Maurício Pestana: A verdadeira fraude eleitoral de 2022
Durante as eleições, maioria dos partidos políticos no Brasil descumpriu as regras criadas, votadas e aprovadas por eles no quesito repasse de verba para candidaturas negras e pardas
“A regra é clara”, já dizia o ex-árbitro de futebol Arnaldo Cezar Coelho! As eleições de 2022 foram e continuam sendo marcadas por um clima de desconfiança implantado já há algum tempo pelo atual governo e acentuado após a diferença apertada na disputa presidencial entre Jair Messias Bolsonaro (PL) e o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Falou-se muito de fraudes nas urnas e pouco da fraude do sistema eleitoral, que continua privilegiando o poder de quem tem mais recursos e conhece com precisão as máquinas eleitorais dos partidos políticos e os interflúvios de burlar qualquer tentativa de mudança na representatividade nas casas legislativas.
Se for levar ao pé da letra da lei, a maioria dos partidos políticos no Brasil agiu de forma fraudulenta durante a campanha eleitoral deste ano, descumprindo as regras criadas, votadas e aprovadas por eles no quesito repasse de verba para candidaturas negras e pardas.
A matemática é simples, e a conta não bate! 50,21% do total dos candidatos receberam apenas 35% dos recursos provenientes do financiamento público do fundo eleitoral e partidário neste ano em que, pela primeira vez, candidaturas negras autodeclaradas ultrapassaram as de brancos.
Levantamento realizado pelo jornal O Globo, mapeando dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), concluiu que somente quatro siglas agiram de acordo com a legislação eleitoral, que determina que negros devem receber o repasse proporcional ao percentual de candidatos inscritos no partido. São elas: PMB, PSOL, PSTU e UP.
Mas por falar em fraudes, Neste ano também houve o “milagre da santa cor”, em que 1.378 candidatos que eram brancos no pleito anterior deixaram de se declarar brancos e se reconheceram como pretos ou pardos, agora que a legislação determina uma “verbinha a mais” para candidaturas negras e pardas.
Entre os que não respeitaram as cotas raciais estão as legendas que elegeram as maiores bancadas na Câmara Federal. No caso do PL, 42,66% dos candidatos eram pretos e pardos, mas esse grupo recebeu apenas 26,99% dos recursos, menos do que determina a lei.
O PT, que tem posição ideológica antagônica ao PL, praticamente empatou com o adversário no quesito repasse de recursos para candidaturas negras, destinando apenas 27% para esse grupo.
No caso de descumprimento das normas, a legislação prevê a suspensão do repasse e determinação de devolução do valor gasto de forma irregular, que pode ser descontado dos cofres do partido nos exercícios seguintes.
Ainda é cedo para se afirmar que as mudanças nos repasses de verbas do fundo eleitoral, com ênfase em candidaturas de pessoas negras, é ou não uma política que irá incluir este grupo historicamente excluído dos processos de decisão e poder no Brasil. Mas uma coisa é certa: quanto mais avanço tivermos, maior terá que ser a vigilância, pois o racismo estrutural permeia todas as instâncias da nossa sociedade, inclusive as das boas intenções.
*Este texto não representa, necessariamente, a opinião da CNN Brasil