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    Nunca me senti chantageado pelo Congresso, diz Paulo Guedes 

    Em entrevista exclusiva à CNN Brasil, o ministro da Economia diz que Augusto Heleno foi infeliz ao falar em "chantagem" do Congresso e defende pacto federativo

    Da CNN Brasil, em Brasília

    O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse em entrevista exclusiva à CNN Brasil que nunca se sentiu chantageado pelo Congresso. A declaração vem depois de o ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno, ter acusado o Parlamento de fazer chantagem para ficar com a maior parte dos R$ 30 bilhões que Executivo e Legislativo disputam dentro da discussão sobre o Orçamento impositivo — ou seja, as emendas parlamentares de execução obrigatória. 

    Para Guedes, Heleno “se expressou com infelicidade” sobre um assunto no qual o governo tinha o “ângulo defensável” de querer manter seu poder de decisão, em um regime presidencialista, sobre as despesas discricionárias — as de livre decisão do Executivo e que são minoritárias no Orçamento. 

    O ministro voltou a defender a aprovação de sua proposta para um novo pacto federativo, que descentraliza a distribuição do dinheiro público, como solução para os embates por verbas entre Executivo e Legislativo. “No pacto federativo, você está ‘descarimbando’ recursos e atribuindo responsabilidades de alocação orçamentária, o ônus e o bônus. Decidam para onde vai o dinheiro em vez de se criticarem mutuamente”, disse. 

    O projeto de um novo pacto federativo tramita desde novembro no Congresso como uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição). Para ser aprovado, precisa do voto de três quintos da Câmara e do Senado em dois turnos em cada Casa. A votação ainda não tem data para acontecer. 

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    A CNN Brasil entrevistou representantes dos três Poderes. Assista às entrevistas com o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados; com o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado; e o ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal. 

    Nossa produção tentou gravar uma entrevista com o presidente da República, Jair Bolsonaro, na sexta-feira, dia 13. Entretanto, devido à suspeita de diagnóstico do coronavírus, o Palácio do Planalto não confirmou a disponibilidade do presidente na última semana e a gravação não foi possível. 

    Leia abaixo a íntegra da entrevista do ministro da Economia, Paulo Guedes, à CNN Brasil

    Paulo Guedes em entrevista exclusiva à CNN Brasil
    O ministro da Economia, Paulo Guedes, concede entrevista exclusiva à CNN Brasil
    Foto: CNN Brasil – 15.mar.2020

    CNN Brasil: Ministro, sabemos que o senhor não responde pelo Executivo, o senhor não é o chefe do Executivo. Porém, a sua participação aqui é nos fornecer a sua visão, como braço importante do Executivo, naquele que é o tema central da nossa entrevista: as pessoas no Brasil estão ansiosas e indignadas, nervosas, querendo ver o país realizar o seu potencial; não querem mais um país do futuro. E quando elas enxergam, consideram o relacionamento entre os Poderes, elas não veem aquilo que a Constituição achou que aconteceria: um relacionamento harmônico e independente. O que está acontecendo? 

    Paulo Guedes: Nós estamos ainda em uma transição incompleta, é um aprendizado. E eu acredito firmemente no que eu chamo de a dinâmica de uma sociedade aberta. Eu estou observando, ao longo destas últimas duas, três décadas, um aperfeiçoamento institucional.  

    Os Poderes estavam inteiramente alinhados, em um regime politicamente fechado. Nós vimos um grito de independência do Legislativo, quando ele fez um impeachment à direita e depois um impeachment à esquerda. O Executivo tentou comprar influência parlamentar, despertou o Judiciário, que prendeu o político mais popular do Brasil e, ao mesmo tempo, o chefe, o presidente da Câmara dos Deputados. O que mostra que há um aperfeiçoamento da instituição, que o Brasil está virando um Estado de direito.  

    Agora, é natural que haja muita tensão entre os Poderes, e essas tensões acabam também se refletindo no dia a dia da mídia. 

    É o momento do Executivo, então, reacomodar esses Poderes e ir para o confronto? 

    Não, confronto não, porque já foi conversado. 

    Veja como o Legislativo cerceou a sua liberdade de alocação de recursos através do Orçamento. 

    Mas aí é um caso típico da casa onde falta pão e ninguém tem razão. Porque, com um Orçamento de R$ 1,5 trilhão, haver uma disputa por R$ 10 bilhões ou R$ 15 bilhões, é uma impropriedade. É claramente a falta de compreensão, ainda, desse pacto federativo que devolveria à classe política uma responsabilidade que ela tem em qualquer lugar do mundo, que é alocar os recursos públicos em coalizões políticas: o presidente e a aliança de centro-direita, de conservadores e liberais. E eles então manobram os Orçamentos públicos de uma maneira transparente, clara, votando anualmente essas verbas. 

    O que nós temos hoje é o contrário. Nós temos 96% dos recursos carimbados — ou seja, o Brasil é administrado por um software — e os 4% que sobram são disputados ferozmente, um invadindo o espaço do outro. 

    Ministro, mas essa realidade, quando vocês assumiram o governo, já estava colocada. O Orçamento já era engessado. Nessa situação, nessa crise que a gente vê agora entre o Executivo e o Legislativo em torno do Orçamento, a responsabilidade é toda do Congresso? O Congresso que não entendeu? Qual é a culpa do Executivo nessa situação, nesse enrosco que se colocou? 

    Olha, eu diria o seguinte: é um exercício — de novo — legítimo de uma democracia em aperfeiçoamento. É natural que os congressistas queiram… Se você tem 96% do dinheiro carimbado, sobram 4%, eles querem espaço nos Orçamentos. Eles começam a procurar espaço nos Orçamentos. 

    Agora, o que nós estamos tentando mostrar é que o espaço tem ônus e bônus, tem decisões políticas a serem tomadas. Não é deixar um dinheiro carimbado e depois brigar com a maior ferocidade por um resto — que, aliás, nós vamos usar muito bem agora. Esses recursos da disputa vão virar o ‘corona money’, o dinheiro do corona [novo coronavírus]. Em vez de ficar numa disputa política, nós vamos falar… Esses recursos que estão sendo disputados com uma certa ferocidade onde os dois ângulos são respeitáveis.  

    O Legislativo olha e fala o seguinte: ‘Vem cá, nós também fomos eleitos, nós também temos bases parlamentares a satisfazer, numa democracia representativa, temos nossos votos, gostaríamos de entrar no Orçamento e decidir um pouco.’ Já o presidente, do outro lado, diz o seguinte: ‘Isso aqui é o presidencialismo. Eu preciso preservar o meu espaço de atuação.’ Os dois estão certos e a solução, eu estou dizendo, em vez de vocês se desentenderem sobre poucos recursos, vamos nos entender sobre todo o Orçamento? 

    Qual a diferença entre negociação e chantagem? 

    A chantagem é um comportamento indevido.  

    Tem acontecido? 

    Olha, quando sou chamado… Eu não participo diretamente da política. Eu sou chamado justamente para saber exatamente se as contas fecham.  

    Perdão, ministro, eu estou errado? Eu vi o senhor tantas vezes lá no Congresso. O senhor conversa com tantos políticos, o senhor diz que não é parte da política? 

    Mas eu repito sempre a mesma coisa para todo mundo: fazer política normalmente é ‘olha, eu acho isso, eu acho aquilo’. Eu repito sempre a mesma coisa para todo mundo. 

    O senhor já se sentiu chantageado? 

    Não. Eu, não. Pessoalmente, não. Em nenhum momento. 

    O senhor sabe de casos? Porque quando o ministro [do Gabinete de Segurança Institucional] general Augusto Heleno chama os parlamentares de chantagistas, ele está colocando todos nessa denominação. Ele está colocando a relação entre os Poderes nisso. 

    Eu acho que o general se expressou com infelicidade sobre um tema onde, do ponto de vista do conteúdo, ele tinha o seu ângulo defensável. E o ângulo defensável é o seguinte: ‘Olha, nós estamos no presidencialismo, nós gastamos R$ 95 bilhões no ano passado em despesa discricionária, que é um espaço estreito, e eu quero esse ano gastar pelo menos os mesmos 95 [bilhões]. Vocês não podem avançar sobre os nossos recursos.’ 

    Por outro lado, quando o Congresso cria a emenda do relator e tenta avançar nesse espaço, ele também está dizendo o seguinte: ‘Se nós não temos ministérios, se nós não temos cargos nas empresas estatais, como é que nós vamos participar de um jogo político legítimo sem acesso às verbas?’. E a resposta que eu estou dando a esse conflito é dizendo o seguinte: senhores, já falamos do pacto federativo. Os senhores têm um espaço muito maior para se entenderem. Porque no pacto federativo, você está ‘descarimbando’ recursos e atribuindo responsabilidades de alocação orçamentária, o ônus e o bônus. Decidam para onde vai o dinheiro em vez de se criticarem mutuamente. 

    Ministro, mas o pacto federativo ainda precisa ser aprovado. E as perspectivas da economia agora estão abaladas diante do coronavírus. Essa acomodação, acertar essa comunicação — o senhor falou, é preciso acertar essa comunicação com o Congresso — não serão decisivos para esse resultado positivo? E o que ainda precisa ser feito? 

    Serão decisivos. E eu acho que os próximos dois meses vão definir o jogo dos próximos anos. Eu termino dizendo: estou mais otimista do que quando entrei. 

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