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    Reino Unido pode retroceder à era vitoriana em termos de desigualdade, alerta estudo

    Época do século XIX é marcada por um abismo crescente entre a classe dominante e a mais pobre

    Hanna Ziady , Londres

    As pessoas mais desfavorecidas do Reino Unido não estão em melhor situação do que estavam há 15 anos, de acordo com um novo relatório, que revela um “abismo enorme entre aqueles que conseguem sobreviver e aqueles que estão na base”.

    A conclusão sobre a desigualdade em uma das economias mais ricas do mundo vem do Center for Social Justice (centro de justiça social, na tradução livre do inglês), um laboratório de ideias independente cujo trabalho anterior levou à reforma do sistema de bem-estar da Grã-Bretanha e à introdução do Universal Credit, um pagamento mensal do governo para pessoas de baixa renda.

    O relatório de 300 páginas é a mais recente evidência de como a estagnação econômica do Reino Unido tornou muito mais difícil o combate à pobreza, com uma crise de custo de vida evidenciando as dificuldades enfrentadas pelos menos favorecidos da sociedade.

    “Descobrimos uma nação com duas metades”, disse Sophia Worringer, vice-diretora de políticas do Centre for Social Justice, nesta segunda-feira (11), em um evento de lançamento do relatório.

    “O público, em geral, em sua maior parte, consegue sobreviver, e há esse grupo de pessoas cujas vidas são marcadas por desestruturação familiar, doenças físicas e mentais, que vivem em comunidades dominadas pelo crime e enfrentam várias barreiras ao trabalho”.

    A organização adverte que o Reino Unido corre o risco de “voltar à nação dividida da era vitoriana, marcadas por um abismo crescente entre a sociedade dominante e uma subclasse atingida pela pobreza”.

    A era vitoriana, que abrangeu a segunda metade do século XIX, foi uma época de extrema desigualdade social. A classe trabalhadora enfrentava condições de vida brutais, com pouco acesso à água potável, alimentos e saneamento, e com pouquíssimas oportunidades de melhoria de vida.

    O relatório conclui que a pobreza está se tornando igualmente “enraizada” na Grã-Bretanha moderna e argumenta que a falta de dinheiro é apenas um dos vários fatores de desvantagem.

    A desestruturação familiar, o vício, a falta de emprego, as dívidas pessoais graves e o fracasso educacional são citados como outras causas importantes.

    O estudo baseia-se em uma pesquisa com 6.000 pessoas, mais da metade delas das comunidades mais pobres. Os pesquisadores também consultaram mais de 350 pequenas instituições de caridade, empresas sociais e especialistas, viajando para mais de 20 cidades do Reino Unido.

    “Para muitos, a Grã-Bretanha está quebrada e a diferença entre os que têm e os que não têm corre o risco de se tornar um abismo”, diz o prefácio do relatório, assinado por Mervyn King, ex-governador do Banco da Inglaterra, entre outros.

    O relatório conclui que os salários semanais médios na Grã-Bretanha estagnaram desde a crise financeira de 2008, quando ajustados pela inflação.

    Os salários na extremidade inferior permanecem baixos: em setembro, 38% das pessoas que reivindicam o Universal Credit também estão trabalhando, o que significa que seus ganhos não são suficientes para sobreviver.

    O trabalho geralmente é inseguro e de má qualidade para esses indivíduos, disse Worringer.

    “A instabilidade do trabalho disponível quando comparada à estabilidade dos benefícios faz com que o salto para o trabalho simplesmente não valha a pena para alguns.”

    Bloqueios da pandemia “catastróficos”

    O relatório também demonstra que os lockdowns da pandemia escancararam os principais fatores de pobreza e tiveram um “efeito catastrófico no tecido social da nação”.

    Durante os lockdowns, as chamadas para as linhas telefônicas de ajuda para abuso doméstico aumentaram 700%; os problemas de saúde mental em jovens aumentaram de um em cada nove para um em cada seis; a ausência escolar grave aumentou 134%; e mais 1,2 milhão de pessoas receberam pagamentos de assistência social, conforme o relatório.

    As mortes por intoxicação por álcool, que vinham caindo antes da pandemia, também aumentaram desde o surto em massa da Covid-19.

    “As pessoas que ficaram para trás ainda estão se recuperando do impacto da pandemia de Covid-19”, disse Worringer. “A vida para eles nunca voltou ao normal, e as cicatrizes daquela época ainda são profundamente sentidas.”

    Se as tendências atuais continuarem, mais de 25% das crianças entre 5 e 15 anos terão um transtorno de saúde mental até 2030. Se a pandemia e os lockdowns associados nunca tivessem acontecido, essa parcela seria inferior a um quinto, segundo o relatório.

    Os autores do relatório apresentarão “um conjunto ambicioso de recomendações de políticas” a partir de setembro de 2024 para combater “as causas fundamentais da pobreza”, disse Worringer. Sem uma estratégia para isso, “nosso futuro parece muito ruim”, acrescentou.

    Separadamente, um relatório publicado na semana passada pela Resolution Foundation, um think tank, constatou que a desigualdade de renda é maior na Grã-Bretanha do que em qualquer outro grande país europeu.

    O relatório disse que uma “combinação tóxica de crescimento lento e alta desigualdade estava prejudicando os padrões de vida da Grã-Bretanha de baixa e média renda bem antes da crise do custo de vida”.

    Esse relatório constatou que os salários ajustados pela inflação haviam se estabilizado desde 2007, custando ao trabalhador médio £10.700 (cerca de R$ 56.852) por ano em perda de crescimento salarial.

    Veja também: BC da Argentina anuncia restrição à compra de dólares

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