Mauricio Pestana: No novo governo, pauta racial deve ser para ontem
Saciar a sede de mudança, justiça, direitos e representatividade reprimida nos últimos anos será o grande desafio do novo presidente
Atendendo a pedidos, encerro esta série de artigos sobre diversidade no processo eleitoral brasileiro de 2022 falando sobre as perspectivas deste tema daqui por diante e,
principalmente. no novo governo que vai se instalar a partir de 2023.
Não é preciso ser nenhum sábio ou especialista expert para prever que no ano que vem haverá avanços significativos na pauta racial em todas as instâncias da vida pública e privada no Brasil, pois, independentemente dos rumos políticos que o país vai tomar, este é um tema que veio para ficar e não vai sair de cena enquanto o Brasil, que é o maior país negro fora da África, não der o mínimo de respostas às gravíssimas e gigantescas desigualdades raciais existentes aqui.
Do ponto de vista político, a chegada não só de Lula, mas de todo um grupo atuante na questão racial e de gênero, com a presença das primeiras deputadas negras e trans no Congresso, e também ao redor do presidente eleito, que sempre o orientou com relação a essas questões, fará enorme diferença nas ações relacionadas à inclusão e diversidade no novo governo.
Isso contrasta e muito com a atual gestão, que nunca deu a mínima à pauta racial nos quatro anos de gestão da máquina pública. Aliás, ao contrário, negou em muitos momentos que havia racismo no Brasil, usando quase sempre como porta-voz dirigentes da Fundação Cultural Palmares.
O governo Lula – não só no seu discurso de posse, mas também em vários momentos de sua campanha – ressaltou a importância, o respeito e o compromisso histórico que sempre teve com esta pauta e principalmente com a dívida que o Brasil tem, não somente com os negros e negras brasileiras, mas também com todo o continente africano.
É certo que será um novo momento, novas perceptivas, mas, acima de tudo, um período de esperanças que se abrem para aqueles que não podem e não querem mais esperar.
A grande questão e embate que se colocará será como responder a tantas expectativas impostas nos dias de hoje com grupos muito mais exigentes, mais independentes, articulados, críticos e também muito mais carentes e sedentos por mudanças estruturais, que acompanharam o presidente no primeiro governo.
Hoje as articulações, reivindicações e pressões por mudanças e inclusão racial não vêm apenas dos grupos negros organizados nos setoriais dos partidos de esquerda, como há 20, 30 anos. Essa pressão vem com força, das redes sociais, da academia, do mundo corporativo e privado, de articulações internacionais, da periferia, do campo e das cidades e, principalmente, de uma juventude que não quer, como a juventude de décadas atrás, algo que só venha para seus filhos e netos – ela quer tudo para si e para hoje. Ou melhor, para ontem.
Saciar esta sede de mudança, justiça, direitos e representatividade reprimida nos últimos anos ou séculos será, sem dúvidas, o grande desafio do novo governo na pauta racial.
*Este texto não representa, necessariamente, a opinião da CNN Brasil