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    CNN Plural

    Carta ao presidente: o que (nós, pretos e pardos) esperamos de você, companheiro!

    CNN ouviu alguns dos representantes da pauta racial no Brasil em busca de uma projeção sobre o que deve ocorrer no governo Lula

    Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participa de comício em Belo Horizonte
    Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participa de comício em Belo Horizonte Ricardo Stuckert/PT

    Letícia Vidicada CNN

    A escolha do presidente Lula para governar o Brasil pelos próximos quatro anos reforçou ainda mais uma ideia que carrego comigo há muito tempo (talvez mais que uma ideia, uma inquietação): a de que as “minorias” são as maiorias.

    Não só escrevo com aspas como sempre gosto de falar ASPAS quando me refiro aos grupos minorizados porque sempre me questiono: como pode um grupo que representa mais de 50% da população brasileira – os pretos como eu – ser considerado minoria?

    As minorias, mais uma vez, mostraram que são maioria, que tem voz e vez e que a soma de muitas vozes diversas tem força de mudar o rumo de um país. Isso me dá esperança de que pautas que considero tão importante para o avanço de uma sociedade possam continuar (ou voltar) a serem priorizadas.

    Pautas sociais que consideram que só com oportunidades iguais podemos ter um país mais igualitário. Oportunidades iguais que nos inserem e não nos excluem. Oportunidades iguais que tratem de representatividade mas também de inclusão.

    E então, companheiro Lula, tem muita gente esperando que o apertar do verde da urna somado ao seu discurso no domingo último sobre sua vitória, no qual destacou a importância dessas pautas no seu governo, avance neste quesito.

    Para isso, a gente foi ouvir alguns dos representantes da pauta racial sobre o que eles esperam do seu governo nos próximos anos.

    Reconhecimento do racismo

    “Seria extremamente emblemático que o presidente Lula faça um reconhecimento público do racismo. Um reconhecimento de que o estado brasileiro produziu e continua produzindo racismo contra a população negra, prejudicando ainda em muito essas pessoas.”, destaca Irapuã Santana, presidente da comissão de igualdade racial da OAB-SP.

    Apesar do racismo ser um crime no Brasil (Lei 7.716/1989) com pena de reclusão, as práticas racistas e o racismo estrutural ainda permeiam a nossa sociedade. Coisas que gente como eu sente na pele quase que diariamente. Heranças de um Brasil escravocrata, que por três séculos e meio fez do nosso país o maior o maior território escravista do hemisfério ocidental: 12,5 milhões de africanos foram trazidos para cá em condição de escravizados! E, mesmo depois da ‘Abolição’ da escravatura seguiram à própria sorte, sem meios de seguir a vida para terem de fato oportunidades iguais.

    “A gente precisa fazer com que a União volte seus olhos para a população negra. Ela precisa de dinheiro para fazer política pública, precisa de um fundo para isso. Isso é a pedra fundamental para gente conseguir começar a promover políticas públicas e para que haja emancipação da população negra brasileira”. Irapuã Santana e a Educafro entraram com uma ação civil pública pedindo esse reconhecimento e também a criação de um fundo de para financiar políticas públicas voltadas para a população negra.

    Políticas públicas que devem não só ser criadas mas também mantidas como a política afirmativa de cotas.

    “Eu desejo que as cotas nas universidades possam ser mantidas, ampliadas e aprimoradas. Manter os jovens negros no sistema de ensino. Que as políticas de cotas nos serviços federais também possam ser renovadas, já que a lei termina em 2024”, deseja José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares.

    Compartilho do mesmo desejo de Zé Vicente. Nos últimos dez anos, é inegável o aumento de pessoas pretas e pardas que ingressaram no ensino superior. Vi muita gente parecida comigo – conhecida ou não – de diploma na mão, sendo o primeiro da casa a ir para a faculdade, quebrando um ciclo de pobreza e trazendo um pouco mais de oportunidade social para a próxima geração de suas famílias.

    Mais representatividade e pluralidade

    Ao falar de desejos, caro companheiro, se somos 54% da população brasileira por que não nos vemos tanto assim? Por que, por exemplo, ao viajar para os Estados Unidos sempre tenho a impressão de que vejo mais negros por lá, sendo que eles somam pouco mais de 10% de pretos em sua população?

    É hora de ocuparmos mais espaços de poder, de nos vermos mais representados e colorirmos mais os espaços. Para Zé Vicente, a fisionomia dos brasileiros que representam essa estética multicultural tem que ser a marca profunda da reconstrução de onde emerge um país dividido.

    “É importante considerar que o negro emerge como força política com bastante relevância. É preciso que essa força seja reconhecida para manutenção das políticas públicas de inclusão e que o negro seja colocado no alto escalão do governo. Queremos representatividade e inclusão de negros no governo”, destaca Zé Vicente.

    Pela primeira vez no país, tivemos uma maioria de candidatos que se apresentaram como pretos ou pardos. Muitos eleitos. E, segundo o reitor, o negro se transformou numa força política relevante e crucial para a vitória de Lula.

    “Diversidade seja mantida como agenda importante, assim como combate e enfrentamento ao racismo, manutenção de políticas afirmativas, de pertencimento e que a estética multicolorida do país possa ser expandida e consolidada como nova formulação de um Brasil de todos”, reforça Zé Vicente.

    Uma país de todos, o qual também espero que possa ver mais pessoas como eu (de pele escura ou não mas pretas e pardas igualmente) representadas em mais espaços da sociedade, mostrando a força da ‘minoria maioria’, avançando de fato para um país mais igualitário em oportunidades e acessos.

    É o que – pessoas pretas como eu – esperamos de você, companheiro!