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    Após Bolsonaro falar em Aras no STF, procuradores cobram MPF independente

    Nesta semana, o presidente concedeu ao procurador-geral da República -- que tem a prerrogativa de denunciá-lo criminalmente -- uma condecoração militar

    Enquanto o presidente Jair Bolsonaro fala em indicar o procurador-geral da República, Augusto Aras, ao Supremo Tribunal Federal (STF) e lhe concede honraria militar, quase 600 procuradores assinaram nesta sexta-feira (29) um manifesto pedindo independência do Ministério Público Federal (MPF). O documento, subscrito por mais da metade dos 1.131 procuradores da República do País, pede a criação de uma emenda constitucional que obrigue o presidente a escolher o chefe do MPF a partir de uma lista tríplice elaborada pela categoria.

    Embora essa regra não exista, desde 2003 todos os procuradores-gerais saíram de uma relação de três nomes feita a partir de eleição interna da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Bolsonaro quebrou a prática ao indicar Aras, em setembro. Aras vem sendo alvo de críticas internas no MPF por tomar medidas consideradas “pró-governo”, como o pedido, feito na quarta-feira (27), para o Supremo Tribunal Federal (STF) suspender o inquérito das fake news, que atinge políticos, empresários e blogueiros bolsonaristas.

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    O cortejo de Bolsonaro a Aras já tinha ficado explícito anteontem, quando o presidente afirmou que daria uma eventual vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) ao procurador-geral. Ao classificar a atuação do procurador-geral como “excepcional”, o mandatário disse que “o nome de Augusto Aras entra fortemente”, caso apareça uma terceira vaga — até 2022, os ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello deixarão a Corte. Nesta sexta-feira, Bolsonaro tentou atenuar a repercussão negativa da declaração e escreveu, em suas redes sociais, que não cogita indicar o procurador-geral para uma dessas duas vagas.

    O aceno de Bolsonaro a Aras aumentou o ritmo de adesões ao manifesto dos procuradores da República, lançado no último dia 27 pela ANPR. “Considerando que cabe ao PGR investigar e acusar criminalmente o presidente da República, seria certamente mais adequado, partindo do princípio do fortalecimento institucional e da independência de atuação, que a lista fosse respeitada”, afirma nota da ANPR.

    Homenagem

    Na manhã desta sexta (29), Bolsonaro incluiu Aras numa lista de homenageados pela Ordem de Mérito Naval, uma das maiores honrarias militares, concedida a integrantes da Marinha e, excepcionalmente, corporações militares, instituições civis e personalidade que tenham prestados serviços relevantes à Marinha. Segundo publicação no Diário Oficial da União, o procurador receberá a homenagem junto com o ministro da Educação Abraham Weintraub, que ontem prestou depoimento para explicar por que disse, na reunião ministerial de 22 de abril, que queria prender ministros do Supremo.

    A íntegra do encontro ministerial foi divulgada há oito dias por autorização do Supremo, como parte de outro inquérito que incomoda Bolsonaro e que tem atuação da PGR: a investigação de suposta interferência política na Polícia Federal (PF). Ao longo da investigação, Aras poderá ser provocado pelo Supremo a se posicionar sobre medidas relacionadas ao presidente, como um pedido para prestar depoimento. Ao fim da colheita de provas, caberá a ele denunciar ou não Bolsonaro.

    A atuação de Aras no caso já havia sido questionada por seus pares. Ao pedir a abertura do inquérito, o procurador-geral mirou também o ex-ministro da Justiça Sergio Moro, que fez as acusações contra o presidente. Outro episódio contestado foi o pedido de apuração sobre ato antidemocrático convocado contra o STF em abril. Apesar de o presidente ter feito até discurso na manifestação, o PGR o livrou do inquérito.

    Reprovação

    O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso criticou nesta sexta a possibilidade de procuradores-gerais serem reconduzidos ao cargo ou indicados para outras funções pelo presidente. “A recondução, evidentemente, pode gerar a tentação de agradar. (…) Acho que quem tem que ser independente não pode ser reconduzido, portanto acho que teria que ser um mandato único”, defendeu o ministro, que assumiu, nesta semana, a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Barroso disse ser a favor de uma lista tríplice “vinculante”, ou seja, que torne obrigatória a nomeação de um dos três mais votados.

    De acordo com a professora de direito internacional e comparado da Universidade de São Paulo (USP) Maristela Basso, não há nenhuma violação a lei específica que justifique uma ação contra o presidente pela sua fala. No entanto, a declaração cria um impedimento de ordem moral. “Qualquer ato que ele (Aras) tomar agora, será um ato suspeito: se ele for rígido, vai parecer que é uma tentativa de demonstrar independência. Se ele for mais flexível, vai se questionar se ele não está mantendo esse flerte com o presidente por um eventual cargo”, disse a professora.

    Para o advogado Pedro Lucena, mestre em direito administrativo pela PUC-SP, a declaração do presidente ultrapassa a barreira do elogio e passa a sugerir uma possível recompensa, o que poderia interferir na independência das instituições. “A manifestação, por si só, não configura tipificação criminal ou ato de improbidade. Porém, levando em conta a educação política da sociedade, não tenho dúvidas de que a declaração gera efeito negativo, pois dá a entender que a autonomia da PGR pode ser flexibilizada e barganhada.”

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