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    Universidades federais omitem dados sobre denúncias de assédio sexual contra professores

    Universidades afirmam à CNN, em geral, que fornecer informação violaria a LGPD ou que não havia estrutura suficiente para coletar os dados solicitados

    Estudantes em sala de aula da universidade
    Estudantes em sala de aula da universidade Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

    Gabriel Hirabahasida CNN

    Brasília

    Oito das 64 universidades federais procuradas pela CNN para apresentar dados sobre denúncias de assédio sexual ignoraram os pedidos ou enviaram informações que não condiziam com solicitações feitas.

    Essas universidades não apresentaram as informações requisitadas via Lei de Acesso à Informação (LAI). Algumas negaram o pedido desde o primeiro contato (como a Universidade Federal de Santa Catarina) e outras alegaram problemas internos (como a Universidade de Brasília, que alegou que os servidores técnico-administrativos que cuidam desse tipo de apuração estavam em greve).

    As universidades que não apresentaram os dados (ou que os apresentaram de forma de forma diferente da requisitada, o que não permite a análise conjunta com as demais informações) são as seguintes:

    • Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ);
    • Universidade Federal de Alagoas (UFAL);
    • Universidade de Brasília (UnB);
    • Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA);
    • Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC);
    • Universidade Federal de Viçosa (UFV);
    • Universidade Federal do Amapá (Unifap);
    • Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar).

    A CNN entrou em contato com 64 universidades federais de todo o país que possuem canal de pedido de acesso à informação por meio do FalaBR, plataforma criada pela Controladoria-Geral da União para centralizar pedidos via Lei de Acesso à Informação.

    Desde julho de 2022, a CNN vem coletando essas informações sobre os casos de assédio registrados nas universidades. Em junho deste ano, foram feitos novos pedidos para atualizar as informações sobre o número de denúncias apresentadas por estudantes contra professores.

    A CNN também pediu acesso aos relatórios dos processos abertos (mesmo sem informações como nome, endereço e documentos pessoais), o resultado de cada caso e o número de punições em cada instituição.

    VÍDEO – Universidades demitiram 6% dos professores acusados de assédio sexual nos últimos 10 anos

    O que dizem as universidades

    As universidades alegaram, em geral, que fornecer esse tipo de informação violaria a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) ou que não havia estrutura suficiente para coletar os dados solicitados.

    Ao longo da apuração, uma das instituições — a Universidade Federal Fluminense (UFF) — chegou a decretar um sigilo de 100 anos no primeiro pedido feito pela CNN, em julho de 2022. Em junho deste ano, na segunda vez em que o dado foi requisitado, a instituição reviu o sigilo e forneceu os dados.

    Uma das principais universidades do país, a Universidade Federal de Santa Catarina disse não ter meios para consolidar os dados e enviá-los.

    “Informamos que, no atual momento, não há meios para obtenção das informações de forma consolidada, considerando o todo da instituição, como assim solicitado. Destacamos que a UFSC, por meio de um serviço criado dentro da Pró-reitoria de Ações Afirmativas e Equidade, e em conjunto com outros setores como a Ouvidoria, a UFSC está implementando um sistema [de] acolhimento às vítimas de violência que permitirá a coleta de dados desta natureza”, justificou ao negar o pedido de acesso à informação.

    A Universidade Federal do Amapá, por outro lado, alegou que o pedido foi “desproporcional” e exigiria “trabalho adicional de análise, interpretação, consolidação de dados e informações”.

    “Estamos encerrando este recurso devido a impossibilidade de atendimento pleno da solicitação sob o argumento da desproporcionalidade do pedido. De acordo com a Lei de Acesso à Informação, pedido de informação desproporcional, que exija trabalho adicional de análise, interpretação, consolidação de dados e informações, serviço de produção ou tratamento de dados não serão respondidos”, alegou.

    A Universidade Federal de Viçosa expôs outra realidade nas instituições de ensino superior: a falta de atenção e divisão dos dados das denúncias formalizadas. A ouvidoria da UFV apresentou dados gerais de denúncias de assédio sexual (foram 26 de 2017 a 2023), mas disse não ser capaz de quantificar os processos a partir do cargo dos denunciados. Por essa razão, a informação não foi incluída no cálculo geral de denúncias contra docentes.

    “A Ouvidoria não possui dados consolidados referentes aos cargos dos denunciados, portanto, não temos como responder quantas são atribuídas a docentes”, afirmou a UFV.

    Já a Universidade de Brasília justificou, no pedido formulado neste ano, que, por causa de uma greve de servidores técnico-administrativos, não seria possível apresentar os dados conforme requisitados pela CNN. No entanto, no primeiro pedido, em 2022, a UnB já deixou de apresentar os dados solicitados pela reportagem.

    “Informo que a Universidade de Brasília conta com 1.045 unidades, conforme imagem anexa, o que inviabilizaria a rotina da UnB em razão da desproporcionalidade do pedido (…) Ademais, ‘supostos casos de assédio’ remetem à ausência de apuração ou mesmo à apuração em curso, ocasião em que processos já constituídos não poderão ser disponibilizados em atenção ao art. 20 do mesmo Decreto. Por fim, necessário informar que foi deflagrada greve dos servidores técnico-administrativos da Universidade de Brasília, reduzindo de forma expressiva a força de trabalho dos setores”, justificou a UnB, ao negar o pedido de acesso à informação feito pela CNN.

    Em julho de 2022, porém, a universidade apresentou somente dados gerais de denúncias de assédio (tanto sexual quanto moral), sem discriminar os casos a partir do cargo do acusado (o que inviabilizou a inclusão na análise de dados por dois motivos).

    Delta do Parnaíba

    Cerca de um mês e meio após a publicação deste texto, a UFDPar enviou nota, em 12 de setembro, dizendo que, “em casos de assédio, sejam estes de qualquer
    ordem, envolvendo servidores públicos, as denúncias são tratadas institucionalmente dentro dos limites legais”.

    Leia a íntegra da nota da UFDPar

    Face ao exposto em um portal de notícias da cidade de Parnaíba/PI e em matéria veiculada pela página da CNN em 31 de julho de 2023, a Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar) vem a público esclarecer que em casos de assédio, sejam estes de qualquer ordem, envolvendo servidores públicos, as denúncias são tratadas institucionalmente dentro dos limites legais. Desta forma, o fluxo interno de acolhimento e encaminhamento dos casos, define-se: 1. Pela formalização de denúncia, nominal ou anonimamente, via Fala.br à ouvidoria da instituição; 2. Encaminhamento da ouvidoria à Corregedoria para análise de admissibilidade e posterior abertura de sindicância. Após, ou simultaneamente, a Universidade formaliza uma notícia-crime à autoridade policial para possível abertura de inquérito policial. Somente após o término das investigações, no âmbito administrativo, é que se aplica a penalidade prevista na Lei n.º 8.112/1990, art. 127. O jornalista que assina a matéria da CNN, no dia 11/08/2022 formaliza o seu primeiro pedido de acesso à informação, cadastrado sob o NUP 23546.057058/2022-87, no qual solicitava a indicação de casos de denúncia de assédio sexual e importunação sexual que, estritamente, envolvessem professores e servidores. À época, o ouvidor respondeu (comunicação do dia 31/08/2022), informando que na UFDPar, até aquela data, não havia denúncias registradas. Porém, evidenciou que para informações anteriores a 15 de maio de 2020 a instância para obtê-las seria a ouvidoria da Universidade Federal do Piauí. Em continuidade de suas investigações, o jornalista retorna em 07 de junho de 2023 com o mesmo pedido de informação, sob o NUP 23546.047403/2023-55, apesar de se expressar com outras palavras, requerendo: número de docentes acusados, cargos e campus aos quais os professores pertenciam, bem como as providências adotadas pela universidade em cada caso, esclarecendo se os professores/servidores continuavam
    exercendo suas funções. Cabe esclarecer que em resposta ao chamado, o Gestor da e-SIC, no dia 03 de julho, informa ao demandante um link de acesso às informações, as quais se referiam ao conjunto das manifestações registradas até então, constando, no que tange aos casos de denúncia de assédio sexual e importunação sexual, apenas os dois pedidos iniciais do demandante. Não satisfeito, cadastra no dia 10 de julho um recurso em primeira instância, informando que a resposta dada pela instituição não atende, segundo seu juízo, ao solicitado. Desta forma, no dia 17 de julho responde-se ao recurso da seguinte maneira: “segue (em anexo) todas as manifestações registradas no Sistema de Informação ao Cidadão (SIC) até a data do dia 06/07/2023. Caso seja necessária, alguma informação adicional, solicito, por gentileza, encaminhar e-mail para coordplanufdpar@ufpi.edu.br”. Conclui-se, nesse dia, a troca de informações entre a CNN e a UFDPar. Todas as respostas enviadas pela instituição encontram-se respaldadas pela Lei nº 13.709 – Lei Geral de Proteção de Dados e pelo Decreto nº 7.724. Ressalta-se, ainda, que casos de assédio, sejam os que envolvam servidores ou discentes, são tratados pela Universidade Federal do Delta do Parnaíba com a seriedade e sensibilidade requeridas pela legislação vigente e adotadas pela atual gestão. Portanto, diante dos fatos expostos, consideramos a postura adotada pela matéria inadequada e incorreta pois, conforme esclarecido, a UFDPar não omitiu ou ocultou quaisquer informações solicitadas, cuja conduta adotada está de acordo com as leis e diretrizes relacionadas ao acesso de informações.
    Importa frisar que, comprometidos com o combate a todo e qualquer tipo de assédio, está em curso na UFDPar, em fase final, a elaboração de Resolução sobre a Política de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Moral, Sexual e demais crimes contra a dignidade sexual e à violência sexual, para ser encaminhada e apreciada pelo Conselho
    Universitário. Além disso, foi lançado em agosto de 2023, através da Coordenadoria de Comunicação Institucional, a campanha Assédio, NÃO! que visa divulgar os canais de acolhimento às vítimas, bem como os canais de denúncias institucionais e externos, além de disseminar informações sobre os tipos assédio, suas características e consequências. A campanha Assédio, NÃO! alinha-se com o debate empreendido por diversas instituições de ensino superior e outras autarquias para o enfrentamento do assédio, tendo por base a Lei n.º 14.540, de 3 de abril de 2023, que instituiu o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais Crimes contra a Dignidade Sexual e à Violência Sexual no âmbito da administração pública, direta e indireta, federal, estadual, distrital e municipal, acompanhado do parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), assinado no dia 15 de Agosto, que estabelece que “a prática do assédio sexual é conduta gravíssima a ser punida com demissão, penalidade máxima prevista no Estatuto dos Servidores Públicos Federais (Lei nº 8.112/90)”. Assim, reiteramos nosso compromisso, enquanto instituição federal, em cumprir as
    normativas, assegurando a transparência de nossas ações, ao mesmo tempo em que nos colocamos à disposição para os esclarecimentos que se fizerem necessários em
    qualquer tempo.

    Nota da UFF à CNN

    É importante destacar que a universidade, como órgão federal, não possui a autoridade de decretar sigilo em relação a dados sensíveis e é regida pelas leis federais pertinentes. No primeiro contato feito pela CNN, em agosto de 2022, a solicitação foi direcionada para dados pessoais dos envolvidos em casos de assédio sexual e informações sobre o status dos processos. Conforme os decretos e leis vigentes*, essas informações são consideradas sigilosas.Posteriormente, em junho de 2023, ocorreu um novo contato com a CNN, mas a solicitação foi feita de forma diferente, focando em dados estatísticos sobre as infrações, sem a exigência dos nomes dos envolvidos. Nesse contexto, a Ouvidoria, que foi estabelecida em 2012, disponibilizou os dados a partir de 2017, quando passou a utilizar a plataforma fornecida pela CGU (Controladoria-Geral da União), responsável por organizar os processos.Portanto, ressaltamos que a universidade seguiu rigorosamente as leis e diretrizes aplicáveis ao fornecimento de informações, disponibilizando os dados de acordo com o que é permitido pela legislação em cada situação. Estamos comprometidos em garantir a transparência e o cumprimento das normas, bem como em colaborar com a imprensa para esclarecer qualquer equívoco ou dúvida em relação aos nossos procedimentos.