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    MPF aciona Justiça contra Ustra e agentes da ditadura e pede reparação de danos

    Ação quer pagamento de indenização, cancelamento de aposentadorias e “reforma institucional” das Forças Armadas e das polícias com curso sobre preservação da democracia e direitos humanos

    Lucas Mendesda CNN

    Brasília

    O Ministério Público Federal (MPF) em São Paulo acionou a Justiça Federal contra 42 pessoas que tiveram ligação com a ditadura militar brasileira (1964-1985) por supostas relações com atos de tortura, morte e desaparecimento forçado de opositores do regime.

    A lista inclui 26 militares que integraram o DOI-Codi (Destacamento de Operações e Informações – Centro de Operações de Defesa interna), em São Paulo.

    O órgão, que era incorporado à estrutura do Exército, servia de local para prisões e torturas.

    Um dos nomes que figuram na ação é o do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, que chefiou o órgão entre 1970 e 1974. Ele morreu em 2015.

    Também são alvos da ação 16 ex-servidores do Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo, que teriam dissimulado a causa das mortes dos opositores da ditadura.

    O MPF quer que as 42 pessoas listadas sejam condenadas a pagar indenização como reparação por danos morais, e a ressarcir o gasto que o Tesouro teve com indenizações já pagas a familiares de vítimas.

    Os valores, desembolsados pelo governo em 1996 e 1997, é de R$ 2,1 milhões (sem correção monetária).

    No caso dos ex-agentes da ditadura que já morreram, o MPF pede que eventual decisão judicial para reparação financeira deve ser cumprida por seus herdeiros.

    A ação ainda requer que todos sejam condenados a perda de funções e cargos públicos e ao cancelamento de suas aposentadorias.

    Outra solicitação é a declaração de responsabilidade pessoal dos ex-agentes, com o reconhecimento jurídico de que tiveram participação em atos de sequestro, tortura, assassinato, desaparecimento forçado e ocultação das verdadeiras circunstâncias da morte de 19 militantes políticos.

    Segundo o MPF, a lista dos 42 ex-agentes citados na ação corresponde a investigações sobre o DOI-Codi que ainda não haviam se tornado processos judiciais com pedidos na esfera cível.

    Conforme o órgão, DOI-Codi foi responsável por 54 mortes e 6,8 mil prisões até 1977.

    A ação é assinada pela Procuradora da República Ana Leticia Absy e foi protocolada na última sexta-feira (15). O caso está na 6ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo.

    A CNN entrou em contato com a defesa das filhas de Ustra, que disse que se manifestará depois de ler a ação.

    Medidas

    A ação ainda requer medidas contra a União e o Estado de São Paulo, por ações durante a ditadura.

    Um dos pedidos é para que a Justiça declare a omissão na tarefa de investigar e responsabilizar ex-agentes da ditadura.

    Há também pedidos para que os governos federal e paulista efetivem a abertura de arquivos e acervos sobre o período vinculados a órgãos de segurança, inclusive os das Forças Armadas, tornando públicas informações como nomes completos de todas as pessoas presas legal ou ilegalmente, nomes de todas as pessoas torturadas e circunstâncias das mortes.

    Outra solicitação trata de uma “reforma institucional” das Forças Armadas e das polícias de São Paulo, e requer que a Justiça determine a criação de um “módulo educacional” sobre direitos humanos e democracia, a ser cursado, obrigatoriamente, por todos os integrantes de Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Federal, e Polícias Civil e Militar de São Paulo.

    “O curso deverá abordar, como tema central, o papel dos órgãos de defesa e de segurança pública na preservação das instituições democráticas e defesa dos direitos humanos”, diz o pedido.

    Sistema organizado

    De acordo com a procuradora que assina a ação, o caso decorre dos reconhecimentos oficiais do Estado brasileiro de que alguns órgãos de repressão durante a ditadura militar foram “verdadeiros centros de terror e de violação da integridade física e moral de pessoas humanas”.

    Trata-se, assim, em particular, da responsabilidade civil da União, do Estado de São Paulo e de seus agentes que perpetraram graves violações aos direitos humanos na repressão à dissidência política durante a ditadura militar.

    Procuradora Ana Leticia Absy

    Ela argumentou que torturas, mortes e desaparecimentos na época não eram acontecimentos “isolados no âmbito da repressão política”, mas sim a “parte mais violenta e clandestina de um sistema organizado para suprimir a oposição ao regime, mediante ações criminosas cometidas e acobertadas por agentes do Estado”.

    A ação cita dados da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos do governo federal relatando que, de 1970 a 1975, o governo ditatorial adotou, “como prática sistemática, as execuções e desaparecimentos de opositores, sobretudo aqueles tidos como mais ‘perigosos’ ou de maior importância na hierarquia das organizações”.

    Conforme a comissão, nesses cinco anos foram registradas 281 mortes ou desaparecimentos de dissidentes do regime, “o equivalente a 75% do total de mortos e desaparecidos durante toda a ditadura (369)”.

    Na ação, o MPF diz que não cabe para o caso a aplicação da Lei da Anistia, aprovada em 1979, que só tem efeito na esfera penal, e não na cível — como é o caso de ações de indenização por dano moral.

    O MPF também afirmou que as ações cometidas por agentes da repressão ditatorial brasileira são qualificadas como crimes contra a humanidade, e não estão suscetíveis a concessão de anistia ou prescrição.

    “A imprescritibilidade dos atos de violação a direitos humanos foi fixada também em duas condenações ao Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)”, disse o órgão.