Influenciador negro abordado por PMs presta queixa, e polícia investiga racismo
Júlio César Dantas, de 31 anos, procurou a 5° DP, no centro do Rio, na tarde desta quinta-feira (18/11)
O influenciador e produtor cultural Júlio César De Sá Dantas, de 31 anos, procurou a Polícia Civil nesta quinta-feira (18) para denunciar uma abordagem racista sofrida por ele na última quarta (17). A ação foi logo após o rapaz ter saído de uma loja de roupas, no centro do Rio. O diálogo entre ele e os PMs foi transmitido ao vivo no perfil Carioquice Negra, do qual ele é dono e tem mais de 800 mil seguidores nas redes sociais.
No vídeo, ele logo questiona o motivo da abordagem e recebe como resposta que teria entrado e saído muito rápido do estabelecimento. Ao longo da ação, Júlio questiona se o verdadeiro fato era a cor de sua pele.
Em outro trecho, um dos policiais também afirma que Júlio teria apresentado um volume suspeito na cintura. O jovem levanta a blusa e mostra que não havia qualquer objeto. Um agente chega a dizer que o volume poderia ser efeito do vento na camisa. O produtor de eventos, então, nega-se a entregar a identificação por entender que não havia um motivo concreto para a abordagem e passa a ser acusado de desobediência. No início, é possível identificar dois policiais, mas logo o número cresce e chega a seis, segundo narra o rapaz.
Júlio foi conduzido para a 5ª Delegacia de Polícia Civil, no Centro da cidade, mesma delegacia onde, nesta quinta-feira (18), ele registrou queixa contra a abordagem.
“Incômodo gigante de saber que não é uma coisa nova, que não foi a última vez, que nas últimas 24 horas aconteceu de novo. Eu tô aqui pra que essa pauta seja questionada, discutida, que as instituições levantem essa pauta e reverberem, pra mudar essa forma de abordagem. Ali eram duas da tarde, fiquei imaginando se fosse tarde da noite o que seria”, disse Júlio, à CNN.
O influenciador estava acompanhado de advogados do Instituto de Defesa da População Negra (IDPN), que comentaram o caso.
“A gente não quer que o policial seja pintado como o único causador do dano que o Júlio vivenciou, mas sim que a gente possa questionar a estrutura que possibilita isso. Debater a atuação da polícia na seletividade da ação. Não podemos naturalizar isso”, afirmou Joel Luiz da Costa, que após a entrevista, confirmou a abertura de uma investigação por racismo.
Procurada pela CNN sobre a denúncia do produtor cultural, a Operação Segurança Presente (OSP) se manifestou pela seguinte nota: “Os policiais do Centro Presente estavam a patrulhando a região do Centro e suspeitaram do rapaz que, segundo eles, demonstrou insatisfação com a aproximação policial e pareceu querer se desvencilhar dos agentes entrando em uma loja. Os policiais se aproximaram do rapaz e pediram para que ele se identificasse. Porém, ele se recusou e, por isso, foi conduzido à delegacia para que fosse identificado. Na delegacia ele foi identificado, nada foi constatado e foi liberado.”
A CNN também pediu nota à Polícia Civil e aguarda o retorno.
Para Rodrigo Mondego, vice-presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos do Rio de Janeiro e procurador da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a abordagem policial precisa ser fundamentada em alguma suspeita concreta de crime cometido.
“Quando não há motivação para a abordagem e a pessoa é levada para a delegacia sem justificativa, caracteriza-se abuso de autoridade. A pessoa só pode ser detida em caso de flagrante delito, em caso de um crime, ou por determinação judicial. Ninguém pode ser detido para averiguação. Esse é um instrumento usado na ditadura. É uma violação à Constituição e ao Código do Processo Penal. Ser preto não é uma atitude suspeita”, pontuou Mondego.