Gleisi critica mercado e questiona “onde estava essa gente” no governo Bolsonaro
Presidente do PT afirmou que é necessária a aprovação da PEC do Estouro, para que o presidente eleito Luiz Inácio da Silva dê resultados para a população
A presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), Gleisi Hoffmann, indagou, nesta terça-feira (13), onde estava o mercado financeiro durante os gastos do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), em comparação à reação com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Estouro.
“Eu não posso me conformar com o que eu ouço de mercado por aí. Que isso é uma gastança, que é um absurdo. Onde estava essa gente que não criticou o Bolsonaro quando gastou R$ 800 bilhões e não estruturou nenhuma política pública para melhorar a vida das pessoas?”, perguntou Gleisi.
“Eles têm é que perguntar para ele e não para nós. Eles sabem como a gente lida com orçamento público e nós sabemos para quem o Estado tem que servir, para as pessoas”, continuou.
A PEC do Estouro foi aprovada no Senado Federal, na última sexta-feira (7), por 64 votos a 13. Agora, a medida será analisada na Câmara dos Deputados.
Segundo o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), a votação deve ocorrer até a próxima terça-feira (20). O prazo é visto por congressistas aliados à equipe de transição como apertado (mas ainda possível) para viabilizar a aprovação do Orçamento do ano que vem até o fim do ano.
Questionado se o relator da PEC será o líder do União Brasil na Câmara, Elmar Nascimento (BA), Lira se limitou a dizer que a indicação caberá ao União Brasil, sem dizer se será Elmar o relator ou outro nome.
Durante sua fala, Gleisi, que também é deputada federal, pediu ajuda de parlamentares para a conformação. “O presidente [da República eleito, Luiz Inácio Lula da Silva] para entrar no ano que vem já dando resultado para as pessoas, porque é isso que elas estão esperando”, explicou.
Entenda a PEC
A iniciativa foi gestada, articulada e apresentada pelos aliados do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), para que este possa cumprir promessas de campanha e recompor o orçamento de diversas áreas, como o Farmácia Popular e a merenda escolar.
A PEC tem como objetivo principal manter o Auxílio Brasil, que deve voltar a se chamar Bolsa Família, no valor de R$ 600 mensais e instituir no programa um complemento de R$ 150 por criança de até seis anos, a partir do ano que vem.
Atualmente, o orçamento de 2023 enviado pela equipe de Jair Bolsonaro prevê a parcela de R$ 405 mensais, tendo reservado R$ 105 bilhões para o programa no ano que vem.
Na avaliação dos aliados de Lula, além dos R$ 105 bilhões, é preciso mais R$ 70 bilhões para viabilizar os R$ 200 que completam os R$ 600 mensais e acrescentar os R$ 150 a famílias por crianças com até seis anos.
Inicialmente, a equipe de Lula queria R$ 175 bilhões para o Bolsa Família turbinado fora do teto de gastos. O teto de gastos é uma regra fiscal criada no governo de Michel Temer (MDB) que limita o crescimento das despesas públicas.
No entanto, após repercussões negativas no mercado financeiro, negociações e a aprovação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o texto da PEC passou a prever a expansão do teto em R$ 145 bilhões — uma redução de R$ 30 bilhões em comparação com a proposta inicial e uma expansão do teto, não esse valor fora dele.
A ideia é que R$ 70 bilhões dos R$ 145 bilhões sejam usados para bancar as complementações do novo Bolsa Família — lembrando que já há R$ 105 bilhões reservados para o programa ano que vem. Os R$ 75 bilhões restantes ficariam disponíveis para bancar outras ações do futuro governo.
O texto aprovado diz que o presidente da República deverá encaminhar ao Congresso Nacional, até 31 de agosto de 2023, um projeto de lei complementar “com objetivo de instituir regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do país e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico”. Na prática, a intenção é discutir a criação de uma nova âncora fiscal para o país.
Um ponto do texto afirma que os atos editados em 2023 relativos ao Auxílio Brasil ou programas que o sucederem e ao auxílio gás ficam dispensados de observarem limitações legais “quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental, inclusive quanto à necessidade de compensação”. Isso não se aplica a atos cujos efeitos financeiros tenham início a partir do exercício de 2024.
A PEC estabelece que o governo pode usar até R$ 23 bilhões de recursos em caso de excesso de arrecadação — ou seja, se o governo arrecadar mais do que o previsto em determinadas áreas. Esses recursos não serão contabilizados no teto de gastos públicos.
Parcela desse dinheiro neste ano deve liberar uma parte de emendas de relator, também conhecidas como orçamento secreto, pela suposta falta de transparência na indicação e destinação dos recursos. O dinheiro das emendas de relator costuma ser utilizado por deputados e senadores para promover obras, compras e outras ações em suas bases eleitorais.
A PEC prevê que, para o exercício financeiro de 2023, os recursos acrescentados ao teto de gastos poderão ser destinados ao atendimento de solicitações da equipe de transição de Lula e das comissões permanentes do Congresso Nacional ou de suas Casas.
Pelo texto, ainda poderão ficar de fora do teto de gastos a partir de 2023:
- Despesas custeadas com recursos de operações financeiras com organismos multilaterais dos quais o Brasil faça parte, destinados a financiar ou garantir projetos de investimento em infraestrutura, constantes de plano integrado de transportes e considerados prioritários por órgão colegiado do setor;
- Despesas com projetos socioambientais ou relativos às mudanças climáticas custeadas por recursos de doações, bem como despesas com projetos custeados com recursos decorrentes de acordos judiciais ou extrajudiciais firmados em função de desastres ambientais;
- Despesas das instituições federais de ensino e das Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICTs) custeadas por receitas próprias, de doações ou de convênios, contratos ou outras fontes, celebrados com demais entes da Federação ou entidades privadas;
- Despesas custeadas por recursos oriundos de transferências dos demais entes da Federação para a União destinados à execução direta de obras e serviços de engenharia.
No parecer de plenário, o relator Alexandre Silveira, fez duas modificações em relação ao seu próprio texto aprovado nesta terça na CCJ. Ele tirou do teto as despesas custeadas por receitas próprias, de doações ou de convênios, contratos ou outras fontes de instituições federais de ensino e das Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICTs). Antes, o texto previa que seriam beneficiadas somente as instituições federais de ensino e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Outra alteração foi incluir que as transferências financeiras realizadas pelo Fundo Nacional de Saúde e pelo Fundo Nacional de Assistência Social diretamente aos fundos de saúde e assistência social estaduais, municipais e distritais, para enfrentamento da pandemia de covid-19, poderão ser executadas pelos entes federativos até 31 de dezembro de 2023. A ideia é dar mais prazo para o uso dos recursos.
No relatório de plenário, Silveira rejeitou a emenda apresentada pelo Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que buscava reduzir valor e prazo da extensão do teto de gastos. A sugestão de mudança de Oriovisto foi novamente rejeitada depois pela maioria do plenário.
Outro trecho da PEC autoriza o governo a usar recursos não reclamados por mais de 20 anos em contas do PIS/Pasep. Contas nessa situação serão encerradas após o prazo de 60 dias da publicação de aviso no Diário Oficial da União, “ressalvada reivindicação por eventual interessado legítimo dentro do referido prazo”.
Esses valores serão tidos como “abandonados” e serão apropriados pelo Tesouro Nacional para investimentos, fora do teto de gastos. Poderá o “interessado reclamar ressarcimento à União no prazo de até cinco anos do encerramento das contas”.
A PEC ainda prorroga até 31 de dezembro de 2024 legislação existente que determina a desvinculação de órgão, fundo ou despesa, nesse prazo, de 30% da arrecadação da União relativa às contribuições sociais, sem prejuízo do pagamento das despesas do Regime Geral da Previdência Social, às contribuições de intervenção no domínio econômico e às taxas, já instituídas ou que vierem a ser criadas até a referida data. Isso ajuda o governo federal é usar parte desses recursos para pagar as contas. O prazo anterior era até 31 de dezembro de 2023.