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    Diretor de Imunizações da Saúde diz que reverendo levou proposta da Davati

    Reunião ocorreu no dia 22 de fevereiro, às 16h, no Ministério da Saúde, mostram documentos aos quais a CNN teve acesso

    Renata Agostinida CNN

     

    O diretor do departamento de Imunização do Ministério da Saúde, Lauricio Monteiro Cruz, afirmou à CNN que a proposta de venda de 400 milhões de doses de vacina pela Davati Medical Suply chegou à pasta em fevereiro pelas mãos de um líder religioso ligado à Igreja Batista. O reverendo Amilton Gomes de Paula foi quem abriu as portas do ministério para o revendedor de vacinas Luiz Paulo Dominghetti, que relatou à CPI da Pandemia ter recebido cobrança de propina para que o negócio fosse efetivado mais à frente.

    A reunião ocorreu no dia 22 de fevereiro, às 16h, no Ministério da Saúde, mostram documentos aos quais a CNN teve acesso. O reverendo Amilton de Paula, que dirige uma entidade chamada Senah (Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários), foi ao encontro levando Dominghetti e Hardaleson Araújo de Oliveira, um oficial da Força Aérea.

    A lista de presença da reunião indica que o encontro teve como assunto “Aquisição de vacina Astrazeneca” e contou, por parte do ministério, com a participação de Lauricio Cruz e do assessor jurídico do Ministério da Saúde Eliel Barros.

    Documento 3
    Foto: CNN/Reprodução

    Em entrevista à CNN, Lauricio deu detalhes do que aconteceu na reunião. Segundo ele, o reverendo Amilton de Paula inicialmente disse que sua entidade, a Senah, poderia ajudar na divulgação da campanha de vacinação contra a Covid-19. Mas o assunto logo mudou, de acordo com Lauricio. “No meio da conversa, ele colocou uma proposta, a mesma que deixou registrada em uma carta aqui”, afirmou o diretor do departamento de Imunização.

    Segundo Lauricio, o reverendo Amilton disse que se tratava de “uma ação humanitária” e que poderia ajudar o Brasil a ter acesso a vacinas a “um preço acessível”. Neste mesmo encontro, contou Lauricio, o líder religioso fez a oferta de 400 milhões de doses de Astrazeneca, citando uma proposta de “US$ 3 e pouquinho” por dose.

    “Logo que ele expôs isso nós agradecemos e endereçamos à secretaria-executiva”, afirmou Lauricio. Na época, a secretaria-executiva estava sob o comando de Élcio Franco.

    O reverendo Amilton de Paula havia conseguido a audiência com Lauricio por meio de um pedido feito à assessoria internacional da pasta, segundo relato do diretor. “Eram três pessoas [no encontro]. Agora, a figura que ficou na minha memória, lógico, foi do reverendo porque estava expresso uma produção de fé, algo que traduzia uma grande confiança”, disse Lauricio.

    Proposta de compra 

    Um e-mail enviado por Lauricio ao reverendo no dia seguinte à reunião confirma a realização do encontro no ministério e cita que, na ocasião, foi feita a apresentação de “Proposta Comercial para fornecimento de 400.000.000 (quatrocentos milhões) de doses da vacina Astrazeneca AZD 1222”.

    Neste mesmo e-mail, Lauricio diz que a obtenção de vacina é uma prioridade da pasta e “existe por parte da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) o interesse na aquisição de doses da vacina para imunizar toda a população brasileira”. Ele afirma em seguida que “todos os processos de aquisição de vacinas no âmbito do Ministério da Saúde estão sendo direcionados pela Secretaria Executiva”.

    Email Davati MS Senah
    Foto: CNN/Reprodução

    Esse e-mail foi enviado com cópia a outras pessoas que não estavam na reunião, como Cristiano Alberto Hossri Carvalho, representante oficial da Davati no Brasil.

    Lauricio diz que não estranhou uma oferta tão ambiciosa feita por uma entidade religiosa. “Sinceramente, estávamos vivendo um momento tão difícil. Eu entendi que fosse um ponto de apoio, de verdade. Poderia ser mais uma grande oportunidade”, disse o diretor do Ministério da Saúde.

    Nas semanas seguintes, o reverendo Amilton de Paula manteve contatos com a Davati, indicando à empresa que as conversas no Ministério da Saúde estavam avançando. Em documento assinado pelo reverendo, datado de 8 de março e endereçado a Herman Cárdenas, presidente da Davati, Amilton de Paula pede documentos oficiais da Davati para que a Senah possa apresentar ao governo brasileiro.

    Documento 2
    Foto: CNN/Reprodução

    Em seguida, num e-mail de 10 de março também remetido a Cárdenas, o reverendo Amilton agradece a “confiança depositada” pela Davati na Senah em “conduzir negociações com o Ministério da Saúde do Brasil”. Ele diz ainda que “as negociações estão na etapa final”, e que o contrato para a venda de doses da vacina deve ser assinado em 12 de março.

    Documento 4
    Foto: CNN/Reprodução

    Oferta inicial

    Amilton de Paula pede que a Davati prepare documentos adicionais e garanta a disponibilidade das vacinas. E solicita ainda que um documento de venda atualizado seja enviado no valor de US$ 17,50 a dose.

    Em depoimento à CPI, Luiz Paulo Dominghetti disse que a oferta inicial da Davati era de US$ 3,50 a dose, valor próximo ao que o diretor do departamento de Imunização, Lauricio Cruz, lembra de ter ouvido do reverendo no encontro em fevereiro.

    O reverendo Amilton de Paula está à frente da Senah, que surgiu em 1999 como Senar (Secretaria Nacional de Assuntos Religiosos), segundo o site da entidade. Ele se apresenta como reitor da Faculdade Batista do Brasil, membro da Convenção Batista Nacional do Brasil, além de “doutor em ciências da educação”, “membro da Sociedade de Filosofia Medieval”, entre outras referências.

    A CNN tentou contato com o reverendo Amilton e com Hardaleson Oliveira por telefone, mas não obteve retorno. Também enviou e-mails à Senah. Cristiano Carvalho, da Davati, não quis comentar.

    Por nota, a Davati afirmou que “jamais participou de qualquer negociação ilícita”, que “até a divulgação pública dos fatos, a empresa não tinha conhecimento de que integrantes do governo teriam solicitado vantagem indevida para a aquisição das vacinas”.

    A empresa diz que apresentou ao Ministério da Saúde, em fevereiro deste ano, oferta para intermediar a compra de até 400 milhões de doses de vacina, mas que sempre deixou claro que “não detinha a posse das vacinas” e que atuaria na “aproximação entre o Governo Federal e um allocation holder, empresa que possuía créditos de vacinas junto ao laboratório AstraZeneca”.

    Luiz Paulo Dominguetti Pereira durante depoimento na CPI da Pandemia
    Reverendo foi quem abriu as portas do ministério para o revendedor de vacinas Luiz Paulo Dominghetti
    Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

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