Ex-chefe da Receita diz que atuou para liberar joias por acreditar que elas ficariam no acervo público
Caixa ficou retida no local desde que foi apreendida dentro da mala de um assessor do então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, em 2021
O ex-chefe da Receita Federal Júlio Cesar Vieira Gomes disse em depoimento à Polícia Federal na última semana ter pedido a incorporação do estojo de joias apreendido no aeroporto de Guarulhos por acreditar que os objetos já pertenciam à União e ficaram no acervo da Presidência da República.
A caixa de joias ficou retida no local desde que foi apreendida dentro da mala de um assessor do então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, em 2021.
Segundo Vieira Gomes, quando passou a atuar no caso já em dezembro de 2022, “àquela altura, eles eram bens públicos, adquiridos pela União por meio de perdimento (apreensão) e, obrigatoriamente, manteriam essa condição pública, se a incorporação acontecesse”.
À CNN, o ex-secretário disse ainda que o intuito era que a incorporação fosse feita junto à Presidência e que não resultaria na transferência dos bens a qualquer particular, ou seja, ao ex-presidente da República Jair Bolsonaro (PL).
“Juridicamente, era impossível que os bens passassem ao domínio privado do ex-presidente Bolsonaro. Portanto, por impossibilidade jurídica, do ponto de vista técnico, não subsiste qualquer possibilidade de se considerar que, por incorporação, pudessem ser transferidos a propriedade particular ou que se atendesse a algum interesse privado, de quem quer que fosse”, afirmou.
Como a CNN antecipou, Júlio Cesar prestou depoimento no dia 5 de abril, em Brasília, no mesmo dia que Bolsonaro. A declaração foi a mais longa entre os depoimentos e durou cerca de cinco horas.
Na ocasião, assim como disse à Comissão de Ética Pública da Presidência da República, o ex-secretário da Receita negou que tenha pressionado servidores para liberar as joias dadas pela Arábia Saudita e retidas na receita em SP.
“Esclareci que, no instante em que a equipe técnica identificou uma falha jurídica no ofício, o procedimento foi paralisado e encerrado: ou seja, a legalidade foi, sempre, observada”, disse ainda o ex-secretário para a reportagem.
Em dezembro passado, dias antes de Bolsonaro deixar a Presidência, o gabinete pessoal do então presidente pediu à Receita Federal a liberação do conjunto avaliado em quase R$ 17 milhões. O ofício foi assinado por Mauro Cid, ajudante de ordens do ex-presidente.
Em um e-mail enviado pouco tempo depois, Júlio Cesar Vieira se posicionou pelo atendimento do pedido e solicitou o encaminhamento da demanda à equipe da alfândega de Guarulhos. Mesmo assim, o conjunto não foi liberado.
O então secretário da Receita Federal, que assumiu esse cargo em dezembro de 2021 e nos bastidores é considerado próximo do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), tentou garantir a incorporação final dos bens apreendidos e passar para Brasília o assunto. O que é até permitido ao chefe máximo da autarquia em Brasília, mas não usual.