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    Argentina foi prejudicada por redução na exportação de carne, diz especialista

    Candidato à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que pretende “discutir” a política de exportação de carnes do Brasil, a fim de diminuir preços

    Thiago FélixJoão Pedro Malarda CNN

    A possibilidade de reduzir as exportações de carne do Brasil, citada pelo candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já foi uma medida tomada na Argentina, e o país sofre as consequências negativas da decisão até hoje, afirma o professor do Centro de Agronegócio da FGV, Felippe Serigati.

    Em um evento realizado em Taboão da Serra (SP), Lula afirmou que que, caso eleito, pretende “discutir” a política de exportação de carnes do Brasil, a fim diminuir preços.

    “O que eu quero é que vocês possam entrar no açougue e comprar carne. Por isso nós vamos ter que discutir o preço da carne nesse país. Nós vamos discutir se vai continuar só exportando ou se vai deixar um pouco pra nós comermos”, afirmou o ex-presidente.

    Em entrevista à CNN neste sábado (10), ele explicou que uma proibição ou redução da exportação de carne faria com os produtores voltassem todas as suas cabeças de gado para o setor interno, o que levaria a preços menores, mas “depois ele vai reduzir o tamanho do rebanho”, o que faria os preços subirem novamente.

    “Se o mercado interno já pudesse absorver essas cabeças, não teria uma parte voltada ao mercado externo”, afirmou o professor.

    No caso argentino, a redução de exportação resultou em uma perda de espaço do setor no mercado internacional e um impacto econômico para o país, “prejudicando a sociedade e a pecuária argentina, que até hoje pagam caro por isso”.

    Segundo ele, a medida “vai gerar rebanho menor no médio prazo. Além disso, precisaria dividir o custo em menos cabeças, com custo unitário maior, precisando reduzir ainda mais o rebanho dele, e no fim das contas o produtor teria ainda menos cabeças no mercado interno dado que o custo será maior”.

    Outro problema, diz Serigati, seria “uma quantidade menor de cabeças, produzir menos carne. Não é só que a carne vai ficar mais cara, ela vai gerar menos renda. Quando exportamos carne, estamos gerando renda, seja para o pecuarista, os frigoríficos, toda a cadeia envolvida na operação. Se fizer isso, ganha lá na frente carne mais cara e economia mais pobre”.

    Serigati afirma que “em termos de política para reduzir preços de alimentos, a margem de manobra é bastante estreita. A carne está mais cara não por um problema brasileiro, mas porque o mercado internacional está aquecido, há uma demanda maior de carne, teve um problema da peste suína africana na China com uma fração relevante do rebanho suíno chinês sendo sacrificada”.

    “Não é um problema aqui dentro, não tem muito o que a gente possa fazer”, pontua. “Uma parte dessa demanda mais aquecida se reflete em mais preço, principalmente no curto prazo, mas essa demanda também se reflete em volume produzido maior, e esse volume maior gera mais renda, emprego, melhora a situação da economia, em que a atividade pecuária é relevante”.

    A expectativa do professor é que os preços tenham patamares menores a partir do segundo semestre, refletindo um aumento do rebanho bovino para atender à demanda e aos preços maiores.

    Para ele, a raiz do problema da fome do Brasil não é a falta de produção de comida, mas sim a falta de renda. “Veio a pandemia, derrubou a renda de diversos domicílios, que por si só já iria deteriorar o quadro, e veio combinada com uma série de problemas no mercado internacional e preços de combustíveis, com o preço das commodities operando em patamares bastante elevados”.

    “Os domicílios, com a renda contraindo, viram os alimentos ficarem mais caros. Isso não é exclusividade do Brasil, e o impacto foi até em intensidade menor que em diversas economias emergentes”, explica.

    Caminho incerto

    Para Sergio De Zen, diretor da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a ideia citada por Lula é “um caminho bastante incerto, e bastante incorreto em muitos países que o adotaram. No geral, tem que lembrar que não exportamos a totalidade de um animal, muitas vezes a própria exportação subsidia os cortes que são vendidos no mercado interno”.

    Segundo o diretor da Conab, há o risco de uma medida como essa fazer com que “a gente mate uma das maiores fontes de renda da economia brasileira, que emprega milhões de pessoas, tem um resultado muito positivo, principalmente pelos números de produtividade que ela tem ao longo do tempo”.

    Ele lembra que o Brasil historicamente importa entre 20% e 30% da sua produção total de carne bovina, e que com o passar do tempo os brasileiros se acostumaram a uma melhora da qualidade da carne, o que também fez o produto encarecer.

    Além disso, houve um ganho de espaço do consumo de carnes de frango e suína, em um processo “que tem a ver com fatores culturais, econômicos. Não dá para apenas atribuir o preço, ou a renda, à mudança de hábitos alimentares, que são muito mais complexos”.

    “O importante é preservar o valor da cadeia produtiva. De certa forma, o que o brasileiro se beneficia é do aumento de produtividade da carne. Nós usamos cada vez menos terra, recursos para produzir mais quantidade de carne, é assim que a gente reduz o preço com sustentabilidade e eficiência”, destaca.

    De Zen considera que a medida poderia levar a preços menores nos primeiros meses, mas que depois ocorreria uma reversão do processo, reduzindo o interesse das pessoas em produzir e depreciando “o patrimônio de praticamente todos os produtores brasileiros. Quando pensa na carne bovina pensa no cara grande, mas mais de 70% vem de um pequeno produtor, então estaria prejudicando esses pequenos produtores”.

    O diretor da Conab também citou o caso da Argentina, destacando que o país chegou a ter uma queda de preços, que depois subiram. “A gente precisa de um aumento de produtividade, investimento em tecnologia, tranquilidade nos investimentos, e com isso tem mais sustentabilidade e carne mais barata para todo mundo”, defende.

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