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    Bolsonaro e Maia: ataques em entrevistas refletem histórico de relação tensa

    Presidente da República e presidente da Câmara acumulam conflitos e divergências ao longo de 16 meses do atual governo

    Anna Satie e Guilherme Venaglia, , da CNN, em São Paulo

    A divergência sobre propostas em discussão no Congresso Nacional deflagrou uma briga pública entre o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O conflito, evidenciado nas entrevistas ao vivo de duas das maiores autoridades do país à CNN, no entanto, é mais antigo e reflete uma relação cheia de altos e baixos. 

    O tema em questão é o pacote de auxílio financeiro aos estados, aprovado na Câmara a despeito dos gritos da equipe econômica. O projeto prevê auxílio financeiro da União aos governos estaduais sem a exigência de contrapartidas. O Planalto diz que não há dinheiro para isso e o presidente da Câmara rebate que este é momento de apoio financeiro aos estados, não de reformas. 

    Fato é que as críticas feitas pelo presidente Jair Bolsonaro nesta quinta-feira (16) estão calcadas em dois pontos que já frequentaram outros discursos.  

    Da sua parte, o presidente acusa Rodrigo Maia de querer ocupar indiretamente o seu lugar. Ontem, Bolsonaro disse que Maia “controla a pauta”, ou seja, decide o que vai ou não a voto e, portanto, dita os projetos que viram ou não leis. O presidente da Câmara justifica que o Congresso age pela falta de ação do governo, que já chamou de “deserto de ideias”. 

    Em contrapartida, Maia repete que o presidente da República não faz articulação política e não tem diálogo fluido com o Congresso Nacional. Em geral, as respostas de Bolsonaro giram em torno de associar o democrata à “velha política”. Desta vez, frisando que não falava da Câmara, o presidente levantou dúvidas sobre “o tipo de diálogo” que Maia deseja. 

    Relembre abaixo os principais episódios da relação entre o chefe do Executivo e o presidente da Câmara ao longo destes dezesseis meses de Bolsonaro no Palácio do Planalto: 

    “Ele está abalado” 

    O PSL, à época partido do presidente Jair Bolsonaro, apoiou a reeleição de Rodrigo Maia como presidente da Câmara dos Deputados em fevereiro de 2019. As desavenças começaram a ficar mais evidentes a partir das iniciais discussões da reforma da Previdência, ainda no primeiro semestre.

    Maia defendia uma participação maior do governo na discussão do projeto e criticava o presidente por defender pautas que julgava corporativas, como condições especiais para forças de segurança pública. Já Bolsonaro afirmava que o Congresso cobrava dele cargos e liberação de verbas para que aprovasse a reforma e outros projetos do governo.

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    Na semana mais tensa, no final de março, o presidente da Câmara disse que o governo era um “deserto de ideias” e cobrou engajamento. Bolsonaro rebateu e ironizou o presidente da Câmara, disse que ele praticava a “velha política”, insinuando semelhante à feita ontem à CNN, mas que perdoava pelo deputado estar “abalado com situações pessoais”

    A fala aconteceu logo depois que o ex-ministro Moreira Franco (MDB), sogro da esposa de Maia, ter sido preso. Na réplica, o deputado afirmou que “abalados estão os brasileiros que estão esperando desde 1º de janeiro que o governo comece a funcionar” e disse que Bolsonaro “brincava de presidir o Brasil”. 

    “Usina de crises”

    No começo de abril, Maia falava em deixar a articulação da reforma da Previdência, se queixando de “apanhar da base eleitoral do presidente”. No mês seguinte, ele foi alvo principal de um protesto favorável ao governo federal.

    Os conflitos ocorridos na sequência também tiveram um personagem que também está presente agora: o ministro da Economia, Paulo Guedes. Rodrigo Maia se queixou de Guedes pelas reações do ministro às reduções de economia prevista na reforma da Previdência conforme a proposta era alterada. Na época, o presidente da Câmara chegou a dizer que o governo era uma “usina de crises” e que o parlamento deveria se distanciar.

    Houve algumas tentativas de reaproximação. Bolsonaro chegou a dizer que “namorava” Maia, a quem cumprimentou em pronunciamentos e falas públicas quando a reforma avançou nas comissões internas e no plenário da Câmara dos Deputados.

    Agenda

    Passada a reforma da Previdência, quase tema único durante boa parte de 2019 no Congresso, Rodrigo Maia deu movimentos em torno de uma agenda de propostas abraçada por deputados à revelia do governo federal. Um exemplo é a chamada “agenda social”, articulada por Maia com um grupo de parlamentares que previa mudanças no Bolsa Família e em outros programas sociais.

    Esses movimentos acenderam alerta no Planalto, que via no presidente da Câmara a intenção de fazer uma espécie de agenda paralela à do governo. Na mesma época, o presidente publicou um vídeo em que partidos políticos, a imprensa e instituições são retratados como hienas que impedem um leão, ele próprio, de governar. Maia classificou o vídeo como “agressivo e desnecessário”.

    Outro episódio foi a entrevista em que o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, admitiu a hipótese de um retorno do Ato Institucional nº 5 (AI-5), instrumento legislativo da ditadura militar que fechou o Congresso Nacional e restringiu direitos. Maia classificou essa fala como “repugnante”.

    No final de 2019, a votação sobre o fundo eleitoral no Congresso foi razão para críticas do presidente, que pressionava os deputados a rejeitarem a proposta. Maia acusou Bolsonaro de ter mudado de ideia a esse respeito por ter saído do PSL e, portanto, não estar mais em um partido que seria beneficiado pelo rateio de verbas.

    Crise atual

    Nesta quinta-feira (16), pouco depois de demitir o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), o presidente Jair Bolsonaro concedeu uma entrevista exclusiva à CNN. Questionado sobre a recuperação economia do Brasil após a pandemia, Bolsonaro criticou o deputado: “O Maia tem de me respeitar como chefe do Executivo”, disse.

    A divergência entre o governo federal e as lideranças da Câmara começou na semana passada, depois que os deputados aprovaram uma versão remodelada do Plano Mansueto, projeto de reorganização das contas dos estados proposto pelo governo.

    Na nova versão, com a finalidade declarada de diminuir os impactos econômicos da COVID-19, a Câmara aprovou a recomposição de impostos, com a União repassando a estados e municípios as verbas que estes deixarem de arrecadar com tributos diante da crise. O governo vê impacto econômico excessivo. 

    “O que nós projetamos de economia com a reforma da Previdência praticamente foi engolido em poucos meses. Não vou trair a minha consciência e deixar de falar a verdade. Eu lamento a posição do Rodrigo Maia nessas questões. Lamento muito a posição dele, que resolveu assumir o papel do Executivo com ataques bastante contundentes à nossa posição”, disse.

    O presidente ainda fez questão de dizer que sua crítica é ao presidente da Casa pessoalmente, não aos demais parlamentares. “Não estou rompendo com o Parlamento, não. Muito pelo contrário, é a verdade que tem que ser dita”. Nestas últimas semanas, Bolsonaro se reuniu com líderes de partidos que apoiam Maia, em movimento visto como tentativa de minar o poder do chefe da Câmara.

    Questionado pelo jornalista William Waack sobre os ataques de Bolsonaro, Maia respondeu que “o presidente ataca com um velho truque da política, para mudar de assunto”. O deputado afirma que o presidente quer tirar os holofotes da mudança de comando no Ministério da Saúde.

    “Para nós, o assunto continua sendo a saúde”, disse ele. Maia acrescentou que não responderá a Bolsonaro “no nível que ele quer que eu responda”. “O presidente não vai ter de mim ataques. Ele nos joga pedras, o Parlamento vai jogar flores ao governo federal.”

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