da CNN, em São Paulo

    Na última semana, manifestantes de roupas pretas e rostos cobertos foram às ruas e acabaram entrando em confronto com apoiadores do governo e com a Polícia Militar de São Paulo. Eles são um grupo organizado de antifascistas, que pode usar violência para defender seus ideais: os antifas. A reportagem da CNN foi até uma ocupação que fica no centro de São Paulo, ponto de encontro do grupo.

    “Nós somos trabalhadores, somos jovens estudantes, pessoas inconformadas com o momento político que a gente vive no país e que buscam um futuro melhor pros nossos filhos, pros nossos amigos, pras nossas famílias, esses somos nós”, diz um dos integrantes dos Antifas, na primeira entrevista do grupo a uma emissora de TV brasileira. 

    Em entrevista exclusiva à CNN, os integrantes do grupo explicam que resolveram falar pela primeira vez  “pra contar um pouco o que nós somos, o que nós fazemos e por que nós lutamos de maneira radical nas ruas”.

    Em um quarto pequeno, a reportagem foi recebida por seis integrantes da organização. No alto, as bandeiras da “ação antifascista São Paulo”.

    Para eles, a roupa preta é uma tática política e tem o objetivo de dificultar a repressão do estado – mas eles garantem que não são ‘black blocks’.

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    Os ‘black blocks’ ficaram conhecidos durante as manifestações de 2013. Vestidos de preto e com máscaras, promoviam quebra-quebra nas ruas.

    Essa organização que topou falar com a CNN nasceu a partir de um grupo de amigos que se encontrava nas manifestações a favor de Dilma Rousseff, durante o período que culminou no impeachment da então presidente. Desses encontros, o grupo viu que precisava ir além das manifestações e formar um movimento político, de fato, e popularizar a luta contra o fascismo.

    “O antifascismo, ele busca a superação do capitalismo. A gente busca a superação do capitalismo, a gente busca a superação do machismo, do sexismo, da lgbtfobia e do racismo. a gente entende que essas estruturas de opressão que existem na nossa sociedade elas são estruturas de opressões fundamentadas na lógica capitalista. A gente entende que pra superar essas opressões a gente precisa superar o capitalismo.”

    Eles admitem que a violência pode ser usada como tática.

    “Sem dúvida. Existe a necessidade da violência. A gente vive num país em que a gente tem taxa de homicídios exorbitante, extrapolante, então, é necessário. A violência ela faz parte do ser humano, faz parte da sociedade capitalista, o estado é violento com a gente, a polícia é violenta e por que não se utilizar da violência também?”, diz um dos integrantes.

    “Sem dúvida nenhuma é necessário violência. A violência é revolucionária. A gente se utiliza da  violência porque a gente tem amor pelos nossos, a gente tem amor pelo diferente, e é isso”, declara.

    Questionados pela CNN se recebem dinheiro de alguma organização ou partido político, eles negam.

    “Absolutamente nenhum dinheiro. A diferença nossa pra extrema-direita é o seguinte: eles são organizados porque eles têm dinheiro. Nós somos organizados porque a gente acredita na luta, a gente acredita. Essa é a diferença.”

    O uso de táticas violentas chamou a atenção de deputados ligados ao governo federal. No dia seguinte à manifestação do dia 31 de maio, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) apresentou um projeto de alteração da lei antiterrorismo, sancionada em 2016, para enquadrar os antifas. A lei foi aprovada para punir possíveis crimes de terror durante os Jogos Olímpicos do Rio.

    “Nesse primeiro momento, eles estão ali, quietos, dizendo que estão se manifestando, mas sempre de forma hostil, eles apontam, tacam pedras, sempre xingando, de uma maneira hostil, mas retraída. Quando eles tiverem o primeiro momento pra atacar, eles vão atacar”, diz Silveira, que é ex-policial militar.

    Em São Paulo, existe uma delegacia especializada em investigar crimes de intolerância, a Decradi. A delegacia disse que tem um cadastro de integrantes de grupos intolerantes, incluindo alguns antifas. Segundo o órgão, diversas investigações estão em andamento e correm sob segredo de justiça.

    História

    Apesar de terem ganho as manchetes nos últimos dias, os antifas são uma organização antiga, que nasceu praticamente ao mesmo tempo que o movimento a que se opõe, o fascismo.

    “O regime autoritário começou a se desenvolver na Itália, no começo da década de 1920. Após o fim da Primeira Guerra, o país enfrentava uma forte instabilidade econômica, política e social e os partidos de esquerda ganhavam força”, diz o professor de Ciência Política Álvaro Bianchi, da Universidade de Campinas (Unicamp).

    Segundo ele, as principais características do fascismo são: a concentração do poder nas mãos de um líder; o culto a esse líder; o nacionalismo; a defesa de valores considerados tradicionais e a punição de pessoas contrárias ao regime.

    Assim, o antifascismo surgiu como reação a esse conjunto.

    “O antifascismo é um movimento de defesa e de reação à violência fascista. Ele não é um movimento de reação à ideologia exclusivamente, ele é um movimento de reação à violência que estava acarretando na morte de militantes socialistas e sindicais em um número muito grande, muito elevado na Itália.”

    Aqui no Brasil, o professor explica que o antifascismo aparece na década de 1930 com a frente única antifascista. Ela se opunha à ação integralista brasileira, inspirada no fascismo italiano.

    “No Brasil há um caso bastante conhecido, que é da frente única antifascista, que dispersa um ato dos integralistas na praça da sé na chamada revoada dos ‘galinhas verdes’. Este é um dos momentos mais marcantes da história do antifascismo brasileiro”, diz Bianchi.

    E foi nas ruas que surgiram os inimigos dos antifascistas, e também dos antifas. Um deles é Eduardo Fauzi, do movimento integralista, inspirado no fascismo. Ele ficou conhecido por atacar a sede do canal Porta dos Fundos, no Rio de Janeiro.

    “Nós integralistas somos pautados pela ordem, hierarquia e disciplina social, portanto, não existe possibilidade de diálogo entre ordem, hierarquia e disciplina social, entre Deus, pátria e família e anarquia, destruição, vandalismo, não existe possibilidade de diálogo entre essas duas correntes de pensamento. Portanto, não resta outra alternativa que ocorrer choques violentos entre uma coisa e outra”, diz Fauzi à CNN. Ele é membro da ação integralista brasileira, movimento ultranacionalista, conservador e católico de extrema-direita.

    Atualmente, o empresário vive na Rússia. Fugiu para o país um dia antes de o seu mandado de prisão sair e atualmente é procurado pela Interpol. As investigações seguem em andamento.

    Questionados pela CNN como reagem às declarações de Fauzi, os Antifas foram diretos: “Se a gente encontrar com eles é chute na bunda. sem conversa. Eles representam tudo que a gente odeia na nossa sociedade. Eles são a escória da humanidade. A gente luta pelo respeito ao próximo, o respeito ao diferente”.