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    Bolsonaro “pendurado” no TSE e 8 de janeiro desafiam oposição a Lula em seus 100 dias

    Ex-presidente esteve fora do país e enfrenta ações que podem torná-lo inelegível; especialistas ouvidos pela CNN veem oposição com dificuldades para se articular após repercussões negativas de atos criminosos de 8 de janeiro e a chamada "minuta do golpe", encontrada na casa de Anderson Torres

    Danilo MoliternoLeonardo Rodriguesda CNN

    São Paulo

    A estadia do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nos Estados Unidos durante os primeiros meses do ano e a possibilidade de o ex-mandatário ficar inelegível por conta de inúmeros processos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fragmentaram a oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e dificultaram a articulação destes grupos, segundo especialistas ouvidos pela CNN.

    “A oposição ainda não está articulada como deveria para fazer um embate mais direto com o governo. Não sei se isso vai acontecer. Há grupos bolsonaristas dentro de partidos fisiologistas. Então a gente nem sabe o tamanho dessa oposição”, aponta a pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre o Congresso da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Beatriz Rey .

    O bolsonarismo, principal núcleo da oposição, enfrentou dias conturbados no início de 2023. Cientistas políticos ouvidos pela CNN apontam que os atos criminosos de 8 de janeiro, a minuta golpista encontrada na casa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres e a reunião golpista delatada pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES) desgastaram a imagem do grupo.

    Sem líderes ou causas proeminentes para coordenar ações e com repercussões negativas, a oposição não conseguiu ferir o governo significativamente nos primeiros 100 dias, apesar de Lula ter cedido espaços para críticas, segundo a cientista política Deysi Cioccari.

    “Lula está perdido em algumas questões, como nos ataques ao Banco Central, no próprio arcabouço fiscal, em declarações que deu sobre a possibilidade de não ser verdade que o Primeiro Comando da Capital (PCC) planejou matar Sergio Moro. E a oposição não está sabendo explorar isso”, afirma.

    Ausência de Bolsonaro

    O ex-presidente Jair Bolsonaro viajou aos EUA antes mesmo da posse de Lula e retornou somente no final de março. Durante os três meses em que esteve fora do Brasil, se pronunciou poucas vezes e não coordenou ações políticas relevantes. No último dia 29, chegou a declarar à CNN que não lideraria a oposição.

    “Não vou liderar nenhuma oposição. Vou participar com meu partido, como uma pessoa experiente, 28 anos de Câmara, quatro de presidente, dois de vereador e quinze de Exército, para colaborar com o que eles desejarem, como a gente pode se apresentar para manter o que tiver de ser mantido e mudar o que tiver de ser mudado”, explicou.

    Para o cientista político Bruno Carazza, a viagem foi prejudicial ao espaço de Bolsonaro dentro da oposição. “Essa decisão enfraqueceu muito a posição dele em relação à cena política brasileira e até em relação ao bolsonarismo — sem considerar os muito radicais, claro”, indica.

    Ao mesmo tempo, o ex-presidente encara rumores sobre a possibilidade de se tornar inelegível desde as eleições. A hipótese que ganhou corpo com o avanço de processos na Justiça Eleitoral.

    Uma das ações, apresentada pelo PDT, acusa Bolsonaro de ter cometido abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação ao questionar a confiabilidade das urnas. A minuta encontrada na casa de Anderson Torres também foi incluída no processo, que já superou as fases de produção de provas e oitiva de testemunhas.

    A situação do presidente ficou mais sensível com a revelação dos casos das joias que foram transportadas da Arábia Saudita ao Brasil em sua gestão. Bolsonaro depôs à Polícia Federal (PF) na quarta-feira (5) sobre o ocorrido.

    “A postura do Bolsonaro neste início de ano, somada à questão das joias, dificulta que ele exerça um papel de liderança”, opina Bruno Carazza.

    Cioccari destaca a dificuldade da oposição em se organizar na ausência de Bolsonaro. “A direita ficou sem um líder, porque não soube se organizar para formar uma liderança. E o impacto disso é que a oposição democrática fica sem um centro”, aponta.

    Neste vácuo político, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, mencionou mais de uma vez a possibilidade de a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro concorrer à Presidência em 2026.

    Michelle Bolsonaro assume a presidência do PL Mulher ao lado do presidente nacional do partido, Valdemar Costa Neto / Michelle Bolsonaro assume a presidência do PL Mulher ao lado do presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto 21/03/2023 REUTERS/Tom Molina

    O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), também foi citado por Valdemar como potencial presidenciável. Até o momento, no entanto, nenhum nome da oposição — bolsonarista ou não — foi capaz de agregar grupos e ganhar projeção nacional.

    Para Beatriz Rey, há espaço para o avanço de outras lideranças dentro da oposição. Ela destaca, porém, que a ascensão destes nomes depende do fim das indefinições sobre o ex-presidente.

    “Na medida em que Bolsonaro não assume esse papel de liderança, se isso se concretizar, temos outros nomes, inclusive para assumir candidatura presidencial, como os governadores Tarcísio [de Freitas, de São Paulo] e [Romeu] Zema”, diz.

    Cientista político e professor da FGV Ebape, Carlos Pereira reitera o potencial de outras lideranças para ocupar este espaço: “Há uma disputa, na direita, para concentrar o voto desse eleitor brasileiro de direita. Tem o Tarcísio e o próprio Moro, por exemplo. Mais ao centro, podemos mencionar o PSDB, com o governador Eduardo Leite”.

    8 de janeiro e minuta do golpe

    Apenas oito dias após o início do governo Lula, criminosos atacaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília, em protesto contra o resultado das eleições. A consequência dos atos, apontam especialistas, prejudicou a imagem do bolsonarismo.

    “Tudo foi ligado ao bolsonarismo e ao próprio fato de Bolsonaro ter questionado o resultado das urnas. A direita como um todo sofreu, mas muito mais o bolsonarismo”, avalia Deysi Cioccari.

    O instituto AtlasIntel divulgou uma pesquisa após o ocorrido a fim de testar a opinião pública: 75,8% dos entrevistados discordaram dos ataques, ao passo que 18,4% disseram concordar e 5,8% não souberam responder.

    Atos criminosos no Congresso Nacional
    Atos criminosos no Congresso Nacional / Lucas Neves/Enquadrar/Estadão Conteúdo

    Quatro dias depois dos ataques, a PF encontrou uma minuta que propunha um golpe de Estado na casa de Anderson Torres — o que culminaria na prisão do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública.

    Em fevereiro, o senador Marcos do Val revelou ter se reunido com Bolsonaro e com o ex-deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) durante as eleições, em ocasião na qual o ex-parlamentar propôs um golpe de Estado.

    A sequência de acontecimentos colocou ainda mais pressão sobre a opinião pública em relação ao bolsonarismo, mas também apreensão sobre possíveis consequências jurídicas.

    Carlos Pereira destaca os “custos” dos atos golpistas para o bolsonarismo, mas volta a pontuar que os efeitos são diferentes para os diferentes núcleos que compõem a oposição.

    “O custo político, além do judicial, que o bolsonarismo deve pagar pelos atos golpistas são enormes. Agora, existe uma direita liberal no Brasil que é, antes de tudo, antipetista. Bolsonaro foi a alternativa, a esses eleitores, para evitar o PT”, aponta.

    Lampejos de articulação

    Beatriz Rey destaca como tentativas de articulação da oposição à eleição para a presidência do Senado e o recolhimento de assinaturas para a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar possível omissão do governo federal no dia 8 de janeiro.

    Oposição anuncia que tem assinaturas para abrir CPMI sobre 8 de janeiro
    Oposição anuncia que tem assinaturas para abrir CPMI sobre 8 de janeiro / Natanael Alves / PL

    “A oposição tentou fazer algumas articulações, por exemplo na eleição da presidência do Senado, com a CPI para apurar o dia 8 de janeiro, mas nada teve muito impacto até agora. Acho que o lugar onde a oposição está mais organizada é nas redes sociais”, aponta.

    No Senado, a oposição lançou a candidatura de Rogério Marinho (PL-RN), e Michelle Bolsonaro chegou a comparecer à Casa Alta para apoiar o parlamentar. Contudo, o ex-ministro acabou derrotado por Rodrigo Pacheco (PSD-MG), candidato do governo.

    A possibilidade de uma CPI para investigar os atos, por sua vez, perdeu força após Pacheco apontar impasses para a leitura de seu requerimento. Apesar disso, a investigação ainda pode ser iniciada.