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    Em 2018, Rosa Weber defendeu que perdão não afasta outros efeitos, como inelegibilidade

    Manifestação se deu no julgamento sobre indulto natalino decretado pelo ex-presidente Michel Temer (MDB)

    Gabriel Hirabahasida CNN , em Brasília

    A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber, escolhida como relatora das ações apresentadas à Corte contra o perdão concedido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), defendeu, em um julgamento em 2018, que um indulto presidencial não afastaria os “efeitos civis e administrativos da condenação”.

    Rosa Weber argumentou que o campo de eficácia do indulto “fica restrito à punibilidade”.

    “O indulto não afasta os efeitos civis e administrativos da condenação, de modo que seu campo de eficácia fica restrito à punibilidade. Como afirma Pontes de Miranda, o indultado é um delinquente perdoado, mas continua sendo delinquente para todos os outros efeitos da condenação”, disse a ministra.

    Isso significa que, no entendimento da ministra no julgamento de 2018, um indulto presidencial aplicaria um perdão à pena, mas não atingiria outros efeitos, como a imposição de inelegibilidade ao condenado, por exemplo.

    Fontes ouvidas pela CNN dizem que o posicionamento da ministra em 2018 indica um caminho de como ela pensa sobre o assunto, apesar de não significar a aplicação no caso de Daniel Silveira, já que o indulto coletivo (que estava em julgamento em 2018) se diferencia da graça constitucional (que foi concedida ao deputado bolsonarista neste ano).

    Uma das diferenças é que o indulto está contido expressamente como uma das prerrogativas do presidente da República no artigo 84 da Constituição Federal de 1988. A graça não está nesse rol, mas consta no Código de Processo Penal (datado de 1940).

    Além disso, o indulto diz respeito a um perdão coletivo. Réus que se enquadrem nos requisitos definidos no indulto presidencial devem acionar a Justiça para que sejam beneficiados pelo ato do presidente. Já a graça constitucional diz respeito a um perdão individual e direcionado a uma pessoa específica.

    Um dos pontos citados no decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro em benefício de Daniel Silveira é justamente a aplicação do indulto não só às penas privativas de liberdade, mas também a outras punições.

    “A graça inclui as penas privativas de liberdade, a multa, ainda que haja inadimplência ou inscrição de débitos na Dívida Ativa da União, e as penas restritivas de direitos”, diz o decreto, publicado em edição extra do Diário Oficial da União na quinta-feira (21).

    A manifestação da ministra Rosa Weber citada se deu no julgamento de ação apresentada pela Procuradoria Geral da República contra o indulto natalino decretado pelo ex-presidente Michel Temer (MDB) em 2017.

    À época, a PGR pediu que o Supremo suspendesse partes do decreto do emedebista, alegando que o ato deixou mais brandas as regras para o perdão da pena de condenados por crimes cometidos sem violência ou ameaça, como corrupção e lavagem de dinheiro.

    A então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, disse que o ato de Temer causaria a impunidade de crimes graves, como os apurados no âmbito da Operação Lava Jato e de outras operações de combate à corrupção sistêmica no país.

    Para Dodge, o presidente da República não tem “poder ilimitado” para conceder indulto, já que isso “aniquilaria as condenações criminais, subordinaria o Poder Judiciário, restabeleceria o arbítrio e extinguiria os mais basilares princípios que constituem a República Constitucional Brasileira”.

    Amigos do rei

    Em seu voto em 2018, cuja leitura durou cerca de 38 minutos, a ministra Rosa Weber também criticou o que chamou de uso do indulto “reservado para os amigos do rei”.

    Ao longo de seu voto, a ministra citou diversos juristas que falam do indulto como um instrumento associado à monarquia e ao poder absoluto de um rei, que tinha a prerrogativa de conceder o perdão a qualquer cidadão.

    “Neste cenário histórico monárquico, o poder era absoluto, irrestrito e não estava sujeito a nenhum escrutínio judicial. Motivo pelo qual usado pelos regimes como uma forma de agrado do soberano aos seus súditos”, disse.

    Para a ministra, nos tempos atuais, a aplicação do indulto para “os amigos do rei” significa um desvio das justificativas do instrumento.

    “O uso do indulto, é muito importante destacar, como forma de manifestação do Poder Executivo reservado para os amigos do rei, ou seja, para aqueles que têm boa relação política com o poder, desvia-se das justificativas do instituto e o desvirtua, sem a menor dúvida”, defendeu a ministra.

    No caso de Daniel Silveira, o deputado federal é um aliado do presidente Jair Bolsonaro. Foi eleito em 2018 na onda bolsonarista, compôs a base de apoio ao governo.

    Freios e contrapesos

    No julgamento da ação contra o indulto natalino assinado pelo ex-presidente Michel Temer, a ministra Rosa Weber acompanhou o ministro Alexandre de Moraes, que foi contrário à ação apresentada pela PGR – e, portanto, a favor da legalidade do ato do então presidente da República.

    À época, o STF decidiu, por 7 votos a 4, manter o indulto de Temer e negar a ação proposta pela PGR.

    Em seu voto, a ministra defendeu que o indulto se caracteriza como uma prerrogativa do Poder Executivo que pode atuar como um instrumento do sistema de freios e contrapesos (expressão usada para simbolizar o controle dos Poderes entre si. Isso serve para evitar que haja abusos no exercício de qualquer dos Poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário).

    “Deste modo, os perdões presidenciais são, por desenho institucional, um controle sobre os eventuais excessos e erros de julgamento do Poder Judiciário”, afirmou a ministra.

    “Da análise da doutrina constitucional e da jurisprudência, inclusive no direito comparado, emerge que o poder de perdão presidencial é um componente importante das prerrogativas do Executivo, permitindo que o presidente intervenha e conceda indulto em três situações genéricas”, ela continua.

    Para a ministra, o primeiro caso seria a concessão da “misericórdia do governo em casos excepcionais em que o sistema legal falha na entrega de um resultado moral ou politicamente aceitável”.

    “A segunda, como forma de proteger os cidadãos contra possível erro judicial ocasionado por condenação injusta ou punição excessiva. E a terceira, no interesse da estabilidade social e política e da coexistência pacífica”, justificou.

    No caso de Daniel Silveira, o presidente Jair Bolsonaro utilizou como justificativa para publicar o decreto de indulto o que ele chamou de “legítima comoção” da sociedade em favor do deputado.

    “Considerando que a sociedade encontra-se em legítima comoção, em vista da condenação de parlamentar resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição, que somente fez uso de sua liberdade de expressão”, afirmou Bolsonaro em seu ato.

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