Entrevistas à CNN: as visões de Lula, Bolsonaro, Moraes e outras autoridades sobre o 8/1
Ataque às sedes dos Três Poderes aconteceu há um ano; acompanhe relatos inéditos sobre a ocasião
Há exatamente um ano, o país parou para acompanhar, incrédulo, o ataque às sedes dos Três Poderes.
As cenas de vandalismo nos prédios do Congresso Nacional, do Supremo Tribunal Federal e no Palácio do Planalto provocaram muito mais do que a destruição do patrimônio público. Causaram uma fratura na democracia brasileira, que exigiu uma resposta imediata e enfática das instituições.
Para entender esse complexo ambiente político que desencadeou nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, a CNN entrevistou as principais personalidades políticas do país, que revelaram os bastidores e relatos inéditos do dia que entrou para história do Brasil.
- Luiz Inácio Lula da Silva (PT), presidente da República
“Eu não imaginava que a ignorância tivesse chegado a tal ponto, sabe, de um presidente sem controle emocional, desmoralizado pela quantidade de mentiras contadas durante toda a campanha, tivesse inventado uma coisa daquela”, disse. “E o que é vergonhoso é que inventou e fugiu. Não teve coragem de participar”.
“Eu perdi três eleições seguidas. Ou seja, quando a gente perdia, a gente voltava pra casa e ia chorar as mágoas”.
Fiquei vendo a invasão, fiquei vendo as manifestações. Liguei para algumas pessoas aqui. Liguei para o Flávio Dino (ministro da Justiça). Outras pessoas me ligaram. E foi um momento de tensão. Ou seja, era uma coisa, eu diria… que eu não imaginei que poderia acontecer no Brasil novamente
Luiz Inácio Lula da Silva
- Jair Bolsonaro (PL), ex-presidente da República
“Para haver a tentativa [de golpe], tinha que ter uma pessoa à frente. Tudo que foi apurado não levantou nome algum. São suposições. Quem vai dar golpe com velhinhos, com pessoas idosas com bíblia debaixo do braço, com a bandeira na outra mão, com pessoas do povo, com vendedor de algodão doce, com motorista de Uber, com menor de idade, com criança?”
“Hoje em dia estamos em uma insegurança muito grande. (…) Qualquer pessoa no Brasil hoje em dia pode ser presa.(…) “Esse clima não é bom para o Brasil. E a gente espera que haja uma devida moderação, por parte em especial do Poder Executivo e do Poder Judiciário, que baixe a temperatura e voltemos à normalidade”.
Eu jamais passaria a faixa a esse cidadão Lula, essa pessoa de triste memória para todos nós. Autor, coautor, responsável por atos de corrupção, os mais bárbaros possíveis aqui no Brasil, onde ele entregou o poder a grupos de políticos e outros em troca de apoio no parlamento e assistimos, por exemplo, à questão do mensalão, do petrolão
Jair Bolsonaro
- Rodrigo Pacheco (PSD), presidente do Senado
“[Bolsonaro poderia ter] participado da posse, entregar a faixa presidencial, reconhecendo que perdeu naquele momento, mas que há um futuro pela frente da política em que a direita —não a extrema —, mas que a direita pode ser construída e ter bons propósitos para o Brasil”.
“O presidente Bolsonaro, nesse sentido, poderia ter evitado esse mal maior que foi o 8 de janeiro. Embora, repito, eu não queira ser leviano e responsabilizá-lo juridicamente por esses atos. Inclusive, isso cabe à Justiça Eleitoral”.
No final das contas, o que nós temos no 8 de janeiro é uma expressão de insatisfação que foi às raias da criminalidade e da violação de bem jurídicos, e da multiplicidade de crimes de pessoas que se permitiram a pretexto de um falso patriotismo, um pseudopatriotismo, defender o país, entre aspas, mediante de uma forma absolutamente errônea, equivocada e criminosa
Rodrigo Pacheco
- Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal
“Houve uma imensa falha no serviço de inteligência, tanto da polícia quanto dos militares. Ou, se não foi falha no serviço de inteligência, foi cumplicidade. O que seria pior ainda. Então, houve falha no serviço de inteligência e houve falha das forças de segurança. (…) Ali houve uma mistura de omissão, incompetência e cumplicidade”, disse.
Nós vivemos um período em que lideranças importantes do país atacavam regularmente as instituições e procuravam abalar a sua credibilidade. E ofendiam pessoalmente os seus integrantes. Então acho que isso foi uma parte do processo. A outra parte do processo foi a difusão do ódio. E aí as plataformas digitais, as redes sociais, tiveram um papel misto de campanhas de desinformação com discursos de ódio e frequentemente com mentiras para tirar a credibilidade das pessoas
Rodrigo Pacheco
- Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal
“As investigações mostraram —e várias testemunhas e réus disseram isso— que nos acampamentos, inclusive no quartel de Brasília, aconteceram palestras [para os acampados], em que se dizia que eles deveriam invadir os prédios [dos Três Poderes] e ficar, principalmente no Congresso Nacional, até que fosse convocada uma GLO [Garantia da Lei e da Ordem] e o Exército chegasse. A partir daí, o movimento seria o de fazer com que as Forças Armadas aderissem àquele golpe”.
Justiça seja feita: em nenhum momento as Forças Armadas, enquanto instituição, flertaram com essa possibilidade
Alexandre de Moraes
- Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal
“Houve uma leitura dos militares de que eles ganharam a eleição com Bolsonaro, e eles voltaram ao poder, portanto com Bolsonaro, e podiam ter uma licença maior de ação, inclusive de ação política”.
Essa gente deveria ser inelegível. Quem quer ir para a política deveria ter uma distância no tempo, uma quarentena, para depois fazer política, seja militar, policial militar, policial civil, e não se aproveitar de um hipotético proscênio momentâneo de ‘prendeu alguém’ para se tornar político e depois voltar para as Forças
Gilmar Mendes
“É notório que, por suas chefias, as Forças Armadas não participaram desse convescote ou dessa tentativa de golpe, de conspirata. Seja lá como vamos chamar isso no futuro”, declarou. “Mas há pessoas bastante bem situadas na estrutura hierárquica que participaram ou foram condescendentes com isso”.
- José Múcio, ministro da Defesa
“As instituições estavam absolutamente ao lado da democracia. Exército, Aeronáutica e Marinha estavam absolutamente a favor da Constituição. Evidentemente que você tinha (indisciplinados). Como num clube de futebol, tem um jogador indisciplinado no jogo, você tira o indisciplinado, mas o time continua.”
A Justiça poderia ter dito ‘tire’, mas não disse. Havia uma certa conivência, nós percebemos. E talvez não mexer permitiu que chegássemos a isso
José Múcio
“Não podíamos tomar a iniciativa (de tirar), porque íamos mexer com muita gente que nós não podíamos mexer. Eu tinha consciência que aquilo era uma coisa muito delicada para a gente tomar uma providência que não tivesse muita responsabilidade e tivesse muito bem respaldada”.
- Flávio Dino, futuro ministro do Supremo Tribunal Federal
“O legado principal do dia 8 de janeiro é a revelação clara e inequívoca de que havia um engendramento de uma tentativa de ruptura da ordem democrática, da constituição e, portanto, a prática de crimes e que eram encadeados em uma terrível sequência lógica que começou exatamente na recusa do reconhecimento do resultado da eleição no segundo turno”.
“Então, desde o dia 30 de outubro até o dia 8 de janeiro, há um fio condutor, há uma linha de continuidade que era essa insurgência contra o resultado soberano das urnas. E isto, claro, é algo reprovável hoje e para sempre”.
Nós precisamos manter a catequese democrática, acreditar nas nossas conquistas. 2026 tem eleição de novo e vencerá aquele que o povo decidir e assim que o Brasil deve continuar porque esse é o verdadeiro caminho do progresso social
Flávio Dino
- Jorge Messias, advogado-geral da União
“Estou seguro de que a Suprema Corte cumprirá seu papel e, com temperança e firmeza, aplicará a lei, responsabilizando os que cometeram os atos de barbárie contra a democracia”.
“A AGU prosseguirá firmemente em seu trabalho na busca da plena reparação dos danos materiais e morais causados à União, como no caso da destruição das sedes dos Poderes da República”.
Espero mesmo que a condenação dos criminosos sirva como exemplo, demonstrando que a sociedade não tolera mais o extremismo e que a vontade da urnas deve ser sempre respeitada
Jorge Messias
- Ricardo Cappelli, secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública
“Os fatos acabaram demonstrando que foi correto ter feito [as prisões] no dia seguinte. Porque, se nós tivéssemos feito naquela noite, existia um risco de enfrentamento. No dia seguinte, pela manhã, desmontamos o acampamento com o apoio do Exército”.
Encontrei uma tropa atordoada e sem comando. Tivemos no dia 8 um ataque às instituições democráticas e 44 PMs feridos. Houve uma sucessão de erros. Fica claro que houve uma falha no comando. Se foi intencional ou não, tem um inquérito para chegar a essa resposta
Ricardo Cappelli
“Houve falha no GSI, sim. Ninguém entra na Presidência, da forma que entrou, se não tivesse ocorrido uma falha. Agora é importante registrar que o G. Dias estava no GSI há apenas 5 dias úteis. A equipe que estava lá no dia oito ainda era majoritariamente a equipe que tinha sido montada pelo general Heleno [ministro do GSI no governo de Jair Bolsonaro]”.
- Andrei Rodrigues, diretor-geral da Polícia Federal
“Em nenhum momento você poderia deixar esses criminosos se reunirem. E mais ainda: em frente a unidades militares, onde se deveria ter no dia 8 de janeiro uma operação robusta”.(…) “Nós fizemos de maneira inédita mais de 30 prisões durante esse processo de campanha eleitoral, e no período entre a eleição e a posse. Coisa que jamais havia acontecido no país. Houve questionamentos do processo eleitoral, da integridade do Poder Judiciário, enfim do sistema de votação”.
Eu dizia: eles não são manifestantes, eles são criminosos. Eles estão é pregando um golpe de Estado, eles estão pregando tomada de poder. Havia várias chamados que eram esse: ‘vamos tomar o poder’. E isso é crime no nosso país
Andrei Rodrigues
“O Exército Brasileiro tem centenas de milhares de profissionais e o que se viu de fato foi uma não adesão a essa transloucada tentativa. Mas enfim, pontualmente alguns personagens ali atuando, infelizmente integrantes de uma instituição respeitável e que merece toda a nossa consideração. É preciso fazer essa separação. Nós vamos ser rigorosíssimos com o soldado, com o general, com o médico, com o policial”.