A economia parece melhorar, mas e o ano que vem?
Comemorar os resultados desse ano é válido, mas não se pode esquecer como ele está sendo construído e o preço que pagaremos a partir de 2023
O Banco Central sinalizou uma retomada mais forte da atividade nos meses de abril e maio e o mercado começou a trabalhar com números mais fortes para o PIB deste ano. Para um crescimento que se esperava em torno de zero os números estão caminhando para algo entre 1,5% e 2,05%. Abril e maio, especificamente, apresentaram alta de quase 3% na comparação com o ano passado, alimentando essa onda de expectativa positiva para o resto do ano.
Mas a dúvida que fica é se isso é sustentável até o final do ano ou não. O segundo semestre apresenta riscos crescentes domésticos e externos. No front interno, a eleição será no mínimo conturbada e isso pode piorar a percepção de risco ainda mais para a economia. Além disso, a Selic deve chegar a 13,75% em agosto e os serviços terão chegado ao pico de crescimento pós-pandemia. No exterior, o risco ainda se localiza na elevação de juros nos EUA, que deve se acelerar até o final do ano.
O lado positivo, entretanto, é que o PIB cresceu esse patamar nos meses seguintes ao início da guerra da Ucrânia, o que mostra resiliência da economia doméstica. Os indicadores de confiança de junho apresentaram números bastante positivos e generalizados. Ao mesmo tempo, há alguns bons sinais para crescimento no segundo semestre. As safras agrícolas, aqui e no exterior, estão indo bem e com a normalização dos fertilizantes, é provável que tenhamos um aumento importante de produção da agropecuária.
Ao mesmo tempo, os preços estão cedendo, em parte pelas boas safras, mas especialmente pelo cenário recessivo que ajuda a diminuir os preços de commodities no exterior. Sendo isto verdade, é provável que a inflação de alimentos possa ajudar até mais do que os combustíveis nos próximos meses, trazendo um cenário de inflação mais acomodada, se aproximando de 8%.
Além disso, o mercado de trabalho segue forte, com a taxa de desemprego em queda expressiva nos últimos meses, já chegando abaixo de 10%, algo que não se esperava fosse ser alcançado tão rapidamente. Por fim, o pacote de bondades pode trazer algum efeito marginal no crescimento ajudando no consumo até o final do ano.
São muitas variáveis a observar, mas o balanço de riscos e o timing de evolução da economia parecem sugerir que o pior poderá vir depois da eleição, com o governo Bolsonaro angariando alguns bons números para mostrar. No início de outubro, quando se dará a eleição, teremos alguns dados consolidados de agosto, mês que poderá trazer bons números de desemprego e inflação.
O famigerado índice de miséria, que mede a soma da taxa de desemprego e da taxa de inflação, poderá estar em nível bem mais baixo do que se imaginava até alguns meses atrás. Em termos da campanha presidencial, os resultados podem ser dúbios, pois os números ainda serão muito elevados, mas com indicadores na margem favoráveis, como deve ser a inflação de julho, que deve apresentar queda.
O esforço que o governo está fazendo agora cobrará um preço mais à frente para quem virar presidente. O governo Bolsonaro parece atuar no fiscal sabendo que não estará lá no ano que vem. A consequência disso é que até podemos ter números melhores este ano, mas cada vez mais às custas de resultados piores ano que vem.
O PIB deve crescer no máximo 0,5%, e a inflação já se encaminha para ficar entre 5 e 6%, com o rombo fiscal aumentando o déficit público esperado para o ano que vem para cima de R$ 100 bilhões e a dívida pública bruta voltando para os 84%. Assim, comemorar os resultados desse ano é válido, mas não se pode esquecer como ele está sendo construído e o preço que pagaremos a partir do ano que vem.