Alerj aprova por unanimidade seguimento do impeachment de Wilson Witzel
A partir de agora, começa uma nova fase do processo: a do Tribunal Misto, formado por cinco deputados estaduais e cinco desembargadores do TJ-RJ
Em uma sessão de pouco mais de seis horas, a Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) aprovou nesta quarta-feira (23), por unanimidade (69 votos a zero), o prosseguimento do processo de impeachment do governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC).
Para que o procedimento tivesse continuidade, eram necessários 47 votos de 70 — ou seja, dois terços da Casa.
Era previsto que Witzel fosse até a Assembleia nesta tarde para fazer sua defesa presenciamente. No entanto, ele desistiu quando parte de sua equipe já estava no Plenário da Casa. Ele fez sua sustentação oral por meio de videoconferência da residência oficial, o Palácio Laranjeiras, na zona sul do Rio.
Witzel já está afastado do governo desde 28 de agosto, quando foi denunciado por esquemas de corrupção e desvio de recursos destinados à Saúde do estado.
Tribunal Misto
A partir de agora, começa uma nova fase do processo: a do Tribunal Misto, formado por cinco deputados estaduais, que serão escolhidos pela Alerj; cinco desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), escolhidos por sorteio; e o presidente do TJ-RJ, Cláudio de Mello Tavares, que presidirá o colegiado e tem direito a voto de minerva.
A indicação dos deputados estaduais que farão parte do Tribunal Misto acontecerá na próxima terça-feira, por meio de eleição. Cada parlamentar votará em cinco candidatos, e depois os votos serão somados. Os cinco primeiros serão indicados pela Mesa Diretora ao órgão. O Tribunal de Justiça ainda não anunciou como fará o sorteio de seus representantes.
Já há movimentação entre os deputados estaduais para disputar as cinco vagas a que a Alerj tem direito no Tribunal Misto.
A CNN apurou que já há oito nomes na disputa e cinco favoritos. O presidente da Comissão Especial do Impeachment, Chico Machado (PSD) é um deles, além de Dani Monteiro (PSOL), Alexandre Freitas (Novo), Anderson Moraes (PSL) e Waldeck Carneiro (PT) são os nomes que despontam nesse momento.
O órgão definirá um relator, que dará dez dias de prazo para apresentação da defesa, para votar se aceita a denúncia. Essa comissão terá 120 dias para decidir se recebem ou não a denúncia contra o governador. Nesta nova fase, serão realizadas as oitivas do processo, ouvindo acusados e testemunhas.
Se a denúncia contra Witzel for recebida, o governador terá imposto contra ele um segundo afastamento, também por 180 dias.
Isso significa que mesmo que ele consiga reverter o afastamento determinado pelo STJ, Wilson Witzel permanecerá afastado do cargo. O governador em exercício é Cláudio Castro (PSC), vice-governador eleito em 2018.
A sessão
O governador afastado falou por 60 minutos, após cinco horas de sessão, quando ouviu 28 deputados. Em seu discurso, criticou o processo, por não tê-lo permitido falar antes, fosse na Alerj ou em âmbito judicial, e defendeu a tese que teve seu direito de defesa cerceado. Ele lembrou o nome do Palácio Tiradentes, sede do Legislativo fluminense, onde acontecia a sessão, e comparou a injustiça sofrida pelo inconfidente mineiro àquela que ele próprio julga enfrentar.
Witzel lembrou que é filho de uma empregada doméstica, negou ter apoiado à extrema-direita, lembrou as origens de outros deputados, fez e respondeu críticas nominalmente aos deputados, em relação aos discursos que escutou durante o fim da tarde e o início da noite. E dividiu com a Alerj a responsabilidade pelos erros e problemas de seu governo, seja por falta de diálogo ou de fiscalização.
Em um discurso pródigo em citações, Witzel fez referências ao Sermão da Montanha, da Bíblia, ao sofrimento de Jesus Cristo, citou teóricos da Ciência Política e, mais uma vez, a obra Como as democracias morrem, sucesso de Steven Levitsky que ganhou caráter pop no âmbito da esquerda.
Ele já tinha citado o livro por ocasião da Operação Placebo, quando a Polícia Federal fez buscas no Palácio Guanabara.
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“Muitos deputados já anteciparam o voto. Fizeram dessa não uma tribuna de julgamento, mas um palanque eleitoral. A sorte dos representantes do povo ficará à sorte das idiossincrasias. Ficará a cargo daquilo que os representantes do Ministério Público definem, de forma unilateral. Deputados já foram presos. Presos e sequer foram ouvidos. Aqui estou eu agora, alvejado pela mesma hipertrofia de órgãos que deveria respeitar e zelar pelo voto popular”, afirmou o governador afastado.
Em um tom duro, chamou o ex-secretário estadual de Saúde, Edmar Santos, de bandido e ladrão, rechaçou a acusação de não ter conversado com os parlamentares, por causa da frequente acusação de não ser aberto ao diálogo. “Quantos dos senhores e das senhoras foram a Palácio Guanabara e se sentaram para conversar comigo para discutir o governo? Poucos estiveram lá. Se eu sou omisso, todos os senhores e as senhoras são omissos”.
Acusação
Autor do pedido, ao lado da deputada Lucinha (PSDB), o deputado Luiz Paulo (PSDB) destacou durante a sessão que o documento reproduz páginas inteiras da decisão do ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que deflagrou a Operação Placebo.
“O relatório do deputado Rodrigo Bacellar, nas últimas páginas, diz que não há dúvidas que o processo de impeachment deve prosseguir, estando presentes todos os elementos necessários para a configuração de crime de responsabilidade. Este governador tem que ser afastado, a bem da moralidade, do serviço público, em respeito à população fluminense. Principalmente, porque é imperdoável, em tempos de pandemia, alguém assaltar os cofres da saúde. Em tempos de pandemia, corrupção é crime hediondo”, disse Luiz Paulo, durante o encaminhamento do voto.
Coautora do pedido, Lucinha também criticou a requalificação da Organização Social Unir Saúde, que estava inabilitada para celebrar contratos com o governo do estado, mas teve sua situação revertida por meio de uma assinatura do governador e as sucessivas denúncias de fraude na saúde durante a pandemia de Covid-19.
“Uma OS que tinha sido desqualificada por prestar um péssimo serviço em nove UPAs. Quando ouvimos os depoimentos (na Comissão do Covid), vimos que era uma OS montada para corrupção. Nós pudemos ver de perto a máfia que se instalou na Secretaria de Saúde. A Unir foi o ponto final do juiz sem juízo. Ela não atendia ninguém. Mas o governador requalificou, porque tinha interesses. Contrariou oito pareceres. Isso tem nome: Mário Peixoto, dono da Unir e de outras OSs que tem por aí, e que está preso”, afirmou Lucinha.
Durante a sessão, os deputados apresentaram argumentos diversos para demonstrar apoio ao relatório, de 77 páginas, do deputado Rodrigo Bacellar (Solidariedade), que já tinha sido aprovado por 24 a 0 na quinta-feira passada, na Comissão Especial do Impeachment.
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Foi lembrada a requalificação da Organização Social Unir Saúde, que estava inabilitada para celebrar contratos com o governo do estado, mas teve sua situação revertida por meio de uma assinatura do governador e as sucessivas denúncias de fraude na saúde durante a pandemia de Covid-19.
Também foi criticada a política de segurança de seu governo e a ruptura com o presidente Jair Bolsonaro, ao anunciar suas pretensões de concorrer à presidência da República.
Durante toda a sessão, os parlamentares citaram ainda os contatos do escritório de advocacia da primeira-dama, Helena Witzel, com empresas ligadas ao empresário Mário Peixoto, e a suspeita de que servissem para lavagem de dinheiro por serviços não prestados.
Também foi lembrada a mudança no regime de casamento de Wilson e Helena, que passou para comunhão universal de bens, transformando os dois patrimônios em um só. Tudo isto está no inquérito em curso, avaliado pelo STJ, na investigação que começou apurando as irregularidades nos gastos da Saúde.