Lula repete Bolsonaro e ignora lista de associação ao indicar Gonet para chefiar a PGR
ANPR, que organiza a lista tríplice desde 2001, pediu para se reunir com o presidente há oito meses, mas não teve sucesso
Duas décadas depois de dar início a uma tradição que se estendeu por mais de 15 anos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) repetiu Jair Bolsonaro (PL) e decidiu indicar o próximo procurador-geral da República sem consultar integrantes do Ministério Público Federal (MPF).
O escolhido por Lula foi o subprocurador-geral Paulo Gustavo Gonet Branco, que contava com o apoio de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) — como Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin — e que não se submeteu à avaliação de seus colegas.
Primeiro caso
Em setembro de 2019, Bolsonaro decidiu ignorar a lista tríplice elaborada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e escolher Augusto Aras, que havia se lançado candidato meses antes. Foi a primeira vez que a lista não foi respeitada.
FHC também não escolheu pela lista
A ANPR organizou pela primeira vez uma lista tríplice com os subprocuradores considerados mais preparados para gerir o MPF em 2001. Os nomes foram apresentados ao então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que decidiu por um nome de fora da lista.
Na segunda consulta feita à carreira, em 2003, Lula escolheu o subprocurador-geral Cláudio Lemos Fonteles.
Tradição
Apesar de não ter previsão constitucional, a lista elaborada pela ANPR baseou a escolha do chefe do MPF pelos presidentes Lula, Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).
A relação é formada por meio da votação dos procuradores. Os três nomes são apresentados ao presidente, que, no entanto, é livre para escolher quem indica ao Senado, responsável pela aprovação.
Apoiadores e críticos
Os defensores da lista tríplice sustentam que a indicação do primeiro colocado privilegia a categoria e assegura a escolha do nome mais preparado para conduzir o MPF entre os subprocuradores.
Em contrapartida, os críticos dela afirmam que escolher um dos nomes que a compõem promove o corporativismo.
Sem o primeiro
Temer foi o primeiro presidente a, em 2017, não escolher o mais votado pelos procuradores. Naquele ano, o mais votado foi o subprocurador-geral Nicolao Dino, irmão do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino – indicado agora por Lula para o Supremo Tribunal Federal. Temer, no entanto, escolheu Raquel Dodge, a segunda mais votada na lista.
Em agosto de 2019, antes de escolher Augusto Aras, Bolsonaro recebeu Gonet no Palácio do Planalto.
O subprocurador foi levado pela deputada Bia Kicis (PL-DF) para conversar com o então presidente. Na ocasião, a parlamentar o definiu como “conservador raiz” e “cristão”. Nas redes sociais, a deputada escreveu que Gonet afirmou a Bolsonaro que “nenhum candidato pode prometer que jamais haverá uma ação que incomode, mas garantiu que jamais usaria do cargo para atrapalhar o governo”.
Lista atual
Em março deste ano, o presidente da ANPR, Ubiratan Cazetta, pediu uma audiência com Lula para defender a lista tríplice elaborada pela entidade como mecanismo de escolha do procurador-geral. A solicitação sequer foi respondida e o encontro nunca aconteceu.
Compõem a lista tríplice deste ano os subprocuradores-gerais Luiza Frischeisen, Mário Bonsaglia e José Adonis Callou de Araújo. Nenhum deles foi recebido pelo presidente Lula desde então.
Os fora da lista
Ao longo do ano, Lula se reuniu apenas com subprocuradores que buscavam se cacifar para o cargo sem terem seus nomes analisados pela categoria.
O presidente conversou pessoalmente com Augusto Aras, que buscava a recondução, Antônio Carlos Bigonha, Paulo Gonet, Aurélio Virgílio Veiga Rios e Luiz Augusto Santos Lima.
Saudação
No início da tarde desta segunda-feira, a ANPR divulgou uma nota saudando Gonet por sua indicação e desejando sucesso nas votações no Senado e no cargo de procurador-geral.
Para a associação, a trajetória intelectual e profissional de Gonet o qualifica para a função “com a independência que o cargo exige e com o olhar na defesa dos valores essenciais da nossa Constituição”.
Ignorada por Lula por oito meses, a ANPR reforçou que continuará lutando pela institucionalização da lista tríplice elaborada por ela.