Trajetória da Americanas: do anúncio de fraude até o lucro de R$ 284 milhões no último trimestre
Ex-diretores do grupo varejista são alvos de operação da Polícia Federal no Rio de Janeiro
Dois ex-diretores da Americanas são alvos da Operação Disclosure, deflagrada hoje (27) pela Polícia federal no Rio de Janeiro.
Os agentes investigam a participação desses executivos nas fraudes contábeis divulgadas pela própria empresa em janeiro de 2023.
O grupo investigado, segundo a PF, seria responsável pela maior fraude da história do mercado financeiro do Brasil, que foi estimada em R$ 25,3 bilhões pela varejista.
Do início do ano passado até aqui, a empresa enfrentou processos judiciais, teve sua recuperação judicial homologada pela Justiça e chegou até a ser pauta para uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara dos Deputados.
No primeiro trimestre de 2024, a Americanas anunciou ao mercado um resultado positivo e R$ 284 milhões no período.
Fraude divulgada em 2023
Em janeiro do ano passado, após o fechamento do pregão da Bolsa de Valores, a varejista divulgou que havia identificado inconsistências contábeis em seus balanços corporativos, com um prejuízo estimado em cerca de R$ 20 bilhões que, após auditorias, se tornaria em um rombo de R$ 40 bilhões entre fraudes e lançamentos indevidos.
Naquele 11 de janeiro entrava em colapso a Americanas e mais de 134 mil investidores brasileiros (pessoa física), que começavam ali a enfrentar uma crise sem precedentes.
As ações da varejista despencaram 77,33% no dia seguinte à divulgação do balanço, mesmo com a B3 colocando os papéis em leilão por repetidas vezes, um mecanismo de defesa utilizado para interromper as negociações das ações para impedir uma variação bruta.
Além do prejuízo direto aos investidores, a fraude da Americanas descredibilizou o setor de varejo, que viu os credores fecharem as portas, aumentar critérios para a disponibilização de crédito e dificultar a operação de muitas empresas, de acordo com especialistas do mercado financeiro.
Participação do Ex-CEO
Ainda em setembro de 2023, a Americanas divulgou um comunicado no qual diz ter pelo menos três provas contra o ex-CEO Miguel Gutierrez. São elas:
- Arquivo digitalizado com anotações de próprio punho de Miguel Gutierrez, localizadas em equipamento eletrônico da companhia por ele utilizado, em materiais que apontam a existência de duas versões dos demonstrativos da Americanas, uma de uso interno da antiga diretoria e outra destinada ao Conselho de Administração;
- E-mail enviado por Miguel Gutierrez aos ex-diretores, com orientações para que não fossem levadas, em reunião com Sérgio Rial, respostas a dúvidas sensíveis em relação ao 4T22 e endividamento da companhia;
- E-mail enviado pelo ex-CEO aos ex-Diretores envolvidos na fraude, pelo qual Miguel Gutierrez reclama do “mar de comentários”, referindo-se a diligentes questionamentos dos membros do Comitê de Auditoria, em linha com as boas práticas de governança recomendadas.
Na ocasião, a defesa de Gutierrez foi consultada pela CNN e disse que “a atual administração da Americanas pinça documentos fora de contexto na tentativa de corroborar sua narrativa falsa e incomprovada de que Miguel Gutierrez teria participado de uma fraude”.
Recuperação judicial
A Justiça do Rio de Janeiro aceitou o pedido de recuperação judicial feito pela Americanas em dezembro do ano passado. Na ocasião, o juiz Paulo Assed Estefan avaliou que a varejista atendia a todos os requisitos para o processo de recuperação judicial.
Em sua decisão, o juiz escreveu que “trata-se de uma das maiores e mais relevantes recuperações judiciais ajuizadas até o momento no país, não só por conta do seu passivo, mas por toda a repercussão de mercado que a situação de crise das requerentes vem provocando e, por todo o aspecto social envolvido, dado o vultoso número de credores, de empregados diretos e indiretos dependentes da atividade empresarial ora tutelada, bem como o relevante volume de riqueza e tributos gerados.”
Segundo o juiz, a eventual quebra do Grupo Americanas poderia acarretar o “colapso da cadeia de produção do Brasil, com prejuízos em relevantes setores econômicos, afetando mais de 50 milhões de consumidores, colocando em risco dezenas de milhares de empregos”
CPI da Americanas
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara dos Deputados que apurou fraude na Americanas aprovou, em setembro do ano passado, o relatório do deputado Carlos Chiodini (MDB-SC), cerca de 20 dias após sua elaboração.
Chiodini sugeria a apresentação de quatro projetos de lei para melhorar a governança corporativa e combater a corrupção em empresas privadas para evitar fraudes.
O parecer de Chiodini não propunha o indiciamento dos acionistas de referência da empresa: Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.
(Publicado por Bruno Laforé, com informações de Débora Oliveira e Caio Junqueira, da CNN, e da Agência Reuters)