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    Lula repete fórmula ao priorizar viagens a países latinos e potências em 100 dias de governo

    Após 100 dias de governo, especialistas analisam as agenda internacionais e a política externa do terceiro mandato do presidente Lula

    Danilo MoliternoLeonardo Rodriguesda CNN

    São Paulo

    O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) priorizou países da América do Sul e potências mundiais em suas viagens nos 100 primeiros dias de governo. Além de ir à Argentina e ao Uruguai, o petista visitou os Estados Unidos e planejou ida à China — que foi adiada por problemas de saúde.

    A política externa se assemelha àquela adotada nos primeiros 100 dias dos outros dois mandatos do presidente (2003 a 2006 e 2007 a 2010) — em que países latinos, Estados Unidos e Europa foram destinos.

    Professor do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP, Amâncio Jorge de Oliveira destaca que nos últimos anos a China ganhou relevância econômica e geopolítica, enquanto a Europa seguiu caminho contrário, o que explicaria a prioridade ao país asiático. Para o especialista, as viagens dentro da América do Sul são “simbólicas”.

    “O encontro local passa a ser mais simbólico do que geopoliticamente ou economicamente muito relevante. É para mostrar que a cooperação regional é a nossa prioridade maior. Os outros países também têm, mas virão na sequência”, aponta.

    Especialistas consultados pela CNN analisam os destinos e a política externa nos primeiros 100 dias de governo.

    Lula 3 entre vizinhos e gigantes

    Desde que assumiu a Presidência, Lula teve compromissos em três países. Primeiro, foi à Argentina, onde encontrou o presidente Alberto Fernández e participou da Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac). Também se reuniu com o presidente de Cuba, Miguel Díaz-Canel.

    Lula e Fernández dão entrevista conjunta em Buenos Aires / 23/01/2023 REUTERS/Agustin Marcarian

    Na sequência, Lula foi ao Uruguai, para agendas com o presidente Luis Lacalle Pou e com o ex-presidente José Mujica.

    A professora de Relações Internacionais da ESPM Denilde Holzhacker também destaca a “prioridade de Lula à América do Sul”. Para a especialista, o governo tenta reverter o “distanciamento do governo Bolsonaro com relação ao continente”.

    O compromisso mais recente do petista foi nos Estados Unidos, onde teve um encontro com o presidente Joe Biden. Planejadas para o final de março, as idas à China e aos Emirados Árabes foram adiadas após Lula ser diagnosticado com uma pneumonia leve.

    Amâncio destaca que ao planejar viagens para EUA e China — que rivalizam nos postos de maiores economias do mundo — o governo faz “barganha diplomática”. “Os dois [EUA e China] são rivais declarados. Lula faz a boa e velha barganha diplomática, jogando com ambos para conseguir vantagens dos dois lados”, disse.

    Em seu primeiro mandato, Lula visitou Equador, Suíça, Alemanha e França em 100 dias; no segundo, Equador, Suíça, Uruguai, Guiana e Estados Unidos. Ambas as idas à Suíça tiveram como objetivo participar do Fórum Econômico Mundial em Davos.

    Retomada e distanciamento

    Se por um lado os especialistas apontam retomada da política externa dos primeiros mandatos de Lula, por outro destacam os esforços do governo para se diferenciar da gestão Bolsonaro.

    Nos primeiros 100 dias de governo, Bolsonaro foi ao Fórum de Davos, na Suíça, mas não passou por nações sul-americanas. Com nove meses no cargo, o ex-presidente viajou aos Estados Unidos.

    Neusa Bojikan, integrante do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) para estudos sobre os EUA, afirma que Lula e Bolsonaro estabelecem relações diferentes com o país norte-americano.

    Segundo a especialista, a relação entre os países tende a ser mais pragmática no Lula 3. “O governo Bolsonaro tinha alinhamento incondicional a Trump, com escassos benefícios para o Brasil”, opina.

    Para Denilde, Lula e Biden tendem ao alinhamento, mas há pontos de divergência entre os líderes. “Há em comum uma agenda internacional de combate à extrema-direita, e também na questão climática. Agora, na questão econômica e migratória, há pontos de distanciamento”, destaca.

    Janja da Silva, Luiz Inácio Lula da Silva e Joe Biden em encontro na Casa Branca, nos Estados Unidos / Ricardo Stuckert/PR

    A política nas agendas internacionais

    Joe Biden, Alberto Fernández e Miguel Díaz-Canel estão — ao menos parcialmente — alinhados a Lula na política. Por sua vez, Lacalle Pou é membro do Partido Nacional, agremiação de centro-direita. Na visita ao Uruguai, o brasileiro declarou que “as relações entre chefes de Estado não têm viés ideológico”.

    Neusa Bojikan cita esse encontro como exemplo do “pragmatismo” da política externa praticada pelo presidente. “O governo brasileiro tenta mostrar aos países do Mercosul que um bloco fragmentado corresponde a mais poder para outros interlocutores”, afirma.

    Denilde Holzhacker aponta aspecto que, na sua opinião, é contraditória na política externa de Lula: “Mesmo que defenda premissas internacionais importantes, como a valorização da democracia, há ligações ideológicas que estão na contramão disso, como a posição em relação à Nicarágua”.

    A especialista se refere a episódio, ainda no início de março, em que o governo federal permaneceu em silêncio durante uma reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU e decidiu não assinar um manifesto de 55 países em repúdio às ações autoritárias e violentas do presidente do país, Daniel Ortega.

    Visitas ao país e prioridade ao clima

    A posse de Lula trouxe mais de 20 chefes de Estado estrangeiros ao país. Desde então, destacam-se as visitas do primeiro-ministro da Alemanha, Olaf Scholz, e do enviado especial dos Estados Unidos para o clima, John Kerry, que marcaram a retomada do financiamento de programas ambientais brasileiros.

    Presidente Lula e chanceler alemão, Olaf Scholz / 30/01/2023 REUTERS/Ueslei Marcelino

    “O objetivo da equipe liderada por Kerry era estabelecer estratégias para serem discutidas no âmbito do G-20. Os outros países querem o Brasil na mesa das negociações climáticas”, afirma Neusa Bojikan.

    Especialistas destacam a política ambiental e a agenda contra as mudanças climáticas como protagonistas das relações exteriores do novo governo. Para eles, o Brasil apresenta vantagens comparativas que podem o permitir ser liderança nestas discussões.