O Grande Debate: Bolsonaro pode ameaçar demitir Mandetta durante a crise?
Além desse tema, os dois ainda debateram sobre a intervenção dos Estados Unidos no comércio global e o 'passaporte de imunidade' sugerido por Paulo Guedes
O Grande Debate desta segunda-feira (6) discute a declaração do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sobre não ter medo de usar a caneta contra “quem está se achando”. Mesmo sem citar nomes, para muitos ficou evidente tratar-se de eventual demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (Democratas), em meio à pandemia do novo coronavírus. A pergunta que o advogado Thiago Anastácio e para a economista Renata Barreto tentaram responder sobre o assunto foi: Por divergências, Bolsonaro pode demitir Mandetta em meio à crise?
Além desse tema, os dois ainda debateram sobre a proposta do “passaporte da imunidade”, que foi levantada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. Eles também falaram sobre a intervenção dos Estados Unidos no comércio global de equipamentos de proteção individual e aparelhos como respiradores.
Sobre as alfinetadas de Bolsonaro para Mandetta, Thiago Anastácio disse ter ficado surpreso com a declaração pública de tom ameaçador. “Resta alguma dúvida [de que ele está ameaçando Mandetta?] Eu honestamente não consigo fazer uma análise. O presidente da República está ameaçando ministros em um momento de crise. Eu não tenho o que comentar”, afirmou.
Renata Barreto disse que parece bem claro sobre a pessoa a quem o presidente se refere, mas acabou concordando com Thiago ao afirmar que, embora haja críticas possíveis a Mandetta é “contraproducente esse tipo de coisa feita em público”. “Não acho que é bom para o governo nem para ninguém”, completou.
Thiago acrescentou: “Eu fico absolutamente pasmo e chocado que o líder brigue dessa forma. É mais ou menos como se, dentro de cunho religioso, Jesus fizesse críticas para os filisteus contra os apóstolos. Ou o líder de uma empresa saísse ameaçando a diretoria a todos os funcionários. Eu fico absolutamente pasmo e não sei mais o que dizer”.
Renata ressaltou que Bolsonaro tem o direito de demitir o ministro que quiser, mas isso tem que ser comunicado da maneira correta. “Ele pode até demiti-lo se achar que isso faz sentido, que ele teve um protagonismo que ele não queria ou fez alguma declaração que ele não gostou, porém tem que ser feito dentro do Palácio do Planalto”, defendeu. “Não gosto da ideia de diretas e indiretas sem algo de efetivamente concreto. Isso gera insegurança para o país”, concluiu.
‘Passaporte da imunidade’ e EUA
O ministro da Economia, Paulo Guedes, defendeu, no último sábado (4), que o governo adquira testes de coronavírus em massa para que, após a fase do isolamento social, pessoas não infectadas pela Covid-19 possam retornar ao trabalho. A medida é chamada de “passaporte de imunidade”, e o governo garante que um empresário forneceria 40 milhões de testes de Covid-19 por mês ao Brasil.
Primeira a abordar o assunto, Renata Barreto disse que ouviu o lado técnico para formar uma opinião e, com isso, crê que seja possível pôr em prática a sugestão de Guedes, mas com algumas ressalvas. “É muito difícil de a gente falar como leigo se funciona ou não, então reuni algumas informações com médicos e especialistas para formar minha opinião e tentar jogar para o telespectador algumas informações que me pareceram relevantes. Aparentemente, a ideia do ministro Paulo Guedes, de fazer testes em massa, funciona. A questão é que tem uma logística um pouco complexa e também não tem 100% de chances de saber se esses testes funcionam”, pontuou.
“Um dos exames mais importantes seria aquele que consegue identificar o anticorpo longo, ou seja, aquele que faz uma cicatriz imunológica de longo prazo, que se consegue perceber realmente se ele está imunizado e poderia voltar ao trabalho. E aí, também, colocar uma escala de quais as pessoas que deveriam ser testadas. Hoje a gente tem um país de dimensão continental, onde é muito complexo de fazer essa testagem, mas [poderia ser feito] nas cidades que têm mais infectados, pessoas que têm parentes infectados e talvez economizar testes com menores de 30 anos – dado que são pessoas com menor probabilidade de ter algum risco”, considerou a economista.
E concluiu: “Então, acho que é possível a medida desde que seja levado tudo isso em consideração e eu gostaria de ouvir mais dos técnicos a respeito disso, mas acho que poderia ser uma medida interessante”.
Thiago Anastácio, por sua vez, questionou a mão de obra para os testes em massa. “Evidentemente que as palavras técnicas são as fundamentais nesse momento. Quando nós falamos de testes, falamos também de toda uma logística que existe. Ou seja, nós precisamos saber primeiro se teremos testes suficientes e, segundo, quem irá ‘rodar’ esses testes”, diz. E exemplificou: “Isso porque, ontem, o Instituto Adolfo Lutz lançou a informação de que conseguiu ‘rodar’ apenas 0.4% dos que chegaram na semana passada”.
O advogado ainda levantou outros questionamentos: “Então, nós temos a questão da quantidade de testes, quem será testado, se o passaporte será concedido àqueles que não foram infectados ou àqueles que foram infectados e – ainda bem – conseguiram se livrar da doença, e também o que irá ocorrer com esse passaporte. Quem irá lançar isso? Temos um sistema claro de informações dos estados e municípios para o governo federal? Será o governo federal, os estados ou municípios, quem irá dar esse passaporte a essas pessoas – que também precisa ficar claro quem são – dentro das ideias constitucionais de liberdade”.
Renata Barreto e Thiago Anastácio divergiram diretamente ao abordar a questão da intervenção norte-americana no mercado global de equipamentos essenciais para o combate da COVID-19.
Renata defendeu que o país está em um nível mais grave da pandemia. “Os EUA estão em uma situação muito mais difícil – do ponto de vista de saúde – do que os países da América Latina”, argumentou ela. “Isso tudo faz parte do jogo e quem tiver a melhor estratégia racional é que vai ganhar essa briga”, completou.
Thiago, por sua vez, criticou que a compra de EPIs seja tratada como um jogo nesse momento rebateu que os EUA tem capacidade e dinheiro para produzir respiradores, por exemplo. “Nós, aqui, não temos essa capacidade. Não temos o ato de guerra”, disse.
Argumentos finais
Nos argumentos finais, Thiago Anastácio abordou os assuntos debatidos no quadro e disse que EUA deveriam estender a mão ao Brasil neste momento. “Nós prestamos continência e temos fé nesse país como um irmão – uma figura fraternal dentro das nossas relações – e fomos traídos pelos Estados Unidos nesse aspecto”, defendeu.
“A Renata está certa em dizer que os EUA devem cuidar da sua população, sem dúvida nenhuma, mas, se somos irmãos, um auxilia a casa do outro. Pelo menos deve se estender a mão”, continuou. “Não é apenas uma questão econômica. Entendo e acho fundamental que a riqueza possa servir para que os estados sejam melhores. E os estados só serão melhores quando nós tivermos – dentro da linha liberal – a intervenção de estado fundamentalmente em saúde e educação. Saúde para todos e educação de qualidade”, concluiu.
Em relação ao ministro Mandetta, Thiago pediu por confiança na ciência e paz no governo federal. “Me parece muito importante que temnhamos que ter fundamentos na ciência. Não é uma questão de fé. Ela é importante, livre e conforta mas precisamos, sim, de paz dentro do governo”, disse ele.
“Se o presidente tem essa prerrogativa [de demitir Mandetta], ele deve fazer logo. Não há maior tortura para alguém que está tendo uma postura corretíssima, como o ministro Mandetta, trabalhar tanto e estar sendo tão aplaudido e o grande problema é esse para o presidente? A aprovação? Sejamos espelhados. O problema da vaidade do Mandetta, na verdade, está na vaidade do presidente da República, que está pensando em 2022”, concluiu.
Renata Barreto aproveitou o espaço para fazer um apelo para que o momento de crise seja melhor utilizado. “Crise abre espaço para reflexão e oportunidades”, disse ela, frisando que “o custo da má gestão é igual ou pior do que o da corrupção”.
“Por isso, esse momento é de reflexão a respeito do que a gente deve fazer daqui para frente. O ministro Paulo Guedes tem falado muito das reformas estruturais que estão a caminho. Tudo isso tem que acontecer e rápido, justamente porque a gente não tem mais tempo”, afirmou
“Então, que a gente se torne um país mais produtivo, eficiente, livre e tenhamos mais noção dos nossos deveres e não só dos direitos”, continuou. “Acho que é uma ótima oportunidade para fazer essa reflexão e cobrar dos governantes que sigam no caminho da liberdade”, finalizou.
O debate, na íntegra, você pode assistir no vídeo inserido nesta matéria.