Vídeo reúne informações equivocadas para criticar BNDES no exterior
É enganoso vídeo que cita 20 operações que supostamente teriam sido financiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) entre os anos de 2009 e 2014 (durante os governos petistas dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff)
Enganoso: É enganoso vídeo que cita 20 operações que supostamente teriam sido financiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) entre os anos de 2009 e 2014 (durante os governos petistas dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff). A peça apresenta informações falsas referentes aos valores financiados, além de atribuir ao banco sete construções que não tiveram acesso a recursos de linhas de crédito do BNDES.
Conteúdo investigado: Vídeo publicado no TikTok lista obras de infraestrutura e operações supostamente financiadas pelo BNDES em países da América do Sul e Central, além da África. O vídeo começa com o narrador falando “Enquanto o Nordeste sofria com a sede e com a fome, Lula e sua quadrilha fazia (sic)”. Na sequência, a postagem traz, como imagens de fundo, fotos de obras de infraestrutura acompanhadas de legendas com os supostos valores que teriam sido desembolsados pelo banco brasileiro durante as gestões petistas dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff.
Onde foi publicado: TikTok.
Conclusão do Comprova: É enganoso vídeo publicado no TikTok que apresenta 20 obras milionárias financiadas pelo BNDES entre os anos de 2009 e 2014 (fim do segundo mandato do ex-presidente Lula e primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, ambos do PT).
O BNDES realizou, entre 1998 e 2017, “financiamentos à exportação dos bens e serviços de engenharia brasileiros”, que consistem no financiamento (feito em reais e no Brasil) a empresas brasileiras para executarem serviços no exterior. Ou seja, as operações envolvem três partes: o governo brasileiro, por meio do BNDES; a empresa brasileira contratada para fazer a obra e o país estrangeiro que irá receber as obras. Os empréstimos fornecidos pelo BNDES às empresas brasileiras são posteriormente pagos, de maneira parcelada, pelos países estrangeiros que receberam as obras. O pagamento é feito com uma taxa de juros anual definida por um acordo entre o Governo Federal brasileiro e a nação que receberá os empreendimentos.
Contudo, dentre as 20 obras apresentadas, o vídeo lista sete construções que não foram contempladas por linhas de financiamento do banco. Outras 11 realmente receberam financiamento, das quais sete já foram inteiramente quitadas e quatro ainda estão sendo pagas. O vídeo ainda faz menção a outros dois empréstimos do banco, mas que não são obras, e sim linhas de financiamento para países estrangeiros adquirirem bens, como aeronaves e ônibus.
Em todos os casos, o valor atribuído pelo vídeo a cada item citado não corresponde ao montante que foi desembolsado pelo banco. Além disso, algumas das obras citadas no vídeo são de contratos firmados pelo BNDES no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que antecedeu os mandatos petistas.
Todos os valores citados nesta verificação foram mantidos em dólar, moeda que o BNDES formaliza seus acordos para exportação de bens e serviços, e são referentes à data de acordo com os países estrangeiros, ou seja, sem atualização por índices de inflação até hoje.
Para o Comprova, enganoso é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos de maior alcance nas redes sociais. Até o dia 6 de setembro, o vídeo teve 59,8 mil visualizações, 5,3 mil curtidas, 478 comentários e 5 mil compartilhamentos.
O que diz o autor da publicação: O TikTok não permite o envio de mensagens entre contas que não se seguem mutuamente. O Comprova tentou fazer contato com Eduardo por meio de outras redes sociais, mas não houve retorno até o fechamento desta verificação.
Como verificamos: O Comprova iniciou a verificação fazendo buscas no Google pelos termos “BNDES”, “financiamento”, “obras” e “exterior”. O resultado levou a checagens e matérias de jornais brasileiros com um balanço de obras financiadas por meio do programa de exportação dos bens e serviços de engenharia nacionais, como as do Estadão Verifica, da Agência Lupa e do próprio Comprova.
A busca pelos mesmos termos também levou à página de transparência do próprio BNDES. Nessa área do site é possível ter acesso aos contratos das operações financeiras, valores desembolsados, quantias que já foram pagas pelos países que tiveram obras financiadas e o saldo devedor e parcelas em atraso por país.
Por e-mail, o banco foi consultado para esclarecer e confirmar informações sobre financiamentos.
Sete obras nunca tiveram financiamento do BNDES
O vídeo aqui analisado cita 20 operações em países estrangeiros que teriam recebido financiamento do BNDES, porém, sete desses empreendimentos jamais tiveram despesas pagas por empréstimos do banco. São elas: Metrô na Cidade do Panamá e a rodovia (que no vídeo é chamada de “autopista”) Madden-Colón, no Panamá; o Soterramento Ferrocarril, na Argentina; a instalação do BRT de Maputo, em Moçambique; a Hidrelétrica de Tumarín, na Nicarágua; a ponte sobre o rio Orinoco, na Venezuela; e a rodovia Hacia El-Norte, na Bolívia.
De acordo com o portal de transparência do BNDES, o Panamá não possui nenhuma obra que já tenha recebido financiamento do banco. De acordo com reportagens do El País e do UOL, as construções das linhas 1 e 2 do metrô da Cidade do Panamá foram realizadas por um consórcio que tinha, entre as empresas participantes, a construtora brasileira Odebrecht. No entanto, a obra não foi financiada pelo banco.
A construção da Autopista Madden-Colón, que liga a Cidade do Panamá ao município de Colón, também teve participação da Odebrecht, conforme consta em um dos relatórios anuais da empresa. Publicações de 2006 do jornal O Globo e da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) noticiaram que a obra chegou a ter financiamento aprovado dentro do BNDES. A informação, contudo, diverge do que a assessoria de imprensa do banco afirmou ao Comprova, que apenas as obras listadas em seu portal de transparência tiveram financiamento do banco.
O soterramento Ferrocarril, na Argentina (que consiste em transformar linhas de trens sobre o solo, que cortam as ruas de Buenos Aires, em linhas subterrâneas), também não consta na lista de empreendimentos financiados pelo banco público brasileiro. Entre as empresas que formaram o consórcio para a realização da obra estava a Odebrecht, o que, novamente, não determina que tenha havido repasse de recursos públicos para o empreendimento. Em 2017, em meio às denúncias de corrupção da Operação Lava Jato, a empreiteira brasileira deixou de fazer parte do projeto, que até hoje não foi finalizado.
A situação é parecida com a construção do BRT (ônibus de alta velocidade) em Maputo, capital de Moçambique, outra obra que não consta nos financiamentos do BNDES a países estrangeiros. A Odebrecht também chegou a participar do início do projeto, no entanto, após denúncias de corrupção da operação Lava Jato, o acordo com a empreiteira brasileira para a construção do BRT foi cancelado.
A construção da hidrelétrica Tumarín, na Nicarágua, também não recebeu nenhum financiamento do BNDES, de acordo com o portal de transparência do órgão. Conforme demonstrou checagem da Agência Lupa, no início do projeto, em 2014, houve participação da Empresa Brasileira de Energia Elétrica (Eletrobras) e da construtora brasileira Queiroz Galvão. Em maio de 2016, porém, o Tribunal de Contas da União (TCU) suspendeu os repasses de recursos da Eletrobras, que à época ainda era estatal, para a hidrelétrica, por conta de irregularidades encontradas pela Corte no acordo inicial. Em comunicado de julho de 2016, a Eletrobras informou a venda de todas as suas ações no empreendimento e afirmou que o investimento da empresa na hidrelétrica, até o primeiro trimestre de 2016, “era de R$ 87,8 milhões, existindo, porém, provisão para perdas do referido investimento na totalidade do valor investido”. O Comprova fez contato com a assessoria de imprensa da Eletrobras, para verificar a situação de eventual reembolso de dinheiro público investido pela estatal na obra, mas não houve retorno.
Em 2012, o site G1 chegou a noticiar que a obra na Nicarágua receberia financiamento de US$ 342 milhões do BNDES. A obra, no entanto, também não aparece na lista disponível do portal do BNDES.
A construção de rodovias no chamado projeto “Hacia El Norte”, ligando as cidades de Rurrenabaque e El-Chorro, na Bolívia, é outra obra citada no vídeo que também não consta na lista de financiamentos internacionais do BNDES. O mesmo ocorre com a ponte sobre o rio Orinoco, na Venezuela, ainda que, em 2003, o jornal Folha de São Paulo tenha noticiado a liberação de recursos do BNDES e do Banco do Brasil para a obra. Em 2006, no dia da inauguração da ponte, o próprio ex-presidente Lula disse em seu discurso que a obra contou com recursos do banco, de acordo com o G1.
Novamente, tanto em relação à construção das rodovias na Bolívia quanto à ponte na Venezuela, o BNDES reiterou ao Comprova que empreendimentos que não estão listados em seu portal de transparência não receberam aportes do banco. Em julho de 2015, o BNDES também já havia negado ter financiado a obra na Venezuela. Em checagem recente sobre o tema, o Estadão Verifica mostrou que a ponte sobre o rio Orinoco foi construída pela Odebrecht, que afirmou à publicação ter recebido financiamento do Banco do Brasil, e não do BNDES, para a execução de uma das etapas da obra. Segundo informou a Odebrecht ao Estadão, esse financiamento já está quitado.
Sete obras receberam financiamento do BNDES e já foram quitadas
Das 20 operações citadas no vídeo, sete obras realmente foram financiadas pelo banco, cujos pagamentos já foram quitados, de acordo com a tabela “Operações de exportação pós-embarque – serviços (1998 a 31.07.2022)” disponível na Central de Downloads do site do BNDES.
Foram desembolsados US$ 241,5 milhões pelo BNDES para obras de aproveitamento hidrelétrico na usina de San Francisco, no Equador, porém, a operação foi contratada em abril de 2000, ou seja, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e não no período de gestões do PT, como afirma o vídeo. O valor é ligeiramente menor do que o mencionado no vídeo (US$ 243 milhões). O prazo de pagamento foi de 174 meses, com juros a 7,75% ao ano, e o BNDES classifica a operação como “liquidada”.
O BNDES também desembolsou US$ 289,5 milhões para construção da hidrelétrica de Chaglla, no Peru, após acordo firmado em maio de 2013. O pagamento ocorreu em 217 parcelas, a juros anuais de 4,28%. A operação é outra que consta como “liquidada”. O valor do financiamento desembolsado pelo banco corresponde a apenas 25% do que foi mencionado erroneamente na postagem aqui analisada (US$ 1,2 bilhão).
O financiamento ao metrô de Caracas também contou com repasses do BNDES e foi dividido em três partes, cujo valor total desembolsado foi de US$ 383 milhões. No vídeo, o valor mencionado é US$ 732 milhões.
O primeiro crédito foi de US$ 107,5 milhões, em 2001 (antes do governo do PT), com prazo de 150 meses para pagamento e juros de 5,56% ao ano. Em 2004, um novo desembolso foi feito, desta vez no valor de US$ 78 milhões, com prazo de 102 meses e juros anuais de 6%. Já no terceiro financiamento, o valor efetivamente desembolsado pelo banco foi de US$ 197,7 milhões e, no acordo firmado em novembro de 2009, o pagamento ocorreria em 114 parcelas, a um juro anual de 4,63%. As três etapas de financiamento são indicadas pelo banco como “liquidadas”.
O aeroporto de Nacala, em Moçambique, teve a operação junto ao BNDES dividida em duas partes: a primeira, com desembolso de US$ 79,9 milhões, cujo acordo de abril de 2011 previa pagamento em 180 parcelas a um juro anual de 4,26%. Já a segunda etapa, firmada em setembro de 2013, contou com desembolso de US$ 45 milhões, a serem pagos em 152 parcelas com juros anuais de 3,9%. Ambas as etapas são listadas como “liquidadas”. O valor total desembolsado no financiamento da obra foi de US$ 124,9 milhões, abaixo do que é dito no vídeo — US$ 200 milhões.
O vídeo também menciona uma obra ligada ao “abastecimento de água em Lima, no Peru”, com “valores não informados”. Em agosto de 2010, o BNDES financiou projeto chamado de “Bayovar”, que consistia na dessalinização da água da capital peruana, empreendimento ao qual provavelmente o vídeo se referiu. No site, o banco esclarece que o valor desembolsado na operação foi de US$ 58,1 milhões, com acordo para pagamento em 180 parcelas a juros de 3,36% ao ano. Não há mais saldo devedor, segundo o BNDES.
Outra obra que recebeu financiamento do BNDES, e também já teve pagamento liquidado, se refere à renovação da rede de gasodutos de Montevidéu, no Uruguai, também citada no vídeo, que, no entanto, não faz menção a valores. O empreendimento recebeu financiamento total de US$ 7 milhões entre 2007 e 2009, com prazo de pagamento em 295 meses e taxas de juros anuais que variaram de 2,95% e 4,55%. De acordo com o BNDES, todo o valor foi quitado.
Por fim, a construção da chamada “Via expressa” em Luanda, capital de Angola, é outro financiamento já liquidado, segundo o próprio banco. Entre 2007 e 2011 foram firmados vários acordos de financiamento com o país africano que, somados, perfazem o total de US$ 198,8 milhões. As condições de pagamento foram de juros que variaram de 3,25 a 7,1% ao ano, com prazo máximo de 120 meses para quitação.
Quatro obras receberam financiamento e ainda não foram quitadas
O financiamento do BNDES para a construção do porto de Mariel, em Cuba, ocorreu em cinco etapas. Todas elas estão indicadas como operações “ativas” pelo banco, ou seja, cuja dívida ainda não foi liquidada. Segundo o BNDES, a soma de todos os valores desembolsados para o porto de Mariel foi de US$ 641,2 milhões, e não US$ 957 milhões, como afirma o vídeo. As etapas de financiamento ocorreram entre fevereiro de 2009 e maio de 2013, e os acordos de pagamento para cada uma delas tiveram taxas de juros anuais que variavam entre 4,34% e 6,91%. A quantidade de parcelas foi a mesma para cada etapa do financiamento: 300.
Em contato com o Comprova, a assessoria de imprensa do BNDES informou que já recebeu o pagamento de US$ 398,6 milhões (incluindo juros) pelo financiamento da obra e que o valor que ainda precisa ser quitado é de US$ 424,9 milhões. A última parcela está prevista para ser paga em junho de 2038.
Em novembro de 2012, o BNDES desembolsou US$ 89,7 milhões para a construção da Usina Hidrelétrica de Manduriacu, no Equador, com prazo de pagamento em 120 meses e juros anuais de 3,27%. O valor total desse financiamento é inferior ao citado de maneira equivocada no vídeo (US$ 124,8 milhões). O BNDES informou que já recebeu US$ 95,6 milhões do governo equatoriano e que o saldo devedor da obra hoje é de US$ 13 milhões. O último pagamento está previsto para novembro de 2022.
A construção do aqueduto de Chaco, na Argentina, é outra obra que recebeu financiamento do BNDES e cujo pagamento ainda não foi quitado. Segundo o banco, o total desembolsado na operação, acordado em outubro de 2011, foi de US$ 118 milhões, valor inferior ao que o vídeo cita (US$ 180 milhões). Ao Comprova, o BNDES afirmou que já recebeu US$ 113,6 milhões do governo argentino e que o valor restante a ser pago referente a obra é de US$ 33,3 milhões, a ser efetuado até julho de 2024.
A barragem de Moamba Maior, em Moçambique, segundo o BNDES, teve o valor de US$ 64 milhões desembolsado pelo banco. A contratação, firmada em julho de 2014, previa pagamento em 180 parcelas, a um juro anual de 6,53% e a operação ainda é dada como “ativa” pela instituição. O valor do financiamento de US$ 64 milhões também é bem menor do que o citado erroneamente na postagem (US$ 350 milhões). Segundo o BNDES, US$ 53,6 milhões já foram pagos e o governo de Moçambique deverá fazer os pagamentos restantes, de US$ 49,4 milhões, até julho de 2029.
Financiamento de aviões e ônibus
O BNDES de fato financiou a compra de ônibus para o governo da Colômbia, como afirma o vídeo. De acordo com checagem do Estadão Verifica, em 2001, o BNDES aprovou um financiamento de US$ 90 milhões para a compra de 454 ônibus da Scania, fabricados no Brasil, e adquiridos pelo governo colombiano. O vídeo aqui analisado menciona a compra de 127 ônibus para a Colômbia. Conforme relatado ao Estadão Verifica, o BNDES justificou a ação à época pela “oportunidade de os fabricantes brasileiros de chassis e carrocerias de ônibus consolidarem posição no mercado sul-americano, além de possibilitar maior exportação de serviços de manutenção e a criação direta e indireta de empregos”. O banco também confirmou ao Estadão que não há mais saldo devedor da Colômbia referente à operação.
A compra de 20 aviões pela Argentina citada no vídeo também contou com financiamento do BNDES. Esses aviões foram construídos pela Embraer e o banco financiou a compra das aeronaves pelo governo argentino a partir de um acordo firmado em 2010. O BNDES informou ao Estadão Verifica que o financiamento das aeronaves aconteceu por meio da linha de crédito chamada “Exim Pós-embarque Bens” e que não há registro de inadimplência. As últimas parcelas do financiamento estão previstas para 2023. O banco não forneceu o valor envolvido na operação ao Estadão por se tratar de “elemento de estratégia comercial dos exportadores”.
As operações de exportação de serviço do BNDES
Em seu site, o BNDES explica como funciona o investimento de recursos do banco em obras no exterior, chamados pela instituição de “financiamentos à exportação dos bens e serviços de engenharia brasileiros”. A prática consiste no desembolso de recursos, em reais e no Brasil, para empresas brasileiras realizarem obras no exterior. “Portanto, quem recebe o dinheiro é a empresa brasileira que vende para fora, e não o país. Mas quem fica com a dívida é o país estrangeiro, porque ele é o responsável por fazer o pagamento, que deve ser feito com juros, em dólar ou euro”, explica o banco.
De acordo com o BNDES, a liberação desses recursos é determinada pelo Governo Federal, que é quem estabelece as operações, os países de destino das exportações e as principais condições contratuais do financiamento e mecanismos de cobertura. É apenas após essas definições que o processo chega ao BNDES. Em caso de inadimplência do devedor, existem algumas estruturas de garantias que podem ser acionadas pelo banco, como o Fundo de Garantia à Exportação (FGE). Conforme já explicou o Estadão Verifica, o FGE funciona como qualquer outra operação de seguro e envolve a cobrança de prêmios do país responsável pelo pagamento do empréstimo, de acordo com o risco de cada operação. As garantias do contrato são discutidas por comitês independentes.
Entre 1998 e 2017, segundo o banco, foram desembolsados cerca de US$ 10,5 bilhões para exportação de bens e serviços para 15 países. De acordo com o BNDES, 88% desse valor ocorreu no período entre 2007 e 2015, ou seja, nos governos de Lula e Dilma Rousseff. Até dezembro de 2021, o pagamento desses empréstimos somavam US$ 12,6 bilhões (o que corresponde a 121% do total desembolsado pelo banco). O valor recebido é referente às dívidas dos países, somado aos respectivos juros.
O BNDES ressalta que os casos de inadimplência no pagamento de alguns financiamentos somavam, até março de 2022, pouco mais de US$ 964 milhões. São pagamentos que deveriam ter sido feitos por três países que receberam os serviços: Venezuela (US$ 639 milhões), Cuba (US$ 202 milhões) e Moçambique (US$ 122 milhões), mas que foram compensados pelo FGE. Assim, o montante de US$ 12,6 bilhões que o banco já recebeu é a soma de todos pagamentos feitos pelos países mais os US$ 964 milhões obtidos junto ao FGE. Além desses valores, o BNDES tem um saldo a receber superior a US$ 1 bilhão, referente a parcelas de financiamentos que ainda estão dentro do prazo para a quitação. Todos esses dados estão demonstrados no gráfico abaixo, também disponível no site do BNDES, e que apresenta os valores em milhões de dólares.
De acordo com informações da área de transparência do BNDES, de pouco mais de US$ 1 bilhão que o banco ainda tem a receber, o país com maior saldo devedor a vencer é Cuba, que tem em aberto uma dívida de US$ 413 milhões. O saldo é referente ao total de US$ 656 milhões desembolsados para obras no país ao longo dos últimos anos. Nessa aba do site, as informações são apresentadas apenas por país devedor, não sendo especificado a quais obras exatamente esses valores correspondem.
A Venezuela aparece em seguida, com o segundo maior saldo devedor, que hoje é de US$ 145 milhões, de um total de US$ 1,507 bilhão emprestados pelo banco. A República Dominicana, embora não tenha nenhuma obra citada no vídeo aqui analisado, é o terceiro país com maior saldo devedor ao BNDES atualmente, de US$ 125 milhões. As informações relativas ao saldo devedor de cada país podem ser consultadas na terceira coluna da tabela abaixo, também disponível no site do BNDES.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. O vídeo verificado traz informações enganosas sobre a política de empréstimos do BNDES, um banco público federal, durante os governos do PT. Conteúdos como este são prejudiciais ao processo democrático, pois podem influenciar a decisão dos eleitores, que têm o direito de escolher o voto com base em fatos verídicos e confiáveis.
Outras checagens sobre o tema: Obras feitas no exterior com financiamento do BNDES são alvos frequentes de desinformação nas redes sociais. Em 2018, o Comprova mostrou que oito de 10 mensagens compartilhadas no WhatsApp sobre financiamentos do banco em obras no exterior usavam informações falsas. No ano seguinte, confirmou que post misturava dados verdadeiros com números incorretos sobre financiamentos do BNDES nos governos do PT e, este ano, mostrou que vídeo engana sobre empréstimos do BNDES no governo Lula.
Em abril de 2022, o Estadão Verifica checou um conteúdo que abordava boa parte das construções mencionadas no vídeo investigado pelo Comprova e concluiu que menos da metade dos 21 projetos citados realmente obtiveram recursos do BNDES.
Investigado por: Piauí, Jornal do Comércio e Plural Curitiba; Verificado por: Metrópoles, CNN Brasil, Correio, O Dia, A Gazeta, Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo, Correio Braziliense, O Popular e Nexo