Foto mostra Cid acompanhando reunião de Heleno, Bolsonaro e Forças Armadas
Na CPMI do 8 de janeiro, após dizer que ex-ajudante de ordens não participava de reuniões com comandantes, ex-ministro do GSI afirmou que ele "escuta, mas não participa"
Durante a sessão da CPMI do 8 de janeiro desta terça-feira (26), o deputado federal Rogério Correia (PT-MG) e o ex-ministro do GSI general Augusto Heleno entraram em um bate-boca sobre a participação do ex-ajudante de ordens tenente-coronel Mauro Cid em reuniões do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) com as Forças Armadas.
No início da sessão, quando era questionado pela relatora senadora Eliziane Gama (PSD-MA), Heleno disse que Cid não participava de reuniões com os comandantes das Forças Armadas.
Na última quinta-feira (21), foi reportado que o tenente-coronel afirmou à Polícia Federal (PF), em delação premiada, que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) discutiu um plano de golpe de Estado para não deixar o poder, em novembro do ano passado, com os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica.
Veja: Augusto Heleno à CPMI: Participação de Cid em reuniões é “fantasia”
Questionado sobre a reunião delatada, Heleno negou que tivesse conhecimento.
“E quero esclarecer que o tenente-coronel Mauro Cid não participava de reuniões. Ele era ajudante de ordens do presidente da República. Não existe essa figura do ajudante de ordens sentar em uma reunião dos comandantes de Força e participar da reunião, isso é fantasia”, continuou o general aos parlamentares.
“Estão apresentando trechos dessa delação e me estranha muito porque a delação está ainda sigilosa. Ninguém sabe o que o Cid falou”, completou.
O bate-boca com o deputado Rogério Correia começou cerca de uma hora e meia após essas primeiras declarações, quando o petista exibiu uma foto que mostra Heleno e Mauro Cid durante uma reunião de Bolsonaro com os comandantes das Forças Armadas, em fevereiro de 2019.
“Ele está ouvindo e está lá atrás do senhor. Ouvindo tudo. Mauro Cid ouvia tudo, está bem claro. Mauro Cid é sim um delator importante na delação premiada. Não adianta tentar tirar a imagem como se ele não participasse das reuniões e não soubesse o que está acontecendo”, declarou Correia.
A foto, disponível no Flickr oficial do Palácio do Planalto, conta com a legenda oficial detalhando as autoridades presentes: “Presidente da República, Jair Bolsonaro durante encontro com Fernando Azevedo, Ministro de Estado da Defesa; Almirante de Esquadra Ilques Barbosa Júnior, Comandante da Marinha do Brasil; General de Exército Edson Leal Pujol, Comandante do Exército Brasileiro; Tenente-Brigadeiro do Ar Antonio Carlos Moretti Bermudez, Comandante da Aeronáutica; Almirante Esq Cláudio Portugal de Viveiros, Chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, Interino, e Alte Esq Almir Garnier Santos, Secretário-Geral do Ministério da Defesa.”
O ex-ministro do GSI rebateu o deputado dizendo que ele estava “faltando com a verdade”.
“A imagem fala por mil palavras, olha a posição [de Cid]”, disse Heleno. Questionado se achava que o ex-ajudante de ordens escutava o que era discutido entre o presidente e os comandantes, ele completou: “Ele não é surdo, lógico que ele está escutando. Mas ele não participa. Ele não tem atuação nenhuma.”
Em seguida, respondendo ao deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), o general voltou a comentar a foto: “Nesta foto, Cid estava atrás esperando alguma necessidade de Bolsonaro. Ele não dá palpite, isso não existe. Então o que eu estou dizendo é perfeitamente lógico e viável. As pessoas aqui estão querendo me comprometer, não vão conseguir.”
“Essa imagem é de 2019. O almirante Garnier nem pensava em ser almirante da Marinha. Aquele rapazinho sentado ao lado do Cid, não tenho nem ideia de quem é. Só faltava dizer que ele estava participando. É preciso ter um pouco de senso para não haver acusações sérias. É preciso que as acusações sejam um pouco refutadas”, completou.
Na data da foto, Garnier era secretário-geral do Ministério da Defesa, não comandante da Marinha. Ele assumiu o posto, em abril de 2021, no lugar de Ilques Barbosa Júnior, demitido em março daquele ano após uma troca no comando do Ministério da Defesa, que passou às mãos do general Walter Braga Netto.
Em sua delação premiada à PF, Cid relatou que, na reunião com o ex-presidente Jair Bolsonaro após as eleições do ano passado, Garnier demonstrou disposição em participar de um golpe de Estado.
O presidente da CPMI do 8 de janeiro, deputado Arthur Maia (União-BA), também tomou a palavra para responder à solicitação feita à mesa da Comissão para que fossem tomadas providências sobre a acusação de que o general estaria faltando com a verdade.
“Nós temos aqui uma circunstância e que eu compreendi que o general disse participava da reunião’ no sentido que sentava na mesa e tomava decisões. Veja só os assessores que estão aqui nos acompanhando. Eles estão participando da reunião e ao mesmo tempo não estão participando na mesma condição que nós deputados”, disse Maia.
“Está visível que o senhor Mauro Cid não estava sentado na mesa nas mesmas condições que o presidente da República e seus ministros. Por isso, a mesa não entende que seja uma não verdade”, completou.
A delação de Mauro Cid
O tenente-coronel Mauro Cid disse à Polícia Federal que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se reuniu com a cúpula do Exército, da Marinha e da Aeronáutica para discutir detalhes de um plano de golpe para não deixar o poder. O encontro teria ocorrido quando Bolsonaro ainda estava na Presidência, após as eleições do ano passado.
A informação confirmada pela CNN foi revelada primeiramente por O Globo e UOL.
Segundo fontes com acesso à investigação, Cid detalhou duas situações. Em uma delas, cita que Bolsonaro recebeu em mãos uma minuta golpista. Em outro momento, o ex-ajudante de ordens detalha a reunião com a cúpula militar.
No encontro, as Forças Armadas teriam sido consultadas sobre a possibilidade de uma intervenção militar.
A resposta da cúpula da Marinha, ainda segundo Mauro Cid, teria sido que as tropas estavam prontas para agir, apenas aguardando uma ordem do então presidente. Já o comando do Exército não teria aceitado o plano.
Esse depoimento sobre plano golpista e minuta do golpe é um dos pontos analisados na delação premiada fechada por Mauro Cid com a Polícia Federal.
O que disseram as defesas?
Em nota, a defesa de Mauro Cid cita as matérias da imprensa sobre “possíveis reuniões com a cúpula militar para avaliar golpe no país” e afirma que “não tem os referidos depoimentos, que são sigilosos, e por essa mesma razão não confirma seu conteúdo”.
Os advogados de defesa de Jair Bolsonaro (PL) emitiram um comunicado alegando que o ex-presidente “jamais compactuou” com qualquer movimento ilegal. Eles afirmam que o ex-presidente “durante todo o seu governo jamais compactuou com qualquer movimento ou projeto que não tivesse respaldo em lei, ou seja, sempre jogou dentro das quatro linhas da Constituição Federal”.
A defesa ainda alega que Bolsonaro “jamais tomou qualquer atitude que afrontasse os limites e garantias estabelecidas pela Constituição e, via de efeito, o Estado Democrático de Direito”.
Por fim, os advogados afirmaram que vão adotar “medidas judiciais cabíveis contra toda e qualquer manifestação caluniosa, que porventura extrapolem o conteúdo de uma colaboração que corre em segredo de Justiça, e que a defesa sequer ainda teve acesso”.
A Marinha do Brasil divulgou uma nota à imprensa esclarecendo que “não teve acesso ao conteúdo de delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid” e “não se manifesta sobre processos investigatórios em curso no âmbito do Poder Judiciário”.
No comunicado, a Marinha ainda reafirma que “pauta sua conduta pela fiel observância da legislação, valores éticos e transparência”. E reitera que “eventuais atos e opiniões individuais não representam o posicionamento oficial da Força e que permanece à disposição da justiça para contribuir integralmente com as investigações”.
O Exército do Brasil, afirmou em nota, através de seu Centro de Comunicação Social, que “que as informações prestadas pelo TC Cid fazem parte de processos investigatórios, os quais estão sendo conduzidos pelos Órgãos competentes pelas apurações”.
“Em consequência, a Força não se manifesta sobre processos apuratórios em curso, pois esse é o procedimento que tem pautado a relação de respeito do Exército Brasileiro com as demais Instituições da República. O Exército vem acompanhando as diligências realizadas por determinação da Justiça e colaborando com todas as investigações”, acrescentou o comunicado.
“Por fim, cabe destacar que a Força pauta sua atuação pelo respeito à legalidade, lisura e transparência na apuração de todos os fatos que envolvam seus militares”, concluiu o Exército.
A CNN também entrou em contato com a Aeronáutica, mas não teve retorno.