O Grande Debate: ‘Entra e sai’ no MEC revela falta de prioridade?
Thiago Anastácio e Gisele Soares abordaram a nova baixa no Ministério da Educação após a saída do recém-nomeado Carlos Alberto Decotelli
O Grande Debate da manhã desta quarta-feira (1°) abordou a nova baixa no Ministério da Educação (MEC) após as inconsistências no currículo acadêmico de Carlos Alberto Decotelli levarem ao decreto que torna sem efeito a nomeação dele ao MEC.
Desde o anúncio da indicação do novo ministro, formações divulgadas por ele no currículo foram desmentidas – a universidade em que dizia ter feito um curso de pós-doutorado negou que ele tivesse qualquer certificado pela instituição; o reitor da faculdade em que dizia ter doutorado veio à público dizer que sua tese não foi aprovada. Também foram encontrados indícios de plágio em sua dissertação de mestrado e a Fundação Getúlio Vargas (FGV) afirmou que Decotelli não foi seu professor efetivo, conforme declarava,
Em entrevista exclusiva à CNN, após se reunir com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e definir a sua saída da pasta, Decotelli disse ter sido alvo de uma “destruição de reputação”, e defendeu seu currículo das críticas que vem recebendo.
Nomeado na semana passada para substituir Abraham Weintraub, Carlos Alberto Decotelli tinha a posse do cargo prevista para terça-feira (3), mas o evento foi adiado depois que se intensificaram as acusações. Decotelli foi o terceiro ministro da Educação no governo Jair Bolsonaro, em 1 ano e 6 meses.
O Grande Debate
O mediador do edição matinal do quadro da CNN, Rafael Colombo, levantou aos advogados Thiago Anastácio e Gisele Soares o questionamento sobre se o ‘entra e sai’ no MEC é um sinal de que a pasta não é uma prioridade do governo.
Anastácio considerou que não se trata apenas de prioridade, mas de “como a falta dela é maquiada”. “Em regra é com algum nome na tentativa de solucionar algo que, de fato, não é interesse do governo e das pessoas que o compõem”, criticou.
“A educação é a base, e, neste governo, ela foi a frangalhos. É muito evidente que a única coisa fática que esse governo pretendeu seriam as escolas cívico militares, mas algo que não progrediu – também por incapacidade técnica”, continuou ele. “Essas pessoas não gostam de educação nem da academia. Existe até uma aversão ao pensar, e por quê? Porque quem não pensa é mais facilmente manipulável”, acrescentou.
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Gisele avaliou que o “MEC é um ministério muito desafiador” e pontuou que “a situação atual da educação no Brasil não é uma responsabilidade deste governo, mas dos anteriores”. “Estes efetivamente não fizeram nenhum investimento na educação propriamente dita”, analisou.
A advogada ainda afirmou que “por muitos anos, houve uma entrega do MEC à ideologia”. “Temos uma situação muito triste na educação que demanda investimentos e é necessário que haja uma priorização. O governo federal havia feito uma nomeação muito positiva, justamente porque Decotelli fez um bom discurso afastado das ideologias. Precisamos cobrar e fortemente – de todos os políticos – que deem atenção para a educação para que, nos próximos anos, possamos colher os bons frutos que vão ser plantados agora”, acrescentou.
Anastácio rebateu dizendo que “parecem haver dois governos Bolsonaro”. “O dos últimos dez dias e o anterior. Desde a prisão de Fabrício Queiroz houve uma mudança de tom, porque agora Bolsonaro está acuado. Há alguma ideologia a ser seguida? Não acredito e discordo absolutamente da Gisele”, disse.
“Os últimos governos são culpados pelo desgoverno de agora? Vamos ver as histórias dos governos antes. Críticas devem ser feitas, mas o que aconteceu na época dos militares? E antes? O problema da educação brasileira é secular, não de um governo ou de outro”, completou.
Em tom de ironia, Gisele respondeu acreditar que os dois estão morando em países diferentes. “Você deve estar morando na Suíça. Eu moro no Brasil e vejo os números e que nossa educação precisa de muita atenção, investimento e prioridade”, afirmou ela, que voltou a citar “ideologia dos últimos governos”.
“Houve infelizmente um retrocesso por conta do excesso de ideologias nas universidades e escolas nas últimas administrações do PT. Paulo Freire é um educador que tem um viés ideológico e levou a discussão política para dentro das escolas. É inegável que ele, que é tão elogiado por uma série de educadores no Brasil, tinha uma crítica muito severa ao capitalismo e tinha uma forte ideologia comunista nas suas obras”, defendeu.
Anastácio demonstrou indignação e ironizou que “Weintraub morreu e baixou na Gisele”. “Agora a culpa da educação brasileira é o Paulo Freire? Você não falou absolutamente nada dos investimentos nas universidades e na área de ciência e tecnologia dos outros governos – e isso desde Fernando Henrique Cardoso. Os militares não fizeram nada”, pontuou.
“E os governos democráticos posteriores fizeram o quê?”, questionou Gisele.
Anastácio rebateu: “Então você acha que problema são os governos democráticos? É exatamente nisso que queria chegar. Eu não morro de amores por Paulo Freire, mas ele é definitivamente um acadêmico respeitado. É um homem do tempo dele, que cavalgou ideologias que discordo, mas foi um acadêmico e pedagogo. Ele tentou criar pessoas com senso crítico e não soldadinhos”.
Considerações finais
Em suas considerações finais, Gisele falou sobre a tristeza de junho ter se encerrado sem as festas juninas. “Um povo se constitui justamente de suas tradições e uma das festas mais tradicionais que temos é justamente a festa junina”, disse.
“Infelizmente este ano não aconteceu. Vamos esperar que ano que vem, a solução dessa pandemia colocará fim a esse distanciamento. Então, façamos uma menção à educação e a ciência para que encontrem logo uma solução para o novo coronavírus para que possamos aglomerar sem temor de novo e façamos festas juninas com muita comemoração”, finalizou.
Anastácio falou sobre o impacto da pandemia da Covid-19 nas tradições do Brasil e do mundo. “Isso significa que a cavalgada da humanidade dentro da sua história, tradições e cultura tiveram um tempo –infelizmente baseado em muitas mortes – para pensarmos qual o nosso rumo”, refletiu.
“Acredito que o rumo que todos sabemos que é necessário é o da educação e a ciência. Sem isso, continuaremos vivendo a barbárie”, acrescentou. “Só gostaria de deixar uma indagação: se o problema da educação nos últimos anos foram as ideologias, por que ela está na mão da ala ideológica deste governo? Essa é a hipocrisia escancarada”.
(Edição: Sinara Peixoto)