PEC do Voto Impresso vai para votação em comissão: entenda mudanças propostas
Proposta sofreu alterações de última hora, mas deputados votam nesta quinta-feira (05) se texto vai a Plenário ou não avança mais no Legislativo
Um dos temas mais caros ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) deve receber uma importante resposta nesta quinta-feira (05): a comissão especial criada para debater a PEC 135/19, também conhecida como PEC do Voto Impresso, pode cravar se o projeto seguirá para a votação no plenário – com parecer favorável ou desfavorável a implementação da impressão do voto.
O projeto foi criado originalmente pela deputada Bia Kicis (PSL-DF) em 2019, e sofreu alterações do relator do texto na comissão especial, Filipe Barros (PSL-PR), ao longo da tramitação – incluindo mudanças feitas um dia antes da retomada dos trabalhos da comissão após o recesso parlamentar.
O cerne do projeto prevê a impressão do voto após registro na urna eletrônica, de forma que o eleitor possa conferir o(s) candidato(s) escolhido(s). Depois, a cédula de papel seria depositada em uma urna à parte, sem ser necessário o contato com o eleitor, e ficaria à disposição para a contagem final dos votos e uma possível auditoria, se assim fosse solicitado.
O texto possui complexidades que, para os críticos, geram custos altíssimos e fragilidades que comprometeriam a lisura do processo eleitoral. O voto impresso foi considerado inconstitucional em 2018 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e é criticado pela Justiça Eleitoral.
Por outro lado, defensores do projeto negam a rejeição à urna eletrônica em si e argumentam que o PL trata de transformar as eleições em um processo “auditável”, pela impressão do voto, seguindo exemplos internacionais. As alegações de Bolsonaro sobre a lisura do sistema fizeram com que o ministro Alexandre de Moraes incluísse o presidente no rol dos investigados no inquérito das fake news.
A votação na comissão especial estava prevista para acontecer antes do recesso, mas, após decisão do deputado Paulo Eduardo Martins (PSC-PR), que preside a comissão, o aval ou derrubada final foi prorrogado. Deputados de oposição chegaram a criticar o movimento, chamando-o de “manobra política” para dar mais tempo para a articulação pelos endossos à PEC.
Agora, no entanto, o tempo regimental para o debate acabou de fato, declarou Martins à CNN. Pelo regimento de tramitação de PECs, caso a pauta seja rejeitada, será designado um novo relator para consolidar um texto final para o tema – incluindo uma proposta de arquivamento do projeto.
De fato, a fase regimental da discussão está superada. O relator apresentou um relatório com modificações, isso ele tem que conversar individualmente com os deputados, até porque ele acolheu mudanças sugeridas por alguns. A reunião marcada para amanhã será para votação. Tendo um parecer do relator rejeitado, é designado um novo relator para fazer o voto vencedor. A ideia é que esse voto seja apresentado ainda amanhã
Paulo Eduardo Martins, presidente da comissão especial da PEC do Voto Impresso
O que diz a proposta
O deputado prevê alterar a Constituição Federal a fim de “assegurar o direito do eleitor de verificar a integridade de seu próprio voto por meio da conferência visual de registro impresso, bem como objetivando garantir que a apuração do resultado das eleições se dê por meio de contagem pública e manual dos votos”.
Essa última redação faz parte do conjunto de mudanças feitas por Filipe Barros na quarta-feira (04). O texto anterior afirmava apenas que “na votação e apuração de eleições, plebiscitos e referendos, seja obrigatória a expedição de cédulas físicas, conferíveis pelo eleitor, a serem depositadas em urnas indevassáveis, para fins de auditoria”. Leia a íntegra do novo relatório.
A PEC indica que os registros impressos de voto, que seriam adotados após tecnologia a ser implementada em acréscimo a todas as urnas eletrônicas, sejam conferidos pelo eleitor e depositados, de forma automática e sem contato manual, em “urnas indevassáveis”.
A contagem final para determinar os vencedores dos pleitos eleitorais seria feita exclusivamente pela aferição dos votos impressos, e não pelo o que foi registrado na urna eletrônica. Sobre a apuração em si, o deputado propôs que qualquer eleitor possa acompanhar a apuração. Hoje, há representantes políticos e do poder público neste processo.
Um artigo integrante das mudanças da última hora também propõe que seja retirado o poder de investigação do Tribunal Superior Eleitoral nas eleições. Segundo o substitutivo da proposta, “investigações sobre o processo de votação devem ser conduzidas de maneira independente da autoridade eleitoral pela Polícia Federal, sendo a Justiça Federal de primeira instância do local da investigação o foro competente para processamento e julgamento, vedado segredo de Justiça”.
Um artigo que dizia que o TSE editaria normas e adotaria medidas necessárias para assegurar o sigilo do exercício do voto foi retirado da versão final.
Pauta divide mundo político e jurídico
Um dos principais críticos a proposta é o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Segundo ele, o voto impresso não é mecanismo de auditoria do voto eletrônico, e é menos seguro porque precisa ser transportado.
“Estamos falando de 150 milhões de votos. Há regiões com milícias, roubo de cargos. Transportar votos, armazenar votos. Isso é um filme de terror: Porque, além disso tudo, tem que recontar os votos”, afirmou em evento no fim do mês passado. “Em um país que se compra e vende voto, é preciso conferir se o voto comprado foi entregue. Temos problemas de fraude, sigilo, custo, transporte. É um consenso que essa mudança é para pior. O sistema atual é consagrado”, declarou.
O entendimento do ministro é seguido por todos os ex-ministros do TSE, que reafirmaram, em carta, a confiabilidade do atual sistema eletrônico. “A contagem pública manual de cerca de 150 milhões de votos significará a volta ao tempo das mesas apuradoras, cenário das fraudes generalizadas que marcaram a história do Brasil”, destacaram.
Do outro lado, o presidente Bolsonaro e apoiadores apostaram em manifestações nas ruas para pressionar o Legislativo a caminhar com a proposta. O grupo também recebeu apoio de militares da reserva, que, em nota, disseram que “a inviolabilidade das urnas eletrônicas, atestada pela própria equipe técnica do TSE, não pode ser um dogma”.
No campo político, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que confia no sistema eletrônico, mas que o cenário ideal seria consolidar um texto que “sirva a todos”:
“O sistema brasileiro é confiável, não tem o que dizer a respeito dele. Mas uma grande parcela da população coloca dúvidas sobre o resultado do pleito. Nao é conveniente, para qualquer um que seja eleito, uma eleição contestada”, disse Lira em entrevista à CNN.
Desde o fim do primeiro semestre, no entanto, líderes partidários se movimentaram para enterrar o projeto no mês de agosto. Segundo apuração das analistas de política Renata Agostini e Daniela Lima, os partidos, que já se organizam contra mudanças no sistema eleitoral, reforçaram o posicionamento após ameaças do ministro da Defesa, Walter Braga Netto, sobre a realização das eleições.
Governadores também emitiram declarações contrárias à pauta da comissão especial. O projeto foi criticado por Romeu Zema (Minas Gerais), Helder Barbalho (Pará), Renato Casagrande (Espírito Santo) na quarta-feira, e já tinha sido alvo de críticas também vindas de João Doria (São Paulo).