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    Esperança do Brasil em receber R$ 3 bilhões de Cuba esbarra em falta de dinheiro e histórico de calote

    Cubanos já possuem históricos de dívidas com Argentina e Venezuela

    Lourival Sant'Annada CNN , São Paulo

    O governo brasileiro nutre esperanças de reaver os US$ 600 milhões (cerca de R$ 3 bilhões, na cotação atual) que emprestou a Cuba durante as gestões passadas do PT para a construção do Porto de Mariel, em Havana.

    Fontes ouvidas pela CNN garantem que isso não vai acontecer: Cuba não tem dinheiro nem tradição de pagar empréstimos.

    Antes de financiar as obras, no segundo mandato de Lula (PT) e no primeiro de Dilma Rousseff (PT), os brasileiros poderiam ter perguntado aos argentinos.

    Histórico de calotes

    Cuba contraiu, em 1974, dívidas com a Argentina para comprar milhares de tratores, caminhões e automóveis. Até hoje não pagou. O montante da época, de US$ 1,3 bilhão (cerca de R$ 6,5 bilhões), hoje equivale a US$ 15 bilhões (cerca de R$ 75 bilhões).

    A Venezuela, outro país hoje quebrado, emprestou valores desconhecidos para Cuba. “No caso do Brasil, se manteve uma certa institucionalidade, um registro da dívida”, observa o jornalista cubano independente Bóris González Arenas, de Havana.

    “No caso da Venezuela, não se tem a menor ideia do montante de dinheiro transferido. Os dois países, Argentina e Venezuela, vivem hoje na total miséria.”

    Segundo González, pessoas que trabalharam no porto lhe relataram que “havia muito sobrepreço na obra”, executada por empreiteiras brasileiras
    envolvidas no escândalo da Lava Jato.

    “Cuba não tem dinheiro”, afirma o jornalista. “O governo brasileiro não pode ter a expectativa de receber dinheiro.”

    Sem pagar após acordo

    Cuba não tem pagado nos últimos dois anos por exemplo aos credores do Clube de Paris, mesmo depois de ter feito um acordo altamente favorável, em que foram perdoados os juros. González especula que “pode ser que Cuba pague alguma coisa em serviços ou benefícios, para evitar que a dívida cresça”.

    González acrescenta: “Fidel reproduziu na esfera internacional o que alguns dos seus amigos afirmam que ele fazia nas relações pessoais. Pedia dinheiro e não devolvia. E depois caluniava os que reclamavam”.

    Durante a entrevista, o jornalista dissidente contou que, por causa da cúpula do G77+China em Havana, “uma série de defensores dos direitos humanos da ilha está com aceso à internet bloqueado, e em geral toda a população tem velocidade ainda mais baixa que a habitual”.

    “O déficit fiscal permanece em 11% do PIB, o que mostra que o governo não tem receitas suficientes para fazer face às suas despesas, razão pela qual não paga a dívida externa e emite dinheiro para financiá-la”, analisa o economista cubano Pavel Vidal Alejandro, que trabalhou na Divisão de Política Monetária do Banco Central de Cuba.

    “Histórico terrível”

    Isso mantém a inflação alta: 42%. “O Estado cubano nunca poderá ser completamente solvente enquanto continuar a preservar e subsidiar o monopólio de um setor
    empresarial estatal ineficiente”, continua Vidal, hoje professor da Pontifícia Universidade Javeriana em Cali, na Colômbia. “As reformas estruturais fundamentais são tão essenciais quanto o ajuste fiscal para que Cuba possa restabelecer o cumprimento dos seus compromissos financeiros internacionais, incluindo o pagamento do crédito do Brasil para o Porto de Mariel.”

    “Cuba tem um histórico terrível no pagamento das suas dívidas, mesmo aos seus aliados ideológicos, e tem muito pouca capacidade de pagar, dada a sua profunda crise econômica”, atesta Ted Henken, professor do Baruch College, em Nova York, que costumava ser consultado pelo governo de Barack Obama sobre Cuba. “Se Cuba pagar, será sobretudo simbólico e apenas após uma renegociação da própria dívida.”

    Will Freeman, pesquisador de América Latina do Council on Foreign Relations, também em Nova York, tem estudado as finanças da ilha. “Considerando a situação financeira de Cuba, o reembolso parece improvável”, advertiu. “Cuba está na maior crise econômica em uma geração, semelhante ao ‘Período Especial’ que se seguiu ao colapso do seu antigo patrocinador, a União Soviética.”

    Nessa época, nos anos 1990, os cubanos emagreceram, conta quem viveu esse período na ilha.

    O turismo em Cuba, importante fonte de moeda forte, não se recuperou depois da pandemia. “Sem os dólares do turismo, com a indústria açucareira em queda livre e com poucas alternativas econômicas no horizonte, mesmo serviços como hospitais e educação estão ficando sem recursos básicos”, analisa Freeman. “O reembolso das dívidas externas provavelmente não está no topo da agenda.”

    A CNN tentou ouvir o governo cubano, mas até o momento não obteve resposta.

    VÍDEO – Cuba: Economia em crise leva população às ruas

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