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    “Ainda Estou Aqui”: quem foi Rubens Paiva, ex-deputado tema de filme e morto na ditadura

    Ex-parlamentar foi um dos primeiros políticos cassados no golpe militar de 1964

    Beatriz Alvesda CNN* , São Paulo

    “Ainda Estou Aqui”, filme dirigido por Walter Salles que estreou nos cinemas nessa quinta-feira (7), é uma adaptação do livro autobiográfico de Marcelo Rubens Paiva sobre o próprio pai, Rubens Paiva, deputado federal que foi preso e morto durante a ditadura militar em 1971, no Rio de Janeiro.

    Na trama, a mãe do autor, Eunice Paiva, precisa mudar a rotina completamente depois que o marido é exilado. A dona de casa se vê obrigada a virar ativista de direitos humanos após o desaparecimento de Rubens Paiva. A produção, protagonizada por Selton Mello e Fernanda Torres, foi escolhida por unanimidade para representar o Brasil no Oscar do próximo ano.

    Quem foi Rubens Paiva?

    Rubens Beyrodt Paiva nasceu em 1929, na cidade de Santos, litoral de São Paulo. Formado em engenharia civil pela Universidade Presbiterana Mackenzie em 1953, foi vice-presidente da União Estadual dos Estudantes em São Paulo e eleito deputado federal em 1962 pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

    Casado com Eunice Facciolla Paiva, era pai de cinco filhos: Vera, Maria Eliana, Ana Lúcia, Marcelo e Maria Beatriz.

    Eunice e Rubens Paiva • Reprodução/Instituto Vladimir Herzog

    Durante o período na Câmara dos Deputados, ele se destacou como vice-presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD), que investigavam o financiamento de grupos que conspiravam, à época, contra o governo de João Goulart, então presidente da República.

    Por isso, o ex-deputado foi incluído na lista dos primeiros políticos cassados no golpe militar, por meio do primeiro Ato Institucional, de 9 de abril de 1964.

    Alguns dias antes, em 1° de abril daquele mesmo ano, Paiva fez um apelo ao vivo, na Rádio Nacional, em defesa da legalidade da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo e do presidente Goulart.

    No discurso, em pouco mais de quatro minutos, ele criticou a postura do governador de São Paulo no período, Adhemar de Barros (que apoiou o golpe militar), a quem chamou de fascista e golpista. Paiva defendeu as reformas de base propostas por João Goulart e rebateu as críticas usadas como justificativa para o golpe.

    Leia o discurso na íntegra:

    “Desejo conclamar a todos os trabalhadores de São Paulo, todos os trabalhadores portuários e metalúrgicos da Baixada Santista, de Santos, da capital e das cidades industriais, de São Paulo e todos os universitários que se unam em torno dos seus órgãos representativos, obedecendo a palavra de ordem dos seus comandos… para que todos, em greve geral, deem sua solidariedade integral à legalidade que ora representa o presidente João Goulart. O que se diz, que o governo pretende acabar com os direitos de propriedade, estabelecer o confisco de tudo o que existe como propriedade privada, é uma grande farsa. O que se pretende realmente, trabalhadores e estudantes de São Paulo, é tornar este governo incompatibilizado com a opinião pública sobre uma onda de mentiras e uma imagem deformada. O presidente João Goulart, em suas reformas, visa a tão somente dar, ao povo brasileiro, uma participação na riqueza deste país. É indispensável que se processe, de uma vez por todas, a divisão da riqueza brasileira por todos os seus habitantes. É indispensável que o presidente e o governo contem com toda a mobilização da opinião pública, todos os trabalhadores, todos os estudantes, os intelectuais e o povo em geral para que, pacífica e ordeiramente, digam um não e um basta a esses golpistas que pretendem, cada vez mais, prestigiar uma pequena minoria privilegiada”.

    Prisão e morte

    Com o mandato cassado, ele, inicialmente, se exilou na Embaixada da Iugoslávia, em junho de 1964, e deixou o Brasil, partindo para a França e, depois, para a Inglaterra. Retornou ao Brasil no início de 1965, ficando com família inicialmente em São Paulo, e, em seguida, no Rio de Janeiro.

    No entanto, Rubens Paiva foi preso na madrugada de 20 de janeiro de 1971, depois que cartas de militantes políticos exilados no Chile foram encontradas. Tendo em vista que ele era um dos destinatários das correspondências, militares – armados com metralhadoras – invadiram a casa do deputado cassado. Rubens Paiva foi levado, no próprio carro, para prestar depoimento e, desde aquele dia, começou a ser torturado.

    No dia seguinte, Eunice Paiva e a filha Eliane, então com 15 anos, também foram presas. Apesar da confirmação dos agentes de que Rubens Paiva estava detido no Departamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), elas nunca mais o viram. Após diversas sessões de interrogatório, Eliane acabou liberada no dia seguinte, enquanto a mãe ficou presa por doze dias.

    O corpo de Rubens Paiva nunca foi encontrado. Na versão oficial do Exército sobre a morte, ele teria sido sequestrado por militantes enquanto era transferido pelos oficiais e dado como desaparecido.

    Em 2012, a Comissão Nacional da Verdade (CNV), instituída em 2012 pela ex-presidente Dilma Rousseff, apresentou documentos e depoimentos que atestaram a entrada de Rubens Paiva no DOI-CODI, em 20 de janeiro de 1971, provando que o político foi torturado e morreu devido a gravidade dos ferimentos.

    Apenas em 1996, o estado brasileiro oficializou a inclusão do ex-parlamentar na lista de desaparecidos em razão de atividades políticas no regime, e a família recebeu uma certidão de óbito, ao longo do governo de Fernando Henrique Cardoso, que sancionou a Lei dos Desaparecidos Políticos, reconhecendo como mortos aqueles que “sumiram” durante a ditadura.

    Em 2014, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou cinco militares pelo crime, com acusações que incluíam homicídio, ocultação de cadáver, associação criminosa e fraude processual.

    Uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) paralisou o caso, já que os acusados alegavam que os crimes estão abrangidos pela Lei da Anistia, de 1979. A decisão foi proferida por Teori Zavascki, que faleceu em 2017.

    Com a morte de Zavascki, a ação chegou a ser arquivada no STF e, em fevereiro de 2018, foi encaminhada para o ministro Alexandre de Moraes. Desde então, o caso está sem movimentação.

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    *Sob supervisão de Ronald Johnston

     

     

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