A trajetória de Ricardo Salles e as controvérsias na gestão do Meio Ambiente
Salles comanda o ministério desde o início do governo Bolsonaro e acumula declarações polêmicas
Dos 23 ministérios do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), menos da metade (10) continuam tendo à frente o mesmo ministro que estava na data da posse, em 1º de janeiro de 2019. Uma dessas pastas é a do Meio Ambiente, dirigida desde o primeiro momento pelo advogado Ricardo de Aquino Salles, que nesta quarta-feira (19), junto do presidente do Ibama, Eduardo Bim, foi alvo de operação da Polícia Federal que investiga exportação ilegal de madeira para Estados Unidos e Europa.
Salles, que havia começado sua carreira política como secretário do Governo de São Paulo, foi indicado para o cargo federal em dezembro de 2018, depois de o presidente Jair Bolsonaro desistir da ideia de incorporar o Ministério do Meio Ambiente a uma outra pasta. Ele chegou ao cargo com pendências na bagagem, criticado por ex-ministros da pasta e pelas principais ONGs ambientais, como Greenpeace e Observatório do Clima.
Início da carreira política e secretaria em São Paulo
Salles concorreu sem sucesso à Assembleia paulista em 2006 e 2010. Mas, em 2013, ganhou o seu o primeiro cargo, no gabinete de Geraldo Alckmin, então governador de São Paulo. Salles era secretário particular do tucano.
Antes de chegar ao Palácio dos Bandeirantes, o advogado começou a sua relação com a política com um grupo batizado de Movimento Endireita Brasil. Pelo grupo, Salles chegou a coassinar, em 2012, um pedido de impeachment do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli, que acabou não prosperando.
Em 2016, ele retornou ao governo paulista para assumir a secretaria do Meio Ambiente. Durante a gestão, foi denunciado pelo Ministério Público, acusado de fraude no processo de plano de manejo da Área de Proteção Ambiental da várzea do rio Tietê para favorecer empresas. O hoje ministro chegou a ser condenado na primeira instância, mas em março deste ano o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) o absolveu na segunda instância.
Em 2018, ele se lançou candidato a deputado federal de São Paulo pelo Partido Novo, com uma campanha em que associou o uso de munição contra “a praga de javalis”, “o roubo de gado, trator e insumos”, a “bandidagem no campo” e “contra a esquerda e o MST”. Ele recebeu 36 mil votos e não conseguiu se eleger. No ano passado, o ministro foi expulso do Novo.
Controvérsias no Ministério
Nos primeiros meses de governo, Salles tentou mudar as regras do Fundo Amazônia, projeto bilionário que era financiado, em parte, pela Alemanha e Noruega, para a preservação do bioma. Ele anunciou que os recursos poderiam ser usados para indenizar proprietários de terras e que havia indícios de irregularidades nos contratos com ONGs, sem apresentar provas.
Após as afirmações, os governos dos países europeus suspenderam os repasses. Desde então, o Fundo está paralisado.
Em abril de 2020, Salles afirmou que o governo federal deveria aproveitar que “a imprensa está focada na cobertura da pandemia de coronavírus” para “ir passando a boiada e simplificando normas”. A declaração aconteceu durante uma reunião do presidente da República com todos os ministros de Estado.
Precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De Iphan, ministério da Agricultura, ministério do Meio Ambiente, de ministério disso, ministério daquilo. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação. É de regulatório que nós precisamos, em todos os aspectos.
Ricardo Salles
A Polícia Federal abriu uma investigação para apurar a fala, que foi arquivada em setembro pelo procurador-geral Augusto Aras, que considerou que o ministro apenas externou uma opinião. Nesta quarta, a PF pediu a reabertura da apuração.
A declaração gerou reação do Fórum de Ex-Ministros do Meio Ambiente do Brasil, composto por nove ex-titulares da pasta, como Carlos Minc, Marina Silva e Rubens Ricupero. No documento, eles classificam Salles como anticientífico.
Naquele ano, o Pantanal teve o maior número de queimadas desde que o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) começou o monitoramento. A Amazônia também teve o maior índice de desmatamento em 12 anos. Até outubro de 2020, pasta havia gastado apenas 0,4% do Orçamento autorizado. Além disso, nenhuma multa ambiental foi cobrada.
Em setembro de 2020, a Justiça precisou interferir em ações de órgãos ligados ao Ministério do Meio Ambiente para evitar que áreas de preservação ambiental passassem a ser exploradas sem prejuízo aos infratores.
Naquele mesmo mês, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), presidido por Salles, aprovou a extinção de duas resoluções que delimitavam as áreas de proteção permanente (APPs) de manguezais e de restingas do litoral brasileiro.
Em abril deste ano, a PF do Amazonas enviou ao STF uma notícia-crime contra Salles, após o ministro ter feito declarações contrárias a uma operação que apreendeu 200 mil metros cúbicos de madeira extraída ilegalmente da Amazônia.
O extrativismo ilegal também motivou a operação da PF nesta quarta (19), que apura um suposto “desvio de conduta de servidores públicos brasileiros no processo de exportação de madeira”. O STF autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Salles, o afastamento preventivo do presidente do Ibama, Eduardo Bim, e de outros nove servidores do Instituto e da pasta do Meio Ambiente.
(*Com informações de Weslley Galzo, da CNN em São Paulo, e do Estadão Conteúdo)