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    Eleições 2022

    Desafios na economia não serão pequenos para o próximo presidente

    Será difícil o PIB brasileiro crescer muito acima de 1,5% em 2023

    Sergio Vale

    Desde o ano passado, o mundo tem passado por um processo inflacionário com diversas causas. Desde o desmonte das cadeias de distribuição até, e mais importante, os fortes estímulos fiscais e monetários nos diversos países afetados pela pandemia.

    A guerra da Ucrânia pegou o mundo com uma inflação já muito pressionada e, no caso do Brasil, vai ser outro ano perdido no front inflacionário. O IPCA deve ficar muito próximo de 7%, o que significa que em dois anos a inflação brasileira terá crescido 17%, algo que não vemos desde a recessão de 2015/2016.

    Mas, diferentemente de 2016, quando houve uma mudança de presidente e importantes reformas foram aprovadas, o mesmo não acontece agora. Mais ainda, naquele ano havia um esforço conjunto entre política fiscal e monetária para trazer a inflação para baixo, mas dessa vez o Banco Central está sozinho.

    A aprovação da regra do teto foi marco importante de responsabilidade fiscal que foi seguida de outras tão importantes quanto, como a reforma trabalhista. Em ano eleitoral, a pressão fiscal fica ainda maior como tem sido sinalizado pelo governo, o que coloca um desafio não trivial para o BC.

    Isso significa que o caminho indicado pelo banco de subir ainda mais a Selic, por mais doloroso que seja para o bolso da população, vai continuar. Parece que a taxa de juros básica vai furar os 13% e não dá para descartar nesse momento que possa ser mais do que isso.

    Esse choque intenso em prazo tão rápido vai machucar a economia não apenas este ano, mas cada vez mais coloca comprometimento para o PIB de 2023. Olhando a partir de hoje, parece difícil o crescimento ficar muito acima de 1,5% ano que vem.

    Ao mesmo tempo, a guerra da Ucrânia pode acabar nas próximas semanas, mas a tensão entre russos e ucranianos e, especialmente, russos e Otan, vai continuar por anos a fio. A quebra da velha ordem internacional, ao impactar um país relevante militarmente como a Rússia, mas também importante em commodities, coloca riscos adicionais para o mundo.

    Os preços de commodities muito provavelmente ainda ficarão em patamar elevado, mas abaixo do pico alcançado nos piores momentos do conflito. Certamente esses preços não devem voltar rapidamente para os níveis que existiam antes da crise.

    Preços de commodities ainda elevados, com custos de fertilizantes também pressionados, vão manter a pressão na inflação por um bom tempo. A inflação de alimentos particularmente deve ficar entre 8% e 10% este ano, o que significa um crescimento de mais de 30% em três anos. E quem paga a conta, no final, é a população mais pobre.

    Os desafios não são triviais para a gestão de política econômica este ano, mas coloca uma responsabilidade ainda maior para quem virar presidente. O próximo chefe do Executivo vai herdar uma economia abalada pela conjunção inflação/juros e vamos precisar do mesmo tipo de choque positivo que tivemos em 2016 para evitar que o BC tenha dificuldades com a inflação ano que vem.

    Os ajustes feitos no início do governo Temer ajudaram o mercado a acomodar a taxa de câmbio e o Banco Central mais crível que tivemos a partir dali fez o trabalho de trazer o IPCA para 2,9% em 2017. Foi um esforço conjunto que vai precisar acontecer de novo caso queiramos a inflação baixa que tivemos naquele ano.

    Esse será o grande desafio para o próximo presidente: manter a agenda positiva de política econômica, aperfeiçoando o que precisa, mas sem voltas atrás. O preço a se pagar em querer reinventar a roda será uma dificuldade crescente em trazer a inflação para baixo, o que é particularmente preocupante depois de tantos anos de choques negativos.

    O melhor que o próximo governo poderia fazer é não mexer na regra do teto, deixá-la para ser reformada como manda a Constituição em 2026, e partir para uma reforma tributária digna de nome. Já há reformas bastante discutidas na Câmara (PEC 45) e no Senado (PEC 110), às quais poderia se juntar uma reforma de Imposto de Renda.

    Essas reformas vão demandar tempo de costura política e o capital político de inicio de governo deveria ser gasto quase integralmente com esta reforma. O ganho de crescimento e produtividade nos anos seguintes ajudaria a diminuir o déficit público e ajudaria no controle da dívida. O tempo dirá se houve aprendizado institucional no país para focarmos no que é relevante.

    *Sergio Vale é economista-chefe da MB Associados

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